
Nietzsche Não Só Um Filósofo, Mas Um Poeta

em 18 de Abril de 2025
A princípio A República, com seus Governante sabemos a intencao da classe e elite política com seu povo e seus cidadãos através das músicas que lhe são impostas e induzidas a gostarem a ouvirem e a preciarem. Como Platão discorreu em seu livro, como exempo da ARPA E SEUS ACORDES, e os meios de educacao através da música ou alienacao da populacao, como exemplo as mídias de controles da massa, a seguir trechos sobre a Música em A República de Platão, aliás o Rock and Roll se aproxima muito de uma orquestra sinfonica.
Fonte: https://www.eniopadilha.com.br/documentos/Platao_A_Republica.pdf
Antes, O Que Dizia Leibniz sobre a Música:
A REPÚBLICA:
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Sócrates — Que assim seja, compreendo. Não estamos considerando apenas uma cidade em formação, mas também uma cidade repleta de luxo. Talvez o processo não seja mau; de fato, é possível que um tal exame nos mostre como a justiça e a injustiça se originam nas cidades. Contudo, creio que a verdadeira cidade deva ser a que descrevi como sã; agora, se quiserdes, examinaremos uma cidade tomada de excitação; nada impede que o façamos. Parece que muitos não se satisfarão com esse padrão de vida simples e com esse regime: terão leitos, mesas, móveis de toda a espécie, pratos requintados, essências aromáticas, perfumes para queimar, cortesãs, variadas iguanas, e tudo isto em grande quantidade. Portanto, já não podemos considerar apenas necessárias as coisas a que
nos referimos no começo: moradias, vestuários e calçados; teremos de levar em conta a pintura e a arte de bordar, procurar ouro, marfim e materiais preciosos de todas as qualidades. Não é isso?
Glauco — É.
Sócrates — Sendo assim, precisamos aumentar a cidade, pois aquela que consideramos sã já não é suficiente, e enchê-la de uma multidão de pessoas que não estão nas cidades por necessidade, como os caçadores de toda a espécie e os imitadores, a turba dos que imitam as formas e as cores e a turba dos que cultivam a música: os poetas com seu cortejo de cantores ambulantes, atores, dançarmos, empresários de teatro, fabricantes de artigos de todo tipo e especialmente de adornos femininos. Precisaremos também de aumentar o número dos servidores; ou achas que não teremos necessidade de pedagogos, amas, governantas, criadas de quarto, cabeleireiros e também cozinheiros e mestres cozinheiros? E te’remos necessidade também de porqueiros! Não existia nada disto na nossa primeira cidade, porque não havia necessidade, mas nesta será indispensável. E devemos acrescentar gado de toda a espécie, para aqueles que desejarem comer carne, não te parece?
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Sócrates — Então, como se contássemos uma fábula para nos entreter, façamos com palavras a educação desses homens.
Adimanto — E o que precisamos fazer.
Sócrates — Mas que educação lhes proporcionaremos? Será possível encontrar uma melhor do que aquela que foi descoberta
ao longo dos tempos? Ora, para o corpo temos a ginástica e para a alma, a música.
Adimanto — Certamente.
Sócrates — Não convém começarmos a sua educação pela musica em lugar da ginástica?
Adimanto — Sem dúvida.
Sócrates — Tu admites que os discursos fazem parte da música ou não?
Adimanto — Admito.
Sócrates — E existem dois tipos de discursos, os verdadeiros e os falsos?
Adimanto — Sim, existem.
Sócrates — Ambos entrarão na nossa educação ou começaremos pelos falsos?
Adimanto — Não estou entendendo.
Sócrates — Nós não começamos contando fábulas às crianças? Geralmente são falsas, embora encerrem algumas verdades.
Utilizamos essas fábulas para a educação das crianças antes de levá-las ao ginásio.
Adimanto — É verdade.
Sócrates — Este é o motivo por que eu dizia que a música
deve preceder a ginástica.
Adimanto — E tens razão.
Sócrates — E não sabes que o começo, em todas as coisas, é sempre o mais importante, mormente para os jovens? Com efeito, é sobretudo nessa época que os modelamos e que eles recebem a marca que pretendemos imprimir-lhes.
Adimanto — Com certeza.
