Leia o fragmento a seguir.
[...] “Essa frase, compreensível apenas para quem sabe que os pastores da estepe húngara tangem o gado com chicotes compridos, terminados numa ponta de crina, cujos estalos metem medo à bicharada” [...] (9º §)
Assinale a opção em que o termo destacado NÃO apresenta a mesma função sintática do vocábulo grifado acima.
(A) “A pobreza do povo [...]" (7º §)
(B) “[...] provérbios de qualquer povo [...]" (1º §)
(C) “[...] na contemplação de seus animais [...]" (5º §)
(D) “[...] as coisas dos outros [...]" (6º §)
(E) “O espetáculo do mundo [...]” (8º §)
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Nicoli,
O pronome relativo cujos exerce, no fragmento acima, a função sintática de adjunto adnominal de estalos (os estalos dos chicotes/os chicotes dos quais os estalos metem medo à bicharada/os estalos deles. Indica relação de posse). A questão quer saber em qual das opções o termo destacado não apresenta a mesma função sintática de cujos, ou seja, de adjunto adnominal (indicativo de relação de posse).
Isso ocorre na opção C, na qual o termo destacado (de seus animais) não exerce a função sintática de adjunto adnominal, mas de complemento nominal (de contemplação. A contemplação de seus animais: "Sem sair do quintal, o camponês magiar [húngaro] encontra na contemplação de seus animais [= ato ou efeito de contemplar] muitos motivos de meditação").
O complemento nominal NÃO indica posse (caso da opção C), diferentemente das demais opções, em que os termos sublinhados designam posse (a pobreza do povo = a pobreza dele; provérbios de qualquer povo = os provérbios dele(s); as coisas dos outros = as coisas deles; O espetáculo do mundo = O espetáculo dele).
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OBSERVAÇÕES
- O adjunto adnominal, quando preposicionado, caracteriza apenas o substantivo.
- O complemento nominal (sempre preposicionado) complementa um substantivo, adjetivo ou advérbio.
Assim, em orações como “Estava cheio de problemas” e “Moro perto de você”, os termos “de problemas” e “de você” são complementos nominais, pois completam o sentido do adjetivo “cheio” e do advérbio “perto”, respectivamente.
- O substantivo caracterizado por um adjunto adnominal pode ser concreto ou abstrato.
- O substantivo completado por um complemento nominal deve ser abstrato.
O substantivo abstrato normalmente designa uma ação (corrida, pesca) ou uma característica (tristeza, igualdade).
Nos adjuntos adnominais, o substantivo é concreto. Nas frases “copos de vidro” e “casa de pedra”, os termos “de vidro” e “de pedra” são adjuntos adnominais, pois caracterizam os substantivos concretos “copos” e “casa”, respectivamente.
O adjunto adnominal preposicionado é agente; o complemento nominal, paciente. Se os termos são agentes, automaticamente serão adjuntos adnominais; se pacientes, complementos nominais.
Exemplos:
Adjuntos adnominais:
Complementos nominais:
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PROVÉRBIOS MAGIARES
Seria ingenuidade procurar nos provérbios de qualquer povo uma filosofia coerente, uma arte de viver. É coisa sabida que a cada provérbio, por assim dizer, responde a outro, de sentido oposto. A quem preconiza o sábio limite das despesas, porque "vintém poupado, vintém ganhado", replicará o vizinho farrista, com razão igual: "Da vida nada se leva". A experiência popular tanto fornece bons conselhos aos indecisos quanto justificativas para os velhacos, e um código baseado nos rifões não estaria menos cheio de contradições do que os códigos compilados pelos jurisconsultos.
Mais aconselhável procurarmos nos anexins não a sabedoria de um povo, mas sim o espelho de seus costumes peculiares, os sinais de seu ambiente físico e de sua história. As diferenças na expressão de uma sentença observáveis de uma terra para outra, podem divertir o curioso e, às vezes, até instruir o etnógrafo.
Povo marítimo, o português assinala semelhança grande entre pai e filho, lembrando que "filho de peixe, peixinho é", Já os húngaros, ao formularem a mesma verdade, não pensavam nem em peixe, nem em mar, ao olhar para o quintal, notaram que "a maçã não cai longe da árvore".
Desconfiado das classes superiores, o caboclo inventou o preceito: "Cada macaco no seu galho", o húngaro foi achar inspiração no pomar para advertir que "não se devem comer cerejas com os fidalgos no mesmo prato" e acrescentar, caso alguém lhe perguntasse o porquê, "pois eles comem a fruta e cospem-te o caroço na cara".
