A CRIANÇA COM DISLEXIA
Por: Luan B.
27 de Outubro de 2018

A CRIANÇA COM DISLEXIA

um olhar psicopedagógico

Pedagogia Ensino Fundamental Acompanhamento Psicopedagogia Clínica Psicopedagogia atendimento psicopedagógico Neuropesicopedagogia Neuropedagogia Alfabetização Geral

RESUMO

 

Este artigo objetivou apresentar informações acerca da dislexia e como o psicopedagogo articula o conhecimento da doença junto ao conhecimento científico. O processamento da dislexia, suas características e estratégias de acompanhamento são aqui apresentados. Também serve como auxílio aos educadores na medida em que esclarece alguns pontos importantes da dislexia e visa dar suporte inicial para a compreensão deste problema. O trabalho é pautado na metodologia da revisão bibliográfica acerca da dislexia e, num segundo momento, da atuação do psicopedagogo nestes casos. A revisão de alguns autores especialistas em intervenção com pessoas disléxicas apontou que o acompanhamento deve ser realizado por equipe multidisciplinar, para que tenham um bom desempenho escolar e para a vida. Sem contar que a presença de um psicopedagogo é bastante importante, visto que seu enfoque é na solução e superação, através de mecanismos científicos, profissionais, terapêuticos e alternativos, de problemas que afetem, direta ou indiretamente, a aprendizagem.

Palavras-chave: Dislexia, distúrbios de aprendizagem, educadores, psicopedagogo.

 

INTRODUÇÃO

É apenas com o coração que se pode ver direito; o essencial é invisível aos olhos.

Antoine de Saint Exupéry

 

Na contemporaneidade, praticamente todos defendem os princípios da Escola Inclusiva, entendendo ser esta o acesso para todos e crendo na capacidade dos educadores para mediar um desenvolvimento pleno dos alunos. Portanto, é imprescindível que se tenha em mente que a noção de Escola Inclusiva é muito mais ampla, não apenas a de levar crianças portadoras de Necessidades Educacionais Especiais (NEE) às escolas regulares e sim celebrar a diferença, preocupando-se com a singularidade e individualidade de cada criança. Isso deve ser expandido para todos os âmbitos sociais de convivência da criança.

Como aponta Pinheiro, (2009, p.14) sobre a Escola Inclusiva, "[…] esta escola abrange alunos diversificados, alguns com Necessidades Educativas (sic) Especiais (NEE), sendo necessárias práticas adaptativas e enriquecedoras, não só para estes alunos, como para todos os outros. Deste modo, cabe à escola incluir da melhor forma possível alunos que têm características muito diferentes no que respeita às motivações, projectos (sic) de vida, competências, meios culturais de origem e desenvolvimento cognitivo e socio-afectivo (sic)."

Assim, é importante focalizar as pesquisas nas áreas de educação às novas nuances de escolas surgidas na atualidade e como a Psicopedagogia pode auxiliar tanto no processo ensino-aprendizagem como também numa melhor forma de se relacionar do aluno. Incluir é algo novo, contudo tem grande respaldo científico e humanitário. São as pesquisas, tanto por parte da Pedagogia, quanto das demais Ciências Sociais, e há pouco mais de vinte anos da Psicopedagogia, que essa prática pôde se tornar uma constante e habitual situação em nossa sociedade.

A Educação Inclusiva é um direito garantido a todos e educar é um ato cotidiano revelado em cada ato, não apenas do professor, mas também de pais, familiares e profissionais que têm a criança como objeto de trabalho. Assim sendo, este artigo justifica-se na medida em que busca contribuir para a interação da escola com os demais membros educacionais, tento sempre o objetivo de suprir as necessidades dos alunos, segundo as dificuldades apresentadas. É de fundamental importância refletir sobre as práticas docentes e sobre o papel da escola frente ao desafio que é incluir.

"A realidade da inclusão não é uma exclusividade do Brasil, mas sim uma ação política, social, cultural e pedagógica mundial, que nasce como consequência da convicção da união dos alunos, que juntos no processo de aprendizagem constroem conhecimento e participam ativamente de seu processo emancipatório" (BRASIL, 2008).

A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias histórias da produção da exclusão dentro e fora da escola (BRASIL, 2008, p.5).

