PSICOLOGIA OU SOCIOLOGIA?
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Por: Luan B.
26 de Outubro de 2018

PSICOLOGIA OU SOCIOLOGIA?

Uma discussão da localização da Psicologia Social no campo científico

Sociologia Geral Geral Campo Científico Psicologia Social Psicologia Psicossociologia Sociologia Clínica Metodologia de Pesquisa Bourdieu Teoria dos Campos

1 INTRODUÇÃO

 

Na vida anímica individual aparece integrado sempre, efetivamente, “o outro”, como modelo, objeto, auxiliar ou adversário, e, deste modo, a psicologia individual é ao mesmo tempo e desde um princípio psicologia social, em um sentido amplo e plenamente justificado (FREUD, 2011, p.14).

 

O que é Psicologia Social? Como ela se constituiu? Qual seu objeto de pesquisa? Quais seus métodos? Quais suas origens? Essas são questões ontológicas e epistemológicas que permitem a compreensão de um determinado ramo da ciência, assim como a delimitação de qual o campo científico em que ela se insere. Para tal, nada mais evidente que trazer a história do ramo científico pesquisado, nesse caso específico, a Psicologia Social.

Num primeiro momento é importante salientar que Psicologia Social, Sociologia Psicológica ou Psicossociologia são sinônimas. Termos diferentes na Língua Portuguesa, porém que têm raízes inglesas idênticas. Nos três casos apresentados acima, o termo originário em Inglês é “Social Psychology”.

Aqui, buscou-se uma revisão bibliográfica a partir de produções nacionais e, também, internacionais, visto que a Psicologia Social não é uma ciência brasileira, nem tampouco que as obras nacionais sejam suficientes para conseguir fazer uma breve trajetória histórica.

Contudo, obras de Psicólogos Sociais como Sílvia Lane e sua contribuição para a Psicologia Social no Brasil não poderia faltar neste trabalho que em sua primeira parte, basicamente, é composto de uma sucinta tentativa de responder as duas primeiras perguntas feitas aqui, assim como a última, o que culmina numa historiografia sem maiores aprofundamentos, mas capaz de instigar dúvidas e mais questionamentos, assim como a compreensão da dificuldade em se definir o campo da Psicologia Social.

Num segundo capítulo, as terceira e quarta perguntas serão respondidas, mas sempre sem fechar todas as possibilidades, afinal, como uma ciência social, a Psicologia Social tem uma gama vasta de métodos e técnicas que podem e devem ser aplicadas de acordo com as necessidades de cada local, tempo e história do grupo em questão.

De maneira alguma este trabalho tem o objetivo de definir todos os conceitos e toda a história da Psicologia Social, apenas apontar alguns problemas e questionar quanto a futuras alternativas que aqueles que desejam se enveredar nos caminhos da Psicologia Social devem estar preparados a se questionarem, responderem e criarem. A Psicologia como qualquer outra ciência que se arrisca a compreender o ser humano em seus aspectos mais complexos deve ter em mente sua capacidade única de adaptação.

 

2 ORIGENS DA PSICOLOGIA SOCIAL

 

A Psicologia Social é definida de várias formas e como expõe Guareschi (2012, p.25) “Seria fácil, até mesmo simplório, responder a essa pergunta dizendo que ‘são muitas psicologias sociais’.”. Entre tantas definições que estão disponíveis do que é a Psicologia Social, Lane (2006, p.7) afirma que se a Psicologia é a ciência que estuda o comportamento, por consequência, “a Psicologia Social deve estudar o comportamento social”, e com isso elenca um questionamento importante: “quando o comportamento se torna social? Ou então, são possíveis comportamentos não sociais nos seres humanos?” (LANE, 2006, p.7-8).

Sendo assim é fundamental ter em mente que "A Psicologia se preocupa fundamentalmente com os comportamentos que individualizam o ser humano, porém, ao mesmo tempo, procura leis gerais que, a partir das características da espécie, dentro de determinadas condições ambientais, prevêem (sic) os comportamentos decorrentes." (LANE, 2006, p.8).

