ESTADO FÍSICO

A física é uma área engraçada, pois às vezes nos esquecemos que ela é um desenvolvimento metódico realizado por homens, e que portanto, utiliza a nossa cultura como fundamento para a definição de alguns dos seus termos, tal como trabalho e estado. Dessa forma, quando tentamos entender esses conceitos baseando-nos apenas em suas fórmulas matemáticas, nos colocamos frente a um muro às vezes impenetrável que é o entender a física tendo a sua estrutura como amparo fundamental. Nesse intuito, a fim de fornecer um exemplo do que está sendo falado e clarear o significado geral do que viria a ser um estado, termo que aparece reiteradamente nessa área do conhecimento, eu começarei este desenvolvimento delimitando uma situação hipotética e indagando o intuito por detrás de perguntas como "Doutor! Qual é o estado do meu amigo?".

Suponha que você esteja acompanhando um amigo em um hospital, tenha encontrado um médico e feito a ele a pergunta citada no final do parágrafo anterior. Neste ponto, diga-me, qual era o seu intuito ao realizar tal pergunta? O que você queria saber? Arrisco-me a dizer que a sua vontade resumia-se à obtenção de mais informações acerca das suas condições físicas, isto é, você queria saber ele estava bem, certo? Ora, pois! Mas o que seria estar bem? Veja, devido à dicotomia existente entre "bem" e "mal", vamos começar analisando o que seria "estar mal" e ver se conseguimos tirar proveito disso na definição do que é "estar bem", beleza? Assim, buscando as memórias da boa e velha dramaturgia brasileira, quais são as modificações possíveis de serem notadas na dinâmica corporal de uma ser vivo próximo à morte? De acordo com o pouco que sei, quando morremos, nós ficamos frios, o nosso coração deixa de bater, a pressão sanguínea, atividade cerebral e a respiração vão a zero, além disso, o desvio dessas grandezas para mais, como uma respiração intensa, batimentos acelerados, pressões ou temperaturas elevadas, também são sinais de que não estamos bem, pois uma febre muito intensa, por exemplo, pode ser fatal! Desse modo, deve haver um conjunto de valores intermediários para essas propriedades que correspondam a um "estar bem" biológico, além do mais, esses termos devem estar conectados, pois ao morrermos, não somente uma, mas todas as grandezas descritas aqui são modificadas! Assim, ao realizar a pergunta acima ao médico, ele certamente analisará a ficha do nosso amigo, buscará por esses dados, compará com a média e só então dirá se ele está bem ou não, de tal modo que ao invés de perguntarmos "Doutor! Qual é o estado do meu amigo?", nós poderíamos ter perguntado "Doutor! Os dados vitais do meu amigo estão bons?", pois elas são conceitualmente equivalentes, porém a segunda expressão traz explícitamente o nosso intuito com a indagação. Por fim, podemos fornecer um pouco mais de tecnicidade a esta análise e inferir que o estado de um paciente genérico encontra-se plenamente determinado a partir da especificação de um conjunto de variáveis, tal como fora feito aqui, denominadas variáveis de estado. Esta análise está correta, porém algumas pessoas poderiam pontuar que eu estou definindo estados através das propriedades que os caracterizam, o que é redundante, e esse argumento também estaria certo! Então veja, a partir desta narrativa nós podemos abstrair as grandezas mencionadas, o contexto da pergunta, e definir os estados como a maneira segundo a qual um ente se encontra em um determinado momento, com essa dependendo ainda do enfoque da nossa pergunta, afinal, quando perguntamos o estado de um carro, não esperamos respostas como: a respiração dele está ofegante, os batimentos estão acelerados e a pressão está nas alturas! Além disso, também é razoável esperar que a especificação desses estados se baseie sempre na aferição de um conjunto de grandezas e que essas estejam relacionadas, exatamente como ocorreu na narrativa.

A ideia aqui exposta é o que se pode chamar de senso comum de estado, e pode ser aplicada em estudos mecânicos, termodinâmicos, eletromagnéticos, financeiros, hospitalares, etc. Como exemplo, a caracterização mecânica do estado de um sistema resume-se ao estudo da sua configuração, sendo essa informação plenamente fornecida através dos vetores posição e momento linear de cada um dos seus constituintes em um dado instante t, pois, a partir dessas informações e da segunda lei de Newton, nós estaremos munidos do essencial para a determinação de toda a sua dinâmica, principal objetivo da mecânica. Assim, dizemos que essas grandezas constituem as suas propriedades de estado quando o enfoque do estudo é mecânico, e  é notável, contudo, que, apesar de devermos sempre realizar tal indagação quando nos deparamos com um novo sistema ou modificamos o enfoque do estudo, encontrar esse conjunto completo de variáveis de estado nem sempre é uma tarefa simples. Em outros termos, como poderíamos descobrir as propriedades a serem medidas para a caracterização completa do estado de um sistema sob um enfoque eletromagnético e termodinâmico? Será que o potencial químico deve entrar na jogada? Além da temperatura e dos campos eletromagnéticos, o que mais é essencial?