Vale lembrar que a Constituição Federal (BRASIL, 1988), tem como um de seus objetivos fundamentais “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art.3º inciso IV) e define, no art. 205, que a educação é direito de todos, garantindo o desenvolvimento pleno da pessoa, garantia da cidadania e qualificação para o trabalho. E no artigo seguinte expressa claramente, no inciso I, que a “igualdade de condições de acesso e permanência na escola” (BRASIL, 1988, art. 206), garantindo, no art. 208, a educação gratuita e de qualidade como dever do Estado, além da oferta do atendimento educacional especializado, preferencialmente, na rede regular de ensino.

Dessa forma, pode-se perceber a importância da inclusão dos portadores de NEE. Contudo, nota-se que grande parcela dos profissionais da educação tem pouco conhecimento ou preparo para perceber dificuldades de aprendizagens não tão gritantes como, por exemplo, a dislexia, que passa, muitas vezes, como uma falta de interesse ou atenção do aluno que, por sua vez, por não conseguir assimilar o conteúdo passa a se sentir desmotivado e se tornando o “aluno bagunceiro”, como também por pais e familiares. Tipificar ou mesmo estigmatizar um aluno pode apenas agravar o quadro da síndrome.

Como apontam vários autores, os problemas de aprendizagem podem surgir em qualquer etapa do processo de ensino-aprendizado das crianças e cada um segundo sua especificidade. Assim sendo, o processo de ensino-aprendizagem deve ser feito segundo as capacidades de cada criança, respeitando-as, como bem afirma Vallet (1989, p.143) ao dizer que “As crianças aprendem melhor as palavras quando seu significado é enfatizado pelo estabelecimento de associações com percepções visuais, palavras, sons e ilustrações”. Isso implica um dispêndio de tempo e dedicação tanto de professores quanto de pais e familiares.

A escola, sob esse paradigma, é uma instituição que deve se ater no desenvolvimento integral da criança, sem, em momento algum, deixar de se valorizar as convicções individuais e as habilidades motoras dos indivíduos, articulando essas com os hábitos e habilidades cognitivas (LUCKESI, 1995), levando tais bases para o âmbito familiar.

Para melhor entendimento do que é dislexia buscou-se apresentar as diferentes concepções da dislexia. Segundo Vallet (1989, p.59), "As crianças disléxicas são comumente deficientes na aquisição e no desenvolvimento de diversas capacidades de linguagem. Linguagem receptiva, linguagem mediacional-associativa e linguagem expressiva são as principais capacidades nas quais essas crianças são deficientes. Todas essas capacidades são interrelacionadas (sic) e inseparáveis."

Percebe-se, portanto, que o autor destaca as dificuldades do processo de aquisição da linguagem como principal característica da dislexia, o que contribui para um retrocesso de aprendizagem do aluno durante o período de aprendizagem, o que interfere na sua vida futura.

Segundo o conceito da International Dyslexia Association (IDA), citado por Domiense (2011, p.21), dislexia é um “[…] distúrbio específico da linguagem, de origem constitucional, caracterizado pela dificuldade de decodificar palavras simples”. Assim, a dislexia não é enquadrada como doença, impossibilitando que se prescreva uma “cura”, mas sim um acompanhamento para uma adequação do processo de ensino-aprendizado.

Uma síndrome ainda pouco conhecida e pouco diagnosticada por pais ou professores, a identificação de sintomas da dislexia pode ser observada pelo histórico do aluno e as manifestações linguísticas durante as aulas de português e em casa durante o processo de leitura e interpretação de textos dessas crianças (DOMIENSE, 2011, p.21).

Vários autores afirmam que o termo ou mesmo a própria natureza da síndrome não são suficientemente claros ou concisos, o que não permite o estabelecimento de critérios fixos e gerais para todos os diagnósticos de dislexia.

 Varella, (2010), observa que a falta de diagnóstico e da assistência adequada das crianças disléxicas por profissionais adequados impede a estabilização do quadro, favorecendo, em muito, para seu agravamento. Contudo, para o correto diagnóstico da dislexia é importante que sejam executados outros exames para diagnosticar ou eximir a presença de outros distúrbios que possam ser confundidos.

 

TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM E A DISLEXIA.