Sem sair do quintal, o camponês magiar encontra na contemplação de seus animais muitos motivos de meditação: "Quem se mistura com o farelo, os porcos o comem", afirma para condenar as más companhias (ao passo que o português, segundo me informa meu amigo Aurélio Buarque de Holanda, declara o contrário para dizer a mesma coisa: "Quem com porcos se mistura, farelo come"). "Até a cabra velha lambe o sal", cita ele para explicar, se não para desculpar, o comportamento de algum velhote mulherengo (caracterizado em português por um ditado parecido: "Cavalo velho, capim novo"). Às mais vezes, os fenômenos do quintal servem-lhe de consolação na sua filosofia de resignado: "Quando não há cavalo, serve o burro" (tradução portuguesa: "Quem não tem cão, caça com gato"); "O raio não parte a urtiga' (isto é: "Vaso ruim não quebra"); "Até a galinha cega encontra o grão" e "Muita gente boa cabe em pouco lugar".
Ao querer juntar o maior número possível de adágios húngaros, surpreende-me quão poucas são as exortações diretas a praticar o bem. A mais usada delas parece possuir, até, um matiz irônico: "Em troca de um benefício, espera o bem", e nos lembra o nosso "esperar sentado". Com maior frequência recomenda-se a abstenção do mal em vista das possíveis complicações: "Quem cava uma fossa para o outro, ele mesmo cairá dentro." Como esperar, aliás, bondade do gênero humano, quando "até os santos têm as mãos viradas para si. Se a Hungria fosse à beira-mar, puxariam para si as sardinhas. Por isso, nada de colaborações, de cooperativismo: "Cavalo de dois donos tem as costas esfoladas. À solidariedade, aliás, é antes uma virtude de espertos: "Um corvo não fura o olho de outro corvo."
A pobreza do povo, naturalmente, é uma das principais inspiradoras do adágio: "Pobre cozinha com água" enquanto vive, e mesmo que se enforque, "até o galho puxa o pobre", ao passo que "o senhor é senhor até no Inferno". O pobre também gosta de comida boa, pois sabe que "carne barata tem o suco ralo", mas é obrigado a limitar seus apetites, pois "dias há mais que salsichas. Pelo menos sonha melhor alimentação, o que é bastante compreensível, pois, como diria o próprio Freud, "porco faminto sonha com bolota". Interessante a fórmula usada principalmente por pessoas abastadas ao oferecerem um farto banquete: "Somos pobres, mas vivemos bem", que parece quase um esconjuro para reconciliar altos poderes ciumentos. [...]
O espetáculo do mundo, que na Hungria "é do sabido" (e no Brasil "dos mais espertos"), não oferece muito conforto. É melhor a gente cuidar do que é nosso, não se meter com as coisas dos outros "varrer na frente da própria casa" e calar-se o mais possível: "Minha boca não fales, minha cabeça não há de doer." Muito falar não adianta, pois "muita conversa tem muita borra", e "até cem palavras acabam numa só".
Se, apesar de tanta coisa errada que a gente vê no mundo, a sorte dos velhacos não deve despertar inveja, é porque "o chicote estala é na ponta". Essa frase, compreensível apenas para quem sabe que os pastores da estepe húngara tangem o gado com chicotes compridos, terminados numa ponta de crina, cujos estalos metem medo à bicharada, serve para lembrar-nos que um destino só é completo quando chegou ao fim, ou, então, que "ri melhor quem ri por último". Sem dúvida, os caminhos da justiça divina são muitas vezes obscuros: "Deus não bate com bordão" (ou, o que dá no mesmo, "escreve certo por linhas tortas"); mas, "o que demora, não falha", (isto é, "a justiça divina tarda, mas não falha"), porque, "se Deus quer, até o cabo da enxada dá tiro" (enquanto no Brasil "quando Deus quer, água fria é remédio").
RÓNAI, Paulo. Como aprendi o português e outras aventuras. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013. (Texto adaptado)
O pronome relativo cujo, sintaticamente, é um adjunto adnominal do termo estalos, quando recuperamos a palavra-núcleo a que ele se refere. Então, fica: os estalos do chicote. É bom lembrar que o pronome indica posse.
Assim, se der para trocar as palavras que circundam o núcleo por dele/dela/ deles/ delas, ficamos sabendo que são adjuntos adnominais, pois indicam posse.
Então:
A) pobreza deles
B) provérbios deles
C) não dá para pôr a posse
D) coisas dele
E) espetáculo dele
Nicoli, cujo é adjunto adnominal e indica posse, o que se verifica nas outras alternativas. Na C, há complemento adnominal - de seus animais é complemento do nome "contemplação".
Espero tê-la ajudado. At.te, tutor Miguel Augusto Ribeiro.
No fragmento apresentado, o termo destacado "na contemplação de seus animais" apresenta a mesma função sintática do vocábulo grifado "compreensível apenas para quem sabe" do trecho inicial. Ambos funcionam como adjuntos adverbiais de modo, indicando a circunstância de como algo é compreensível ou contemplado.
A opção correta, portanto, seria a letra C.