Sócrates — Sendo assim, vamos permitir, por negligência, que as crianças ouçam as primeiras fábulas que lhes apareçam, criadas por indivíduos quaisquer, e recebam em seus espíritos entender, quando forem adultos?
Adimanto — De forma alguma permitiremos.
Sócrates — Portanto, parece-me que precisamos começar por vigiar os criadores de fábulas, separar as suas composições boas das más. Em seguida, convenceremos as amas e as mães a contarem aos filhos as que tivermos escolhido e a modelarem-lhes a alma com as suas fábulas muito mais do que o corpo
com as suas mãos.1 Mas a maior parte das que elas contam atualmente devem ser condenadas.
Adimanto — Quais?
Sócrates — Julgaremos as pequenas pelas grandes, porquanto umas e outras devem ser calcadas nos mesmos moldes e produzir o mesmo efeito; concordas?
Adimanto — Concordo. Mas não sei quais são essas grandes fábulas de que falas.
Sócrates — São as de Hesíodo, Homero e de outros poetas. Eles compuseram fábulas mentirosas que foram e continuam sendo contadas aos homens.
Adimanto — Quais são essas fábulas e o que há nelas de condenável?
Sócrates — O que antes e acima de tudo deve ser condenado, mormente quando a mentira não possui beleza.
Adimanto — E quando não possui?
Sócrates — Quando os deuses e os heróis são mal representados, como um pintor que pinta objetos sem nenhuma semelhança com os que pretendia representar.
Adimanto — E com razão que se condenem tais coisas.
Mas como dizemos isso e a que estamos nos referindo?
Sócrates — Em primeiro lugar, aquele que criou a maior das mentiras a respeito dos maiores dos seres criou-a sem beleza, quando disse que Urano fez o que relata Hesíodo e como Cronos
se vingou. Mesmo que o comportamento de Cronos e a maneira como foi tratado pelo filho fossem verdadeiros, penso que não deviam ser narrados com tanta leviandade a seres desprovidos de razão e às crianças, mas que seria preferível enterrá-los no [1 - Naquela época, costumava-se massagear as crianças, para que adquirissem uma boa conformação. silêncio; e, se é necessário falar nisso, deve-se fazê-lo em segredo, diante do menor número possível de ouvintes, depois de ter
imolado, não um porco, mas uma vítima grande e difícil de conseguir, para que haja muito poucos iniciados.
Adimanto — De fato, essas histórias são abomináveis.
Sócrates — E não devem ser contadas na nossa cidade. Não se deve dizer diante de uni jovem ouvinte que, cometendo os piores crimes e castigando um pai injusto da forma mais cruel, não faz nada de extraordinário e age como os primeiros e os maiores dos deuses.
Adnnanto — Não, por Zeus! A mim também parece que
tais coisas não se devam dizer!
Sócrates — Deve-se também evitar contar que os deuses fazem guerra entre si e que armam ciladas recíprocas, porque não é verdade, se quisermos que os futuros guardiães da nossa cidade considerem o cúmulo da vergonha discutir levianamente. E ainda menos se lhes deve contar ou representar em tapeçarias as lutas dos gigantes e esses ódios de toda a espécie que armaram os deuses e os heróis contra os seus parentes e amigos. Ao contrário, se quisermos convencê-los de que jamais a discórdia reinou entre os cidadãos e que tal coisa é ímpia, devemos fazer com que os adultos lhes digam isto desde a infância. Cumpre ainda cuidar para que poetas componham para eles fábulas que tendam para o mesmo objetivo. Que jamais se lhes conte a história de Hera acorrentada pelo filho, de Hefesto precipitado do céu pelo pai, por ter defendido a mãe, que aquele maltratava, e os combates de deuses que Homero imaginou, quer essas ficções sejam alegóricas, quer não. Pois uma criança não pode diferenciar uma alegoria do que não é, e as opiniões que recebe nessa idade tornam-se indeléveis e inabaláveis. E devido a isso que se deve fazer todo o possível para que as primeiras fábulas que ela ouve sejam as mais belas e as mais adequadas a ensinar-lhe a virtude.
Adimanto — Tudo que dizes é profundamente sensato. Porém, se alguém nos indagasse o que entendemos por isso e que fábulas são essas, que responderíamos?