      

Sabe-se que existem vários tipos de NEE. Aqui, tratar-se-á da dislexia, que é apenas uma entre tantas outras. Observa-se, todavia, que a dislexia está comumente presente em nosso cotidiano enquanto palavras, mas apresenta muita obscuridade quando se pensado suas características, especificidades e isso se torna mais visível se comparada aos demais transtornos de aprendizagem.

Quando se pensa em problemas/transtornos de aprendizagem, vislumbra-se uma quantidade grande de pessoas que os vêm como uma situação sintomática, onde sinais de descompensação tornam-se a marca principal do problema. De toda forma, faz-se necessário definir que há uma diferença entre “transtorno” de aprendizagem e “distúrbios” de aprendizagem (DOMIENSE, 2011).

As crianças disléxicas são comumente deficientes na aquisição e no desenvolvimento de diversas capacidades de linguagem. Linguagem receptiva, linguagem mediacional-associativa e linguagem expressiva são as principais capacidades nas quais essas crianças são deficientes. Todas essas capacidades são inter-relacionadas e inseparáveis. (VALLET, 1989, p. 59), e isto aponta a importância de se rever e refletir acerca da forma como se conduz as propostas pedagógicas junto às crianças.

Os profissionais de educação e saúde devem se questionar quais as possibilidades de crescimento, transformação e desenvolvimento que se possibilita e as permite se emponderar do conhecimento que se está sendo construído?

Segundo DOMIENSE (2011), vários estudiosos buscaram definir o que é a Dislexia. Reinold Berlim, em 1984, definiu a dislexia como sendo uma condição ocorrida quando pessoas normalmente inteligentes apresentavam dificuldades de leitura, enquanto Critchey, em 1970, como uma perturbação cujo principal sintoma é a dificuldade em aprender a ler, sendo que para ele a dislexia seria considerada um problema de aprendizagem quando a criança esteja num ensino convencional, a inteligência da mesma seja normal, o meio sociocultural seja suficiente e o déficit cognitivo na área de leitura esteja presente.

“A dislexia é uma dificuldade duradoura da aprendizagem da leitura e aquisição do seu mecanismo, em crianças inteligentes, escolarizadas, sem quaisquer perturbações sensorial e psíquica já existente” (FONSECA, 1999, p.35). Assim, segundo Fonseca (1999) a dislexia não é consequência de uma deficiência, nem mesmo de um atraso intelectual, mas sim um transtorno específico na capacidade de aprendizagem da linguagem das crianças. Que pelo fato de não terem qualquer deficiência ou atraso intelectual, a contraponto, têm todas as condições, quer sociais, culturais e/ou econômicas necessárias para a aprendizagem da linguagem, revelam na área linguística dificuldades para a sua aquisição. A dislexia diz respeito a uma dificuldade funcional situada numa parte do cérebro provocando dificuldades no processo de aquisição e utilização da linguagem. É um problema de caráter cognitivo.

Para se compreender o problema da dislexia, há de se compreender sua definição e buscar, novamente, sua solução.Conhecer o problema torna-se, dessa forma, uma condição imprescindível para resolvê-lo. A etimologia para o termo dislexia: DIS = distúrbio ou dificuldade; LEXIA = dolatim “leitura” e/ou do grego “linguagem”. Assim, DISLEXIA = distúrbio de linguagem (LANHEZ e NICO,2002). Também se enfatiza que existem dois tipos de dislexia: a de evolução e a adquirida; tratar-se-á neste artigo da primeira, que é de caráter congênito e/ou hereditário. A título de curiosidade, a segunda advém como uma consequência seja de traumatismo craniano seja de acidente vascular, entre outros.

Segundo Orton (apud LANHEZ e NICO, 2002), a dislexia, como o próprio termo indica, não deve ser enquadrada na situação de doença, mas sim dedistúrbio: “É uma dificuldade no processo de leitura, escrita, soletração e ortografia. [...] Torna-se evidentena época da alfabetização, embora alguns sintomas já estejam presentes em fases anteriores” (ORTON apudLANHEZ e NICO, 2002, p. 21). A partir dessa definição, infere-se que a criança não adquire a linguagem da formacorreta como deveria adquirir, embora isso não indique que a mesma não tenha inteligência suficiente ou não apresente nenhum distúrbio cognitivo.