E foca nos comportamentos individuais que sofrem influência direta ou indireta da sociedade, ou seja, os seres humanos se comportam de acordo com as influências sociais, culturais, econômicas e históricas, antes, durante e depois de seu nascimento. É acerca do grau de tais influências que a Psicologia Social se debruça.

De acordo com Garrido & Álvaro (2007), há diversas controvérsias quando se tenta recriar a história de uma determinada ciência, de maneira tal que nunca se está isento em seu reconto, tendo um viés de acordo com a visão de quem o faz, inclusive pelos autores que se escolhe. Destarte, afirma-se que “a Psicologia Social não é um ramo apenas da Psicologia, mas também é, em suas origens, uma área da Sociologia” (GARRIDO & ÁLVARO, 2007, p.14 – TRADUÇÃO NOSSA).

A visão desses autores faz com que uma das perguntas feita no início deste artigo seja respondida: A Psicologia Social é um ramo da Psicologia ou da Sociologia? Ou de ambas? Nesse diapasão, temos em alguns autores a afirmação de que a Psicologia Social é uma perspectiva de análise e intervenção social que se construiu da intersecção dos enfoques psicológicos como sociológicos (CRUZ, 2004; GARRIDO & ÁLVARO, 2007; VAN STRALEN, 2005).

Historicamente, o uso do termo Psicologia Social remonta ao final do século XIX e início do XX, apesar de seu reconhecimento como especialidade só aconteceu com os escritos do sociólogo Eduard Ross e do psicólogo William McDougall, no ano de 1908, quase quinze anos após as primeiras utilizações do termo “Psicologia Social”, em 1894 (CRUZ, 2004). Contudo, Cruz (2004, p.78) evidencia que há uma dificuldade em se construir uma Psicologia Social, principalmente pelos europeus, que tentam apartar a Psicologia Social das teorias dos Cientistas Sociais e, mais especificamente, dos Sociólogos.

Também é perceptível que a perspectiva sociológica da Psicologia Social é bastante sedimentar, enquanto a perspectiva psicológica se propaga de forma rápida, causando o predomínio da perspectiva psicológica da Psicologia Social em detrimento daquela. A partir dessa problemática, em grande medida o conceito de Psicologia Social ficou restrito “…ao intento por entender e explicar como o pensamento, sentimento e a conduta dos indivíduos são emanados pela presença atual, imaginada pela implicação de outros seres humanos” (ALLPORT, 1954 apud CRUZ, 2004, p.79).

"Atualmente, há bastante consenso de que a Psicologia Social como disciplina científica possui uma especificidade, não pelo seu objeto de estudo, mas antes de tudo por suas abordagens teóricas que articulam aspectos estruturas e aspectos subjetivos e integram explicações psicológicas e sociológicas. Como tal a Psicologia Social apresenta-se como um campo de interseção entre a Psicologia e a Sociologia, no qual encontramos teorias procedentes tanto da Psicologia como da Sociologia. Esta especificidade da Psicologia Social causa uma tensão interna à disciplina, entre o que se convencional chamar Psicologia Social psicológica e Psicologia Social sociológica" (VAN STRALEN, 2005, p.94).

Sendo que o campo da Psicologia Social é marcado por disputas concorrenciais quanto ao caráter metodológico, teórico e epistemológico, entre Psicologia e Sociologia. A história, em si, mostra que a Psicologia vem ganhando a disputa, fazendo com que, com o passar dos anos, a Psicologia Social tenha perdido quanto aos métodos e técnicas sociológicas de maior alcance, fazendo com que esta ciência se torne cada vez mais individualizada ou, no outro extremo, uma cópia psicológica dos estudos sociológicos.