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DA HARMONIA DAS MÚSICAS PARA O POVO, OS CIDADÃOS DA REPÚBLICAS, PLATÃO DEFINIA COMO PLEBEUS, TAMBÉM , ESTE É O TRATAMENTO DOS MEIOS DE COMUNICACAO EM MASSA E DA CLASSE POLÍTICAS AOS BRASILEIROS.
Sócrates — Assim, pois, se um homem perito na arte de tudo imitar viesse à nossa cidade para exibir-se com os seus poemas, nós o saudaríamos como a um ser sagrado, extraordinário, agradável; porém, lhe diríamos que não existe homem como ele na nossa cidade e que não pode existir; em seguida manda-lo-íamos para outra cidade, depois de lhe termos derramado mirra na cabeça e o termos coroado com fitas. Por nossa conta, visando à utilidade, recorreremos ao poeta e ao narrador mais austero e menos agradável, que imitará para nós o tom do homem honrado e obedecerá, na sua linguagem, às regras que estabelecemos logo de início, quando empreendíamos a educação dos nossos guerreiros.
Adimanto — Sim, agiremos desse modo, se isso depender de nós.
Sócrates — Agora, meu amigo, parece-me que acabamos com esta parte da música que se refere aos discursos e às fábulas, porque tratamos tanto do conteúdo quanto da forma.
Adimanto — Também me parece.
Sócrates — Resta-nos tratar do caráter do canto e da melodia, concordas?
Adimanto — Sim, evidentemente.
Sócrates — Haveria alguém que não dissesse, de pronto, o que devemos dizer acerca deles e o que devem ser, se nos quisermos manter de acordo com as idéias precedentes?
Então, Glauco, sorrindo, disse:
— Por mim, Sócrates, corro o risco de ser a exceção, porque não estou muito em condições de inferir, neste momento, o que devem ser essas coisas; no entanto, suspeito-o.
Sócrates — Estás ao menos em condições de fazer esta primeira observação, que a melodia se compõe de três elementos: as palavras, a harmonia e o ritmo.
Glauco — Quanto a isso, sim.
Sócrates — Quanto às palavras, diferem das que não são cantadas? Não devem ser compostas segundo as regras que enunciamos há pouco e de forma semelhante?
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — E a harmonia e o ritmo devem corresponder às palavras?
Glauco — Sim.
Sócrates — Já dissemos que não deveriam existir queixas e lamentações nos nossos discursos.
Glauco — Com efeito, por serem desnecessárias.
Sócrates — Quais são as harmonias plangentes? Diz-nos, visto que és músico.
Glauco — São a lídia mista, a aguda e outras semelhantes.
Sócrates — Convém, pois, suprimi-las, não é verdade? Porque são inúteis para as mulheres honradas e, com maior razão, para os homens.
Glauco — Certamente.
Sócrates — Nada há mais inconveniente para os guardiães
do que a embriaguez, a moleza e a indolência.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Quais são harmonias efeminadas usadas nos
banquetes?
Glauco — A jânica e a lídia que se denominam harmonias lassas.
Sócrates — De tais harmonias, meu amigo, tu te servirás para formar guerreiros?
Glauco — De maneira nenhuma. Receio que não te restem senão a dórica e a frígia.
Sócrates — Não conheço todas as harmonias, mas deixanos aquela que imita os tons e as entonações de um valente empenhado em batalha ou em qualquer outra ação violenta, quando, por infortúnio, corre ao encontro dos ferimentos, da morte ou é atingido por outra infelicidade, e, em todas essas circunstâncias, firme no seu posto e resoluto, repele os ataques do destino. Deixa-nos outra harmonia para imitar o homem empenhado numa ação pacffica, não violenta mas voluntária, que procura persuadir, para obter o que pede, quer um deus por intermédio de suas preces, quer um homem por intermédio das suas lições e conselhos, ou, ao contrário, solicitado, ensinado, convencido, se submete a outro e, tendo por estes meios sido bem-sucedido, não se enche de orgulho, mas se comporta em todas as circunstâncias com sabedoria e moderação, feliz com o que lhe acontece. Estas duas harmonias, a violenta e a voluntária, que imitarão com mais beleza as entonações dos infelizes, dos felizes, dos sábios e dos valentes, estas deixa-as ficar.
Glauco — As harmonias que me pedes para deixar não são senão aquelas que mencionei há pouco.