Lanhez e Nico(2002), também apontam a definição da IDA, elaborada no Comitê de Abril de 1994, que é, atualmente, a mais usada nas pesquisas de neuroanatomia e neuropsicologia, dentre as demais áreas, na qual a dislexia é entendida como um distúrbio de aprendizagem que tem origem constitucional, sendo caracterizada pela dificuldade que o indivíduo apresenta em decodificar palavras simples em idade onde isso não corresponde a tal realidade. A criança apresenta umainsuficiência no processo fonológico e também um atraso na aquisição e uso da linguagem.

Existe a possibilidade de que a dislexia possa ter uma causa cerebral, embora ainda haja muitas dúvidasquanto a essa questão. Mas foi constatado que o volume do lobo temporal direito é maior que o esquerdo,atribuindo, assim, a existência de uma base neurológica e biológica para o distúrbio. (LANHEZ e NICO,2002)

Sabendo o que é a dislexia, deve-se estar atento aos seus sintomas, pois os profissionais da Educação lidarão diretamente com a questão da escrita, e é indispensável a identificação dacriança que apresente dificuldades nessa área. Abaixo, segue os principais indícios das pessoas disléxicas, apesar de só poder ser detectada por especialistas. Se oaluno apresentar inteligência abaixo do esperado, ele pode se enquadrar em outros tipos de dificuldades. Entre os sintomas mais comuns estão: "Desempenho inconstante; demora na aquisição da leitura e da escrita; lentidão nastarefas de leitura e escrita, mas não nas orais; dificuldade com os sons das palavrase, consequentemente, com a soletração; dificuldade em associar o som aosímbolo [...] desconforto ao tomar notas e/ou relutância para escrever; persistênciano mesmo erro, embora conte com ajuda profissional." (LANHEZ e NICO, 2002,p. 26-27).

Além destes, sabe-se que a dificuldade para organizar coisas que sigam uma sequência, seja as letras do alfabeto, meses, dias da semana, ou numerais; e a dificuldade em se organizar. Como apontamLanhez e Nico (2002), a maior parte desses sintomas está ligada à memória de curto prazo ou, como também é conhecida, a “memóriaimediata”, que é vital para o processamento de leitura, permitindoguardar informações pelo período de tempo necessário para serem processadas corretamente. Uma vez que osdisléxicos possuem falhas em relação à memória de curto prazo, há lentidão no processamento de leitura e, consequentemente, na compreensão de sentido de uma frase ou parágrafo. Motivo pelo qual muitas crianças disléxicas costumam se atrasar em encontros ou apresentamdificuldades para encontrar endereços na lista telefônica.

A dificuldade observada na aprendizagem da leitura e da escrita e o fraco desempenho nos testes de leitura ede escrita pertencem ao nível do comportamento. Entende-se que a dislexia é um desordenamento do desenvolvimento,devendo ser explicada a partir de três origens: (1) biológica, que causa um déficit cognitivo, o qual, por sua vez,resulta em um padrão particular de comportamento; (2) uma anormalidade cerebral e (3) um déficitcognitivo. As influências ambientais são vistas como atuantes em todos esses três níveis (PINHEIRO, 2002).

Pode-se fazer um diagnóstico precoce da dislexia, sendo necessário apenas ficar atento a alguns sinais anteriores à aquisição da linguagem escrita, isso por volta dos 6 anos de idade. Ao invés de considerarmos tais sinais como indícios de “imaturidade” devem-se avaliá-los com mais atenção. Alguns destes sinais são: a) Antecedentes familiares: verificar se existem familiares com problemas de dislexia; b) Atraso na aquisição da linguagem oral, tendo dificuldade em falar com clareza; c) Confusão no vocabulário que diz respeito à orientação espacial (ex.: esquerdo-direito); d) Confusão na pronúncia de palavras que se assemelham atendendo à sua fonética; e) Dificuldade em nomear coisas; e f) Dificuldade em elaborar rimas. (LANHEZ, NICO, 2002; LIMA, CAMEIRÃO, MEIRELES, 2005; LUCKESI, 1995, PINHEIRO, 2009)

Fato imprescindível a evidenciar é que, quer a família, quer a escola, ambas têm um papel fundamental no processo de re-educação, fornecendo aos portadores de dislexia instrumentos diversos e alternativos na aquisição da linguagem, que tantos problemas escolares, afetivos e sociais podem trazer ao indivíduo.