Com tudo isso, a Psicologia Social que, em seu início teve grande contribuição do veio sociológico, viu a inversão gradual desse quadro, o que fez com que autores como Simmel, Goffman, Mead, Schutz, Elias, Giddens, Bauman, entre outros, tivessem suas contribuições tolhidas dos manuais de Psicologia Sociais (GARRIDO & ÁLVARO, 2007; GUARESCHI, 2012; VAN STRALEN, 2005). Garrido & Álvaro (2007) postulam que, provavelmente, o nome Psicologia Social, faça com que se entenda que tal ciência seja um ramo da Psicologia e não como uma interseção da Psicologia com a Sociologia.

Guareschi (2012) entende que a constituição do campo da Psicologia Social se deu pelo embate entre o materialismo cientificista – de caráter sociológico positivista – e o individualismo cartesiano – de caráter behaviorista (psicológico). Contudo esse autor entende, também, que se a Psicologia teve seu início com Wundt, a Psicologia Social também teria nele seu princípio. Esse entendimento parece um pouco patológico, pois parte do pressuposto de que a Psicologia Social se confunde, em sua gênese, com a Psicologia pura, ou simplesmente um prolongamento (nas palavras de Guareschi, 2012) desta. Oras, se caso esse pensamento deva ser seguido, Wundt “criou” sua psicologia experimental entre 1900 e 1920, quando, inclusive escreveu sua obra em 10 volumes intitulada Völkerpychologie, Durkheim, pai da Sociologia enquanto ciência e disciplina acadêmica, é tido como sociólogo, psicólogo social e filósofo, escreveu sua primeira obra em 1893, e descreve as “Regras do Método Sociológico” (1895), dois anos depois.

Assim sendo, o pensamento lógico de Guareschi (2012) poder-se-ia ser descartado, ao interpor Wundt como criador da Psicologia Social por ser ele o criador da Psicologia, pois em “Da Divisão do Trabalho Social” (DURKHEIM, 1999) é possível ver traços psicológicos, uma vez que para este sociólogo as relações sociais não implicam apenas trocas, e mesmo quando as implicam, as trocas são analisadas num viés mais profundo e sistemático. O conjunto de crenças e de sentimentos comuns à coletividade; essas são características que podem ser percebidas na média dos membros de uma determinada sociedade culminando num sistema que tem vida própria e que Durkheim denominou de “Consciência Coletiva” (QUINTANEIRO, 2003).

Ainda nessa perspectiva, Lane (2006, p.75) coloca que, "Augusto Comte, considerado por muitos o fundador da Psicologia Social, escreveu longas obras sobre a natureza das ciências (1830-1834), nas quais o psíquico seria o objeto de estudo da Biologia, da Sociologia e da Moral, todas ciências abstratas, que forneceriam os subsídios para as ciências concretas, e entre elas estaria a Psicologia Social, como subproduto da Sociologia e da Moral; para ele, seria a ciência que poderia responder a uma questão fundamental: “Como pode o indivíduo ser, ao mesmo tempo, causa e conseqüência (sic) da sociedade?"

Assim, ela expõe que a Psicologia Social só produziria, de fato, ciência após a Primeira Guerra Mundial, bem como as demais Ciências Sociais que se estabeleceriam como ciências modernas após tal fato. Sendo que nos Estados Unidos, a Psicologia Social atinge o devido status de ciência, com rigorosos métodos, técnicas pragmáticas e delimitação de todo o arcabouço necessário para a inserção da Psicologia Social no hall das ciências experimentais (CRUZ, 2004; GARRIDO & ÁLVARO, 2007; GUARESCHI, 2007; LANE, 2006).

Nas duas décadas seguintes (50 e 60) a Psicologia Social aparentava ser a ciência capaz de responder a todos os problemas sociais, porém o método de acumular informações e dados e, posteriormente, inferir teorias não se mostrou satisfatório, fazendo com que começasse a crise da Psicologia Social, no final da década de 1960 (LANE, 2006). Ainda retrata que "A crise da Psicologia social é denunciada no Congresso de Psicologia Interamericana, realizado em 1976 em Miami, com a participação de psicólogos sociais de vários países da América Latina, aos quais esboçavam algumas críticas metodológicas e teóricas, porém sem contribuírem com qualquer proposta concreta para a superação dos impasses." (LANE, 2006, p.78).