Sócrates — Não precisaremos pois, para os nossos cantos e as nossas melodias, de instrumentos com muitas cordas, que reproduzem todas as harmonias.
Glauco — Não, por certo.
Sócrates — Nem tampouco precisaremos de fabricantes de triângulos, pedis e outros instrumentos de muitas cordas e harmonias.
Glauco — Não, aparentemente.
Sócrates — Admitirás em nossa cidade os fabricantes e os tocadores de flauta? Não é este instrumento que pode emitir mais sons, e os instrumentos que reproduzem todas as harmonias não são imitações da flauta?
Glauco — E evidente.
Sócrates — Assim, restam a lira e a citara, úteis à cidade;
nos campos, os pastores terão o pífaro.
Glauco — E o que se infere do nosso raciocínio.
Sócrates — De resto, meu amigo, não inovamos ao preferirmos Apolo e os instrumentos de Apoio a Mársias e seus instrumentos.
Glauco — Não, por Zeus! Não creio que estejamos inovando.
Sócrates — Mas, pelo cão! Sem nos darmos conta disso, purificamos a cidade que ainda há pouco dizíamos mergulhada na languidez.
Glauco — E o fizemos sabiamente.
Sócrates — Vamos concluir nossa reforma. Depois das harmonias, resta-nos examinar os ritmos; não devemos procurá-los variados, nem formando cadências de toda a espécie, mas diferenciar os que exprimem uma vida regulada e corajosa; quando os tivermos diferenciado, obrigaremos a cadência e a melodia a adequarem-se às palavras, e não as palavras à cadência e à melodia. Que ritmos são esses, compete a ti indicá-los como fizeste para as harmonias.
Glauco — Em verdade, não posso satisfazer-te. Que existem três espécies com as quais se entrelaçam todas as cadências,
como existem quatro espécies de tons de onde se tiram todas as harmonias, posso afirmá-lo, visto que o estudei; mas quais são aqueles que imitem tal gênero de vida eu não sei.
Sócrates — Consultaremos depois Damoni e perguntarlhe-emos quais são as cadências que convêm à baixeza, à insolência, à loucura e aos outros vícios, e que ritmos se devem deixar para os seus contrários. Creio tê-lo vagamente ouvido pronunciar os nomes de enópiio composto, dáctilo, heróico, mas não sei que arranjo dava a este último ritmo, em que igualava os tempos fracos e os tempos fortes e que terminava com uma breve ou uma longa. Também chamava, creio eu, a um “pé
iambo”, a outro “troqueu” e os marcava com longas e breves. E, em alguns desses metros, censurava ou louvava, se bem me lembro, o movimento da cadência, não menos que os próprios ritmos — ou algo que participava dos dois —, porquanto não o sei ao certo; mas, como dizia, coloquemos estas questões a Damorr discuti-las exigiria muito tempo. Que dizes?
Glauco — Penso do mesmo modo.
Sócrates — Mas, ao menos, poderás convir em que a graça e a falta de graça dependem da perfeição ou da imperfeição do ritmo.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Mas o bom e o mau ritmo seguem e imitam, um, o bom estilo, o outro, o mau, e o mesmo acontece com a boa e má harmonia, quando o ritmo e a harmonia se harmonizam com as palavras, como dizíamos há pouco, e não as palavras com o ritmo e a harmonia.
Glauco — É claro que ambos devem harmonizar-se com as palavras.
Sócrates — Mas a maneira de dizer e o próprio discurso não dependem do caráter da alma?
Glauco — Como não?
Sócrates — E todo o resto não depende do discurso?
Glauco — Depende.
Sócrates — Assim, o bom discurso, a boa harmonia, a graça e a euritmia dependem da simplicidade do caráter, não dessa tolice a que denominamos amavelmente simplicidade, mas da simplicidade autêntica de um espírito que alie a bondade à beleza.
Glauco — Perfeitamente.
Sócrates — Não devem, pois, os nossos jovens procurar em tudo essas qualidades, se quiserem realizar a tarefa que lhes é própria?
Glauco — Sim.
Sócrates — Também a pintura está repleta dessas qualidades, assim como todas as artes da mesma natureza. Está repleta delas a arte do tecelão, do bordador, do arquiteto, do fabricante dos outros objetos, e até a natureza dos corpos e das plantas; em tudo isto, com efeito, há graça ou feiúra. E a feiúra, a arritmia, a desarmonia são irmãs da má linguagem e do maucaráter, ao passo que as qualidades opostas são irmãs e imitações do caráter oposto, da sabedoria e da bondade da alma.