À família cabe, para muito além de perceber que algo não está bem, segundo alguns dos índices atrás referidos, ser o suporte afetivo da criança disléxica. É, de fato, muito importante incentivar e alimentar a auto-estima da criança, providenciando apoio especializado e estar em sintonia com a escola. Como já referido, uma criança disléxica não o é por ter um coeficiente de inteligência inferior para a sua idade, pelo contrário, pode até tê-lo superior, contudo a sua aprendizagem pode ser dificultada por este fato e, posteriormente, promover outro tipo de situações em termos psicológicos, tais como depressão, agressividade, baixa autoestima, etc.

Os professores têm um papel muito importante, pois estes, em conjunto com pedagogos, psicólogos, psicopedagogos, sociólogos entre outros profissionais de educação, deverão diversificar mecanismos de entrada da informação. Deverão construir o conhecimento linguístico utilizando suportes que permitam suprir as dificuldades apresentadas pela criança disléxica. A dislexia tem múltiplas faces e não se manifesta, ou melhor, não é um transtorno idêntico em todos os indivíduos.

As atuações a observar pela escola para a aprendizagem eficaz nos alunos disléxicos passam não só pela a atenção que se deve ter ao meio social e familiar, pois este pode favorecer ou piorar a situação do aluno disléxico, mas também implementar metodologias de leitura, que permitam uma “re-aprendizagem” das técnicas de leitura e escrita. Utilizar atividades e exercícios que possam ajudar, tanto reforçando a memória de curto prazo, como realizar exercícios com o alfabeto, faz com que sejam realizados por diferentes mecanismos de entrada: visuais, auditivos, tácteis, desenvolvendo os processos cognitivos associados ao processo de linguagem.

As dificuldades percebidas na dislexia são muitas vezes inesperadas, especialmente quando se considera o nível de outras capacidades cognitivas e a existência de uma instrução adequada. A história de instrução do indivíduo é um aspecto crítico para a compreensão da natureza das dificuldades de leitura observadas. Muitas crianças correm o risco de falharem na leitura devido a desvantagens ao nível da educação na primeira infância e das experiências na pré-escola. Deste modo, entram, frequentemente, na escola sem terem adquirido muitas capacidades linguísticas e de “pré-leitura” essenciais, fundamentais para um desenvolvimento normal da leitura. Se a instrução não for ajustada ao ensino das competências que a criança não domina, a falha na leitura ocorrerá frequentemente. (LYON et al., 2003 apud LIMA; CAMEIRÃO & MEIRELES, 2005).

Dentre os cuidados que a escola e os pais devem ter em relação aos disléxicos, deve ser destacados: dar encorajamento ao aluno e/ou filho; atender e respeitar as capacidades e os limites dessa criança; estar informada para amparar o aluno em sua dificuldade; manter todos ao seu redor familiarizados e sensibilizados com a dislexia para compreender e apoiar na sala de aula, em casa, na vizinhança e demais lugares que ela for e ainda reconhecer a necessidade de ajuda; e, por fim, desenvolver um clima de paciência extra para que a criança tenha tempo de cumprir sua tarefa e até mesmo repeti-la várias vezes (LANHEZ, NICO, 2002. LIMA, CAMEIRÃO,  MEIRELES, 2005. PINHEIRO, 2002; 2009).

Há várias formas de ajudar uma criança que apresenta a dislexia ou qualquer outro tipo de dificuldade de aprendizagem. Entretanto, em suma, o principal é que a criança interaja normalmente com os demais colegas e tenha um professor que compreenda seus problemas. Caso o professor se sinta despreparado para ajudar o aluno, ele deve solicitar a ajuda de outros profissionais, como psicólogos, fonoaudiólogos e psicopedagogos para a devida orientação de como trabalhar com aquele aluno dentro e fora de sala de aula.

O educador, junto aos pais, deve ter consciência que a criança disléxica enfrenta muitos fracassos e algumas tarefas impossíveis durante a aula. Por isso, é importante que o professor considere os pequenos avanços que o aluno demonstrar, pois essa apreciação estabelecerá certa autoconfiança. Quando o professor interessa-se pelo aluno como pessoa, eleva a auto-estima dele.