Ainda em crise e sem muitas alternativas, a Psicologia Social se vê rejeitada até por sua “mãe”, a Psicologia. Os psicólogos sociais são postos de lado pelos próprios pares, que entendem que Psicologia Social é para quem quer ser acadêmico e se interessa por pesquisas sociais (LANE, 2006). Contudo, Lane (2006, p. 82-3) denuncia que, "Evidentemente, o confinamento do psicólogo social, assim como do sociólogo e do antropólogo, às instituições acadêmicas, tem um sentido político. Impedida de concretizar seus ideais, tendo a voz e a ação sistematicamente abafadas, a maioria desses cientistas tem se dedicado a inúteis jogos de palavras que ressoam em um espaço muito restrito. Neste pequeno círculo vigora o culto aos debates que, nem sempre relevantes, cumprem a função de autolegitimar o grupo e permitir-lhe eleger, periodicamente, novos líderes."

Importante indicar que alguns autores da linha da Escola de Chicago, afirmam que a Psicologia Social nasceu nessa escola no início do século XX, tendo a cidade como laboratório e discutiram-se pesquisas aplicadas em situações naturais da vida cotidiana, sendo denominada de Sociologia Clínica (MACHADO, 2010).

A Psicologia Social é um campo bastante controverso desde a sua gênese, sendo quase impossível um consenso de quem foi, de fato, seu fundador, de como esse campo se constitui, até mesmo qual o seu objeto. Mais importante que buscar uma unanimidade na identificação de sua partenogênese, faz-se imprescindível compreender que para a concretização de um projeto de Psicossociologia profícua e que contribua na compreensão da sociedade, o primeiro passo é entender que não deve haver uma Psicologia Social psicológica e outra Psicologia Social sociológica, mas uma constante retroalimentação de ambas as fontes. Também que a Psicologia Social é um campo de interseção entre Sociologia e Psicologia.

 

2 SITUAÇÃO ATUAL DA PSICOLOGIA SOCIAL

 

A Psicologia Social é, pois, um âmbito de eterno devir entre Sociologia e Psicologia. Como elucidou Farr (1996) a Psicologia Social psicológica tem como objeto de pesquisa a redução do coletivo ao indivíduo, ou seja, essa posição de Psicologia Social reduz o coletivo às leis individuais, por outro lado, a Psicologia Social sociológica tende a ressaltar a interação entre o indivíduo e o social, ou seja, na existência de uma retroalimentação entre coletivo e indivíduo, indo além desta dicotomia.

Busca-se aqui, não um tratado epistemológico e histórico da Psicologia Social, mas sim um breve esboço dessa ciência. Os motivos podem ser vários, mas, para além do espaço para se expor as ideias aqui elencadas, o principal motivo é o fato de a Psicologia Social ser uma ciência vasta que se propõe a unir duas ciências humanas distintas que têm objetos de pesquisa diversos e, para além, unir métodos e metodologias.

O objeto da Psicologia, como exposto no início deste artigo, conforme Lane (2006), é o comportamento humano e suas peculiaridades, suas nuances, seus desejos e suas vontades; e o objeto da Sociologia é "…o comportamento humano em grupos, ou da interação entre seres humanos. Procura compreender a natureza e o propósito da associação humana; a maneira como surgem, se desenvolvem e mudam vários tipos de associações, e as crenças e práticas que os caracterizam." (KOENIG, 1976, p.11).

Destarte, a Psicologia Social, por pura inferência, a ciência que busca compreender o comportamento humano em sociedade, mas sem desprezar suas características individuais, seus anseios, seus desejos. É a ciência que tem, por objeto o ser humano de forma plena, como sujeito e objeto de sua própria história, capaz de mudar de ideia e de transformar suas ações de acordo com as necessidades do coletivo ou influenciar o coletivo a partir de suas vontades e desejos individuais.

