Em meados do século XIX, mais precisamente entre 1853 e 1870, Paris passou por uma profunda reforma urbana, responsabilidade do barão Georges-Eugène Haussmann (1809-1891), prefeito da cidade durante o governo de Napoleão III, sobrinho de Napoleão Bonaparte. A reformulação da capital francesa influenciou o traçado de inúmeras cidades ao redor do mundo, incluindo o Rio de Janeiro, que teve sua própria reforma durante a prefeitura de Francisco Pereira Passos entre 1902 e 1906.
Naquele momento, a França passava por um intenso período de industrialização e de urbanização e Paris não tinha infraestrutura para abrigar todos aqueles que migravam do campo para a cidade: nunca antes tantas pessoas habitaram a capital. Entre os muitos problemas enfrentados estavam as frequentes epidemias que surgiam devido à concentração populacional e à inexistência de saneamento básico. Com o intuito de promover a qualidade de vida, as obras de Haussmann incluíram melhorias como a instalação de esgotos, a extensão do sistema de distribuição de água e a promoção da iluminação pública.
No entanto, algumas outras medidas tomadas naquele momento são objeto de discussão e de polêmica até os dias de hoje. Grande parte das construções do período medieval foi demolida e as caóticas vias de circulação correspondentes foram substituídas pela organização geométrica marcada pelos largos bulevares. Existiram também ações com o objetivo de higienizar, embelezar e modernizar a capital através da implantação de parques, da arborização de bairros e da erradicação de cortiços seguida da construção de conjuntos habitacionais nos subúrbios como paliativo.
Muitos críticos afirmam que a preocupação com a largura das vias de Paris não era mera questão de mobilidade, pois as ruas estreitas e tortuosas do tempo medieval tornavam difícil a repressão aos motins populares que tinham se tornado comuns desde a Revolução Francesa de 1789 - para fins didáticos, pode-se dizer que o desenho das cidades da Idade Média guarda semelhanças com o das favelas dos morros cariocas ao facilitar a defesa dos moradores contra invasores. Já a expulsão da população de baixa renda para a periferia foi ponto em comum entre o caso parisiense e a reforma urbana do Rio de Janeiro sob o governo de Pereira Passos, que ajudou a enfurecer o povo que explodiria no quebra-quebra da Revolta da Vacina de 1904.
Portanto, o interesse especial que a Paris de Haussmann desperta vem da oportunidade que seu estudo representa para pensarmos o planejamento urbano como ação política estratégica, para além de seus aspectos sanitários, habitacionais, viários e estéticos. É difícil imaginar como seria a capital francesa sem a reforma que, para o bem ou para o mal, fez dela o símbolo maior da modernidade em sua época.
Adorei o texto. :D