Em suma, é preferencial que todas as atividades de estimulação da linguagem escrita nas séries iniciais do Ensino Fundamental sejam realizadas de forma lúdica, através de jogos e brincadeiras, para que a criança sinta prazer em ler e escrever.

 

A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA

 

Frith (1985) descreveu três estratégias pelas quais as crianças devem passar durante o processo de aprendizagem a leitura e da escrita. Conforme sua descrição, a primeira seria a Estratégia Logográfica, onde ocorre a correspondência global da palavra escrita com o seu atinente significado. Tal etapa é ausente de possibilidade de análise, contudo, a fase subsequente é a Estratégia Alfabética onde se demanda consciência fonológica e capacidade de segmentar a palavra em fonemas, os convertendo em grafemas. É nessa etapa em que se deve trabalhar apoiado na oralidade. Por fim, a última seria a Estratégia Ortográfica, onde já se deve ter experiência suficiente com a leitura para que se possa montar um dicionário visual das palavras. É quando há um acesso instantâneo à palavra, é a partir dessa etapa que a leitura se torna significativa e ágil, e o uso de analogias lexicais de palavras conhecidas para escrever neologias ou palavras até então desconhecidas.

Conforme explicita Mousinho (2003) a criança portadora de dislexia apresenta uma dificuldade em chegar nestas duas últimas fases descritas por Frith. Quase sempre a maioria fica presa na Estratégia Logográfica, e alguns poucos conseguem utilizar a Estratégia Alfabética, contudo com muita dificuldade e esforço. Como consequência, essas crianças passam a ler menos, o que acarretaria num dicionário léxico menor e pobre. Com tais dificultadores, a Estratégica Ortográfica fica extremamente prejudicada.

Rotta & Pedroso (2007) afirmam que passa confiança à pessoa com dislexia é importante, uma vez que esta necessita de atenção especial e se sentirá mais à vontade para solicitar ajuda quanto necessitar. Tal capacidade favorece o ensino de todos os alunos, não apenas dos disléxicos, devendo ser uma constante na prática educacional.

Eles também afirmam que o material oferecido ao disléxico ler deve ser apropriado ao seu nível estratégico de alfabetização, e os aspectos positivos sempre devem ser destacados em seus trabalhos. Outro ponto importante é aceitar que o aluno disléxico se distrai com muita facilidade e a leitura em público deve ser descartada, assim como cópia de textos longos e redução de deveres de casa que envolva leitura e escrita. Ferramentas que podem auxiliar são calculadoras, gravadores, corretores, etc.

O tratamento é focado na reeducação da linguagem escrita, visto que as diferenças são pessoais, o diagnóstico é clínico, o entendimento é científico e o tratamento é educacional. E para que o tratamento educacional aconteça precisa-se de uma proposta de ação pedagógica realizada pelo psicopedagogo.

No que tange a avaliação, deve sempre que possível ser orais, com previsão de tempo extra como recurso obrigatório, evitar as múltiplas escolhas, avaliar os trabalhos pelo conteúdo e não pelos erros de escrita e oportunizar local tranqüilo para que sejam realizadas (ROTTA & PEDROSO, 2007).

Deuschle & Cechella (2009) enfatizam que o tratamento deve ser baseado nos princípios basais da aprendizagem da leitura, no processo de câmbio de grafema em fonema e no reconhecimento global da palavra. O intuito é que a criança disléxica aprenda a organizar verbalmente os estímulos visuais e auditivos para que, posteriormente, seja mais fácil associar a palavra ao seu significado.

Ressalta-se que a importância dada ao estímulo na tomada da consciência fonética para a decodificação em uma consciência ortográfica capaz de corrigir os lapsos visuais é fundamental no tratamento das crianças que iniciaram o processo de aquisição da escrita, enquanto para as que não iniciaram tal processo, a terapia evolutiva procurará desenvolver áreas sensório-motoras da criança para que esta consiga obter os códigos (DEUSCHLE & CECHELLA, 2009).

É tácito que a dislexia implica, necessariamente, uma abordagem mediante uma estratégica psicopedagógica que vise estabelecer os nexos entre a recepção do estímulo e sua incorporação ao léxico (DEUSCHLE e CECHELLA, 2009).

