Pare de sofrer! Tenha uma vida de plenitude e consumo irrestrito da felicidade.

O artigo analisa algumas das ações da Igreja Universal do Reino de Deus nos Estados Unidos para atender a demanda dos imigrantes hispânicos por uma vida de plenitude e consumo irrestrito da felicidade.

Irmãos no sofrimento

Katy, Texas, subúrbio de Houston. Faz quase três anos que aqui estou e a fervorosa religiosidade partilhada por americanos e imigrantes tem estimulado a minha curiosidade desde o início. Igrejas proliferam em cada esquina, habitando edifícios que pelos padrões brasileiros poderiam ser confundidos com prédios comerciais de qualquer outro ramo. Vizinhos, conhecidos e até alguns amigos frequentam os cultos religiosamente, uma ou até duas vezes por semana.

Vou para o centro de Houston quase que diariamente. No caminho passo por um templo modesto, que por algum motivo ainda oculto me provoca interesse. Decido investigar a origem da minha curiosidade e me deparo com um nome que mais parece um mandato. Direto, enuncia, ao mesmo tempo em que promete e ordena, em espanhol: “Pare de sufrir”.

A descoberta desse nome próprio, do qual não me lembrava, aguça ainda mais o enigma. Reconheço que tenho os meus sofrimentos, porém nenhuma esperança de erradicá-los definitivamente. Decido então, um pouco por curiosidade antropológica e outro por pura intuição, pesquisar do que se trata.

Ao recorrer à internet, a primeira surpresa. Descubro que faz parte do investimento transnacional da Igreja Universal do Reino de Deus, neopentecostal brasileira fundada por Edir Macedo em 1977.

Chama-me a atenção perceber que estou diante de uma igreja brasileira que, nos Estados Unidos, fala espanhol. O que poderia ter sido uma igreja étnica, voltada para uma comunidade nacional específica, revela-se neste caso um território que não visa fornecer aos seus fiéis o aconchego dos valores culturais e dos vínculos relacionados à comunidade de origem, como poderia se esperar desse tipo de instituição.

Tal característica situa a Igreja Universal/Pare de Sofrer entre as congregações etnicamente misturadas, onde a identidade se constrói em torno de um sentimento de latinidade, alimentado pelo sofrimento que todos os fiéis têm em comum e que é impingido pelas mãos de autoridades de imigração, empregadores e proprietários. (LEONARD, 2005)

A terra prometida

A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) inaugurou o seu primeiro templo nos Estados Unidos em 1986. Edir Macedo destacou desde o início o valor simbólico de implantar um templo na cidade de Nova York, ponto geográfico privilegiado para a evangelização global, por concentrar imigrantes de todas as nações.  (KRAMER, 2003)

Kramer (2003) identifica três fases no crescimento da Universal nos Estados Unidos. A implantação, entre 1986 e 1989, inicia-se em Nova York (Manhattan) e se estende para Newark e New Jersey; a segunda etapa, de 1990 a 1992, representada pela expansão para a região de New England e Miami; e o terceiro momento, desde 1993 até a publicação do artigo em 2003, inaugurada com a chegada da Universal a Los Angeles, Califórnia. O autor apontava naquela oportunidade que em quatro anos a IURD estaria montando igrejas no Centro-Oeste (Chicago) e no Sudoeste (Texas e Arizona). Analisando essa expansão geográfica (Kramer, 2003) afirmava ainda que a mesma estaria “seguindo à risca uma estratégia para atingir os imigrantes hispânicos nos Estados Unidos”.

De um total de 38.452.822 imigrantes nos Estados Unidos, 53 % são hispânicos. Mais da metade desses 53%, 11.100.000, está no país de maneira ilegal, seja porque entraram sem visto, correndo todos os riscos que isso implica, seja porque após entrarem nos Estados Unidos o prazo de estadia legalmente permitido venceu e permaneceram no território. Do total de 150 templos divulgados no site da Igreja nos Estados Unidos, 86% localizam-se nos estados que congregam 67% do total de imigrantes ilegais hispânicos.

Leia a matéria completa assinando a Revista da ESPM.

Valéria Ravier

Antropóloga, consultora de Marketing com MBA pela ESPM/SP e escritora

http://revistadaespm.espm.br/?p=62