Glauco — Certamente.
Sócrates — Mas bastará velar sobre os poetas e obrigá-los a não introduzirem nas suas criações senão a imagem do bom caráter? Não devemos vigiar também os outros artesãos e impedi-los de introduzirem o vício, a incontinência, a baixeza e a feiúra na pintura dos seres vivos, na arquitetura ou em qualquer outra arte? E, se não puderem conformar-se a esta regra, não devemos proibi-los de trabalharem em nossa casa, com receio de que os nossos guardiães, criados no meio das imagens do vício como numa má pastagem, colham e pastem aí, um pouco cada dia, muita erva daninha e desta maneira reúnam, sem se darem conta, um grande mal na alma? Não devemos, ao contrário, procurar artistas de mérito, capazes de seguirem a natureza do belo e do gracioso, a fim de que os nossos jovens, a
semelhança dos habitantes de uma terra sadia, tirem proveito de tudo que os rodela, de qualquer lado que chegue aos seus olhos ou ouvidos uma emanação das obras belas, tal como uma brisa transporta a saúde de regiões salubres, e predispondo-os insensivelmente, desde a infância, a imitar e a amar o que é reto e razoável?
Glauco — Seria uma excelente educação.
Sócrates — E, decerto, por esta razão, meu caro Glauco,
que a educação musical é a parte principal da educação, porque o ritmo e a harmonia têm o grande poder de penetrar na alma e tocá-la fortemente, levando com eles a graça e cortejando-a, quando se foi bem-educado. E também porque o jovem a quem é dada como convém sente muito vivamente a imperfeição e a feiúra nas obras da arte ou da natureza e experimenta justamente desagrado. Louva as coisas belas, recebe-as alegremente no espírito, para fazer delas o seu alimento, e torna-se assim nobre e bom; ao contrário, censura justamente as coisas feias, odeia-as logo na infância, antes de estar de posse da razão, e, quando adquire esta, acolhe-a com ternura e reconhece-a como um parente, tanto melhor quanto mais tiver sido preparado para isso pela educação.
Glauco — Tais são as vantagens que se esperam da educação pela música.
Sócrates — Quando aprendíamos as letras, só considerávamos que as conhecíamos suficientemente ao nos darmos conta de que os seus elementos, em pequeno número, mas dispersos em todas as palavras, já não nos escapavam e, nem numa palavra curta nem numa comprida, não os desprezávamos, como inúteis de serem notados; então, ao contrário, esforçávamo-nos por distingui-los, convencidos de que não existia outra maneira de aprender a ler.
Glauco — É verdade.
Sócrates — E também verdade que não reconheceremos as imagens das letras, refletidas na água ou num espelho, antes de conhecermos as próprias letras, porquanto tudo isto é objeto da mesma arte e do mesmo estudo.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Assim também, pelos deuses, afirmo que não seremos músicos, nós e os guardiães que pretendemos educar, antes de sabennos reconhecer as formas da moderação, da coragem, da generosidade, da grandeza de alma, das virtudes suas irmãs e dos vícios contrários, onde quer que apareçam dispersos; antes de descobrirmos a sua presença, onde quer que se encontrem, elas ou as suas imagens, sem desprezarmos nenhuma, nem nas pequenas coisas nem nas grandes, convencidos de que elas são objeto da mesma arte e do mesmo estudo.
Glauco — Não pode ser de outra forma.
Sócrates — E, porventura, não seria o mais belo espetáculo, para quem o pudesse contemplar, o homem que reúne ao mesmo tempo boas disposições na sua alma e, no exterior, caracteres que se assemelham e harmonizam com essas disposições, porque participam do mesmo modelo?
Glauco — Sim, o mais belo.
Sócrates — O mais belo é também o mais digno de ser
amado?
Glauco — Como não?
Sócrates — Assim sendo, o músico amará esses homens tanto quanto possível; mas não amará o homem desprovido de harmonia.
Glauco — Convenho em que isso aconteça, pelo menos se for a alma a ter algum defeito; porém, se for o corpo, tomará o seu partido e consentirá em amar.
