O FEMININO NA DANÇA DO VENTRE
Por: Jacquelyne O.
21 de Janeiro de 2020

O FEMININO NA DANÇA DO VENTRE

resumo

Teoria da Dança Teoria da Dança do ventre

A dança do ventre é um estilo de dança oriental que têm se popularizado no ocidente, sendo hoje largamente praticada em escolas de dança e academias de ginástica.

Tradicionalmente realizada apenas por mulheres, é vista pelo senso comum como uma dança do feminino, uma forma de “expressão da essência feminina”. (P. 52)

 

A dança do ventre (Raks el Sharq, em árabe) é uma forma de arte milenar, cuja origem é difícil de precisar devido à escassez de registros a respeito. Sabe-se, porém, que esta dança se desenvolveu como parte da cultura árabe, sendo tardiamente incorporada como uma prática corporal pelas ocidentais. (P. 52)

 

Segundo Bencardini (2002), os indícios mais antigos de uma possível história da dança do ventre foram encontrados em países como a Turquia e a Índia, pertencendo ao período pré-histórico (idade da pedra lascada): são pequenas estátuas de mulheres com ventre proeminente e seios fartos, objetos que os historiadores interpretam como amuletos para a fertilidade, ligados a cultos matriarcais em que a mulher era divinizada por ser capaz de gerar uma nova vida. (P. 53)

 

A dança do ventre teria então se desenvolvido primordialmente no contexto míticoreligioso de civilizações antigas do Oriente Médio, que cultuavam a Grande Deusa-Mãe. O significado original da dança é assim descrito por Bencardini (2002):

Sabe-se que a dança do ventre tem suas raízes ligadas aos templos. Acreditava-se numa grande deusa, mãe de todos os seres humanos e de toda a terra. Era ela quem alimentava a terra tornando-a fértil para a lavoura. Nos rituais em sua homenagem, sacerdotisas expunham seus ventres, fazendo-os dançar, vibrar e ondular. Era a forma de garantir prosperidade e fertilidade para a terra e para as mulheres (p.28).

A dança do ventre, portanto, está historicamente ligada à expressão da sexualidade feminina e às suas relações simbólicas com o sagrado, como também afirma a antropóloga

Hanna (1999). Embora seja difícil estabelecer um marco cronológico, acredita-se que a civilização Suméria (4500 a.C.) seja um dos prováveis berços da dança do ventre. Essa civilização habitou a região entre os rios Tigre e Eufrates, onde hoje é o sul do Iraque.

Naquele tempo, a ligação dos homens com o cultivo da terra e com as forças da natureza era muito forte e os templos religiosos eram centros da vida econômica, política e cultural do povo. Nestes templos, conta-nos Bencardini (2002), a dança era executada por sacerdotisas em rituais de culto à deusa Ishtar. Esta tradição religiosa da dança do ventre teria também se desenvolvido em outras civilizações orientais: no Egito, por exemplo, seria parte dos cultos à

Ísis. Esta significação original atribuída à dança do ventre faz parte do imaginário social que a cerca de magia e mistério. Este significado também remete a determinado lugar simbólico ocupado pela mulher naquele contexto. (P. 54)

 

A dança pode ser considerada como uma das primeiras formas de linguagem utilizadas pelos homens para se comunicar (SIQUEIRA, 2006), sendo anterior à linguagem escrita (P. 55)

 

Esta idéia de que a dança dá visibilidade a papéis sexuais é útil para analisarmos a dança do ventre, uma vez que nela o que se apresenta é uma certa representação do feminino. (P. 55)

 

Quero dizer com isso que a dança do ventre é um artifício, um saber, uma disciplina que trabalha o corpo da mulher, através de uma complexa técnica de movimentos, que instrumentalizam a bailarina à reprodução de uma determinada performance “feminina”. Já os significados associados ao feminino podem variar de acordo com o contexto em que esta performance é realizada. (P. 60)

 

A função estética parece ter predominado na apropriação da dança do ventre pelo contexto brasileiro. O aparecimento da dança árabe no Brasil é relativamente recente7, sendo introduzida de modo mais sólido no início dos anos 70, por meio de apresentações realizadas em restaurantes árabes como o Semíramis, o Bier Maza e o Porta Aberta, todos localizados em São Paulo. Nessa época, o público era em sua maioria pessoas da colônia árabe. Desde

então a dança do ventre cresceu no Brasil, tendo como principais locais para sua expansão e divulgação as escolas de dança e restaurantes árabes. Um dos principais locais responsáveis pela formação de bailarinas e divulgação da dança árabe no Brasil é a Khan el Khalili, Casa de Chá Egípcia, localizada em São Paulo, onde desde 1983 são realizadas apresentações de dança do ventre. (P. 64)

 

A dança do ventre, enquanto uma atividade estética - uma atividade que de acordo com Bakhtin (2003) define-se pela produção de um objeto estético destinado à mirada do outro -, envolve necessariamente um processo de criação que, incidindo sobre o corpo, possibilita à bailarina vivenciá-lo esteticamente como um corpo feminino, recriando-se como obra de arte. (P. 65)

 

A dança do ventre é, portanto, uma forma de estetização do feminino (REIS, 2007). É um trabalho de enformação estética do feminino, que trans-forma o corpo, pois durante seu aprendizado a dançarina incorpora em seu repertório gestual uma série de movimentos a partir dos quais poderá realizar, durante sua apresentação, uma performance feminina. No entanto, esta performance feminina necessita do olhar contemplativo do espectador para se realizar concretamente como um objeto estético. E os significados atribuídos ao feminino a partir daí dependem da leitura que esse espectador faça sobre a dança, leitura mediada pelos valores sociais que moldam as relações de gênero em nossa sociedade e pelo seu maior ou menor

Reis Divers@ Rev. Elet. Interdisc., Matinhos, v. 1, n. 1, p. 52-67, jul./dez. 2008

conhecimento sobre esta arte, pois antes de tudo, a dança do ventre é uma poética do feminino. (P.65- 66)

 

 

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