Como afirmam Salles, Parente e Machado (2004) é fundamental para o sucesso da intervenção haja uma avaliação criteriosa e multidisciplinar, assim como o processo de avaliação dos fatores cognitivo-linguístico deve estar intimamente conectado aos modelos teóricos de aprendizagem da leitura. 

No que tange a intervenção psicopedagógica, os aprendentes portadores de dislexia necessitam participar de atividades que promovam o desenvolvimento da consciência fonológica (ETCHEPAREBORDA, 2002). Ressalta-se, contudo, que a identificação precoce da dislexia é importante vis-à-vis a maior plasticidade da massa encefálica em crianças e sua maior maleabilidade para um redirecionamento dos circuitos neurais (ETCHEPAREBORDA, 2002).

Destarte, um ensino que reconheça os problemas específicos de tais alunos assaz poderá contribuir para o seu desenvolvimento. Coligadas a uma terapêutica interdisciplinar (às vezes sendo cogente priorizar um tratamento em um dado momento), a escola e a família desempenham uma função vital para que a dislexia não se torne mais um fator de bloqueio no desenvolvimento acadêmico. O professor é imprescindível neste caminho, identificando, em um primeiro momento, e podendo compreender e auxiliar essas crianças e jovens em seu processo educativa.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Quando se trata de dislexia, um distúrbio de aprendizagem bastante comum nas escolas e que prejudica, demasiadamente, o processo de aprendizagem da criança, uma vez que seu diagnóstico e suas nuances podem variar de pessoa para pessoa e não ser algo tão simples e fácil de identificar. De forma geral, percebeu-se que a dislexia afeta, de forma mais notável, a leitura e a escrita, sendo uma das grandes razões das repetências nas escolas. Dessa forma, entende-se que a dislexia é um distúrbio de aprendizagem que influencia de forma negativa e significativa o processo de aprendizagem do aluno, tendo causas genéticas e, também, neurológicas.

Os estudos apresentados neste artigo apontam os conceitos, as características e as estratégias que auxiliaram nos trabalhos junto às crianças disléxicas no processo de aquisição da leitura e escrita. Mostrando que o problema da dislexia não tem sua solução em curto prazo, mas um processo lento e gradual, uma vez que não se trata de doença e não tem cura. Faz-se necessário uma parceria entre família e escola, o acompanhamento de profissionais específicos com formação e qualificação para ajudar na adequação dos métodos de ensino-aprendizagem e na criação de alternativas às metodologias tradicionais, lembrando que o acolhimento e sentimento de pertencimento da criança favorecem a superação do quadro.

De todo, é sabido que um trabalho conjunto entre professores, pedagogos, psicopedagogos, psicólogos, fonoaudiólogos e neurologista fará com que o processo de adequação e superação da criança seja mais intenso e factível. Apenas querer que o aluno passe de ano não faz com que ele consiga ter uma vida plena após a escola, o principal objetivo da educação básica é preparar para a vida, para o trabalho e para a cidadania, uma pessoa com dificuldade de leitura, escrita e, por conseguinte, de interpretação não conseguirá desenvolver plenamente tais capacidades, sendo-lhes ceifada a possibilidade de agir. Uma equipe completa, bem preparada e entrosada contendo os profissionais acima relacionados e que são apontados pela literatura especializada favorecerá a superação das principais características da dislexia e possibilitará o indivíduo a atuar de forma empoderada da vida social, cultural, política e econômica.

Como é de conhecimento de todos – cada caso é um caso –, cada criança tem suas características únicas e este distúrbio pode aparecer com nuances em cada uma delas. Cabe aos professores ver cada criança, cada aluno, como singular, vendo-os não como uma turma, mas como indivíduos que compõem uma turma, e evitando rotulá-los.

Na interação entre família e escola, a busca de profissionais qualificados para a intervenção terapêutica, além da aceitação da escola e do professor em agir conforme as instruções do psicopedagogo é de fundamental importância para que o tratamento da dislexia seja eficiente e eficaz, possibilitando à criança que ela viva normal e aprenda a lidar com seu transtorno, visto que este lhe acompanhará durante toda a vida.

REFERÊNCIAS

 

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