Sócrates — Sei que tens amado ou amas, e eu te aprovo. Mas diz-me: o prazer excessivo harmoniza-se com a temperança?
Glauco — Como poderia isso acontecer, visto que o excessivo prazer não perturba a alma menos que a excessiva dor?
Sócrates — E com as outras virtudes?
Glauco — Tampouco.
Sócrates — E com a insolência e a incontinência?
Glauco — Muitíssimas vezes.
Sócrates — Sabes de um prazer maior e mais vivo do que
o do amor sensual?
Glauco — Não, não há nenhum mais violento.
Sócrates — Por outro lado, o amor autêntico ama com
sabedoria e medida a ordem e a beleza?
Glauco — Por certo.
Sócrates — Logo, nada de violento nem de parecido com a incontinência deve aproximar-se do amor autêntico.
Glauco — Nada.
Sócrates — Portanto, a volúpia não se deve aproximar dele; não deve entrar no comércio do amante e da criança que se amam com amor verdadeiro.
Glauco — Não, por Zeus, Sócrates, não deve se aproximar!
Sócrates — Por isso mesmo, tu decretarias como lei, na cidade cujo plano estamos a traçar, que o amante possa adorar, visitar, abraçar o jovem como se fora um filho, objetivando um fim nobre, se conseguir convencê-lo; mas, quanto ao resto, deve ter com o objeto dos seus cuidados relações tais que nunca seja acusado de ir demasiadamente longe, se não quiser incorrer na censura de homem sem educação nem sentimento do belo.
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Sócrates — Não devemos, então, colocá-las em harmonia uma com a outra?
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — E a sua harmonia não toma a alma ao mesmo tempo moderada e corajosa?
Glauco — Certamente.
Sócrates — Ao passo que a sua desarmonia a torna covarde e grosseira?
Glauco — Sim.
Sócrates — Logo, quando um homem permite que a música o encante com o som da flauta e lhe derrame na alma, pelos ouvidos, essas harmonias suaves, moles e plangentes de que falávarinos há pouco, passa a vida distraído, exultante de alegria pela beleza do canto: em primeiro lugar, suaviza o elemento irascível da sua a]ma, como o fogo amolece o ferro e o torna útil, de inútil e dum que era antes; mas, se continua a entregar-se ao encantamento, a sua coragem não tarda a dissolver-se e a fundir-se, até se reduzir a nada, até ser extraída, como um nervo, da sua alma, tornando-o um guerreiro sem vigor.
Glauco — Tens razão.
Sócrates — E, se recebeu da natureza uma alma de’bil e frouxa, este resultado não se faz esperar; mas se, ao contrário, nasceu ardente, o seu coração enfraquece-se, toma-se impressionável e predisposto a irritar-se e a acalmar-se. Em vez de corajoso, ei-lo irritável, colérico e cheio de mau humor.
Sócrates — Porém, e se este homem se entrega inteiramente à ginástica e à boa mesa, sem se importar com a música e a filosofia? Em primeiro lugar, o sentimento das suas forças não o enche de orgulho e coragem e não se toma mais intrépido do que era?
Glauco — Não há dúvida.
Sócrates — Mas, se não fizer outra coisa e não mantiver contato com a musa? Ainda que tivesse na alma um certo desejo de aprender, como não participa em nenhuma ciência, em nenhuma pesquisa, em nenhuma discussão nem em nenhum exercício da música, esse desejo toma-se fraco, surdo e cego: não é despertado, nem cultivado, nem liberto dos grilhões das sensações.
Glauco — Assim e.
Sócrates — Ei-lo, pois, já feito inimigo da razão e das musas; já não se serve do discurso para persuadir; alcança em tudo os seus fins pela violência e a selvageria, como um animal feroz, e vive no seio da ignorância e da grosseria, sem harmonia e sem graça.
Glauco — E perfeitamente exato.
Sócrates — Existem na alma dois elementos: a coragem e a sabedoria; um deus, direi eu, deu aos homens duas artes, a música e a ginástica; não as deu para a alma e para o corpo, a não ser addentalmente, mas para aqueles dois elementos, a fim de que se harmonizem entre si, sendo estendidos ou soltos até ao ponto conveniente.
Glauco — Assim parece.
Sócrates — Aquele, pois, que associa com mais beleza a ginástica à música e, com mais tato, as aplica à sua alma, é músico perfeito e possui a ciência da harmonia muito mais do que aquele que afina entre si as cordas de um instrumento.
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Sócrates — Sabes que os tintureiros, quando querem tingir a lã de púrpura, começam por escolher uma só espécie de lã, a branca; em seguida, preparam-na, sujeitam-na a um longo tratamento, para que adquira o melhor possível o brilho da cor; por último, mergulham-na na tinta. E o que se tinge desta maneira é indelével: a lavagem, feita com ou sem dissolventes, não lhe desbota a cor; ao contrário, bem sabes o que acontece quando não se procede assim, quando se fingem lãs de outra cor ou mesmo lã branca sem prepará-la.
Glauco — Sei que a cor desbota e se torna feia.
Sócrates — Concorda, então, que procedemos, na medida das nossas forças, a uma operação semelhante, ao escolhermos os guerreiros e ao educá-los na música e na ginástica. Não penses que foi outra a nossa intenção: estávamos empenhados em que tivessem o melhor conhecimento possível das leis, a fim de que,
graças à sua natureza e a uma educação apropriada, tivessem, sobre as coisas a temer e o resto, uma opinião indelével, que não pudesse ser apagada por esses dissolventes terríveis que são o prazer — mais poderoso na sua ação do que qualquer álcali ou lixívia —, a dor, o medo e o desejo — mais poderosos
que qualquer dissolvente. E esta força que salvaguarda a opinião reta e legítima, no que diz respeito às coisas que são ou não são de recear, que eu invoco, que eu considero coragem, se nada tens a objetar.
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Sócrates — Mais ou menos desta forma: é difícil que um Estado constituído como o vosso venha a se alterar. Porém, como tudo o que nasce é passível de corrupção, este sistema de governo não durará eternamente, mas dissolver-se-á, e aqui tens o modo. Há, para as plantas enraizadas na terra e para os animais que vivem à sua superfície, ciclos de fecundidade ou de esterilidade que afetam a alma e o corpo. Estes ciclos surgem quando as revoluções periódicas completam as circunferências dos círculos de cada espécie, e são curtas para as que têm uma vida curta, longas para as que têm uma vida longa. Pois bem, por muito sábios que sejam os chefes da cidade que vós educastes, não conseguirão nada pelo cálculo unido à experiência, quer suas gerações sejam boas ou não venham a existir. Estas coisas escapar-lhes-ão e farão filhos quando não o deveriam fazer. Para a raça divina há um período que compreende um número perfeito. De modo contrário, para a raça humana é o primeiro número no qual os produtos das raízes pelos quadrados — abrangendo três distâncias e quatro limites — dos elementos que fazem a igualdade e a desigualdade, o crescente e o decrescente, estabelecem entre todas as coisas relações racionais. Desses elementos, agrupado ao número cinco e multiplicado três vezes, dá duas harmonias, sendo uma expressa por um quadrado cujo lado é múltiplo de cem, e a outra por um retângulo construído, por um lado, sobre cem quadrados das diagonais racionais de cinco, diminuídos cada um de uma unidade, ou das diagonais irracionais, diminuídos de duas unidades, e, por outro lado, sobre cem cubos de três. É este número geométrico total que determina os bons e os maus nascimentos e, quando os vossos guardiões, não o conhecendo, unirem moças e rapazes fora de propósito, os filhos que nascerem desses casamentos não serão favorecidos nem pela natureza nem pela fortuna. Os seus antecessores colocarão os melhores à cabeça do governo, mas, como disso são indignos, logo que assumirem os cargos dos seus pais passarão a menosprezar-nos, apesar de serem guardiões, não honrando, como deveriam, primeiramente a música, em seguida a ginástica. Assim, tereis uma geração nova bem menos culta. Daí sairão chefes pouco capazes de zelar pelo Estado e que não sabem notar a diferença nem das raças de Hesíodo nem das vossas raças de ouro, prata, bronze e feno.
Deste modo, misturando-se o ferro com a prata e o bronze com o ouro, resultará destas misturas um defeito de conveniência, de regularidade e de harmonia que, uma vez instaurado, engendra sempre a guerra e o ódio. E esta a origem que se deve atribuir à discórdia, em toda parte que se declare.
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ENCERRAMOS AQUI, TIRE SUAS CONCLUSÕES...