Freud (2011, p.14) expõe que  "A oposição entre psicologia individual e psicologia social […], que à primeira vista pode parecer muito significativa, perde boa parte de sua agudeza se a examinamos mais detidamente. É certo que a psicologia individual se dirige ao ser humano particular, investigando os caminhos pelos quais ele busca obter a satisfação de seus impulsos instintuais, mas ela raramente, apenas em condições excepcionais, pode abstrair relações deste ser particular com os outros indivíduos."

Assim, até mesmo com o pai da Psicanálise vê-se a tentativa de superar a dicotomia entre individual e coletivo, visto que o entendimento entre essas duas possibilidades de compreensão do ser humano devem ser aliadas para a superação de visões que se pensam excludentes, mas se completam. As perspectivas sociológica e psicológica devem ser utilizadas comumente, possibilitando a existência de uma Psicologia Social plena, que não vibre nas ondas ora da Psicologia ora da Sociologia. A Psicologia Social é uma ciência integradora entre os saberes sociológicos e psicológicos.

Os métodos de pesquisa que privilegiam a Psicologia Social são, em especial, a Pesquisa-Ação e a Pesquisa Participante, salientando que essas duas modalidades são diferentes e têm suas peculiaridades. Thiollent (1985) reitera que a pesquisa-ação é uma modalidade de pesquisa participante, contudo nem toda pesquisa participante tem os requisitos básicos para ser classificado como pesquisa-ação, uma vez que este método é focado na interação entre pesquisador e pesquisados, propondo mecanismos de transformação da realidade, do pensamento e do modo de agir dos envolvidos, enquanto naquela, o pesquisador participa das atividades rotineiras dos pesquisados, mas não aponta caminhos ou outros pontos de vista, apenas observa.

 

2.1 Psicologia Social no Brasil

 

Conforme Machado (2010), ao focar na Sociologia Psicológica no Brasil, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) se destaca por, em 1968, Max Pagès realiza seminários de dinâmica de grupo na cidade de Belo Horizonte. Nessa época o termo “psicossociologia” acabava de ser cunhado por Pagès. Apesar de esse pensador criticar fortemente a psicanálise, no Brasil, a Psicossociologia fica restrita ao vocabulário psicanalítico e ao estruturalismo.

Quatro anos depois, em 1972, George Lapassade traz consigo a observação etnográfica e pesquisa-ação, com viés político-pedagógico de intervenção, de cunho mais social, mas ainda muito focado na contribuição psicanalítica de transferência e contratransferência e auto0gestão de grupos, organizações e comunidades (MACHADO, 2010). Dessa forma, em 1974 a UFMG cria a disciplina Intervenção Psicossociológica, sendo que outros cursos de Psicologia de Belo Horizonte também adotam a disciplina em seus currículos.

Ainda conforme Machado (2010), um convênio entre Capes e Cofecub envolvendo as Universidades Federais de Minas Gerais, Fluminense e de São João Del-Rei e as Universidades francesas Paris XIII, VII e X, sob o título de “Formação de Recursos Humanos para Intervenção em Comunidades” (entre 1985 e 1992) e “Cooperativas e Comunidades” (entre 1992 e 1995), objetivando levantamento de dados e análises comparativas de diferentes intervenções e criação de novos instrumentos avaliativos, definindo, a partir dessas observações, novas metodologias de intervenção.

"O convênio promoveu, no Brasil, missões de André Lévy (out.1991), Eugène Enriquez (abr. 1992, 1993), Jean Dubost (nov. 1993), André Nicolaï (nov.1994) e Jacqueline Barus-Michel (1995), com a contraparte brasileira de missões na França de Marília N. M. Machado (jun.1991), Lívia Nascimento (out.1992), José N. G. Araújo (jun.1993), Teresa Carreteiro (set.1993), Elizabete Antunes Lima (dez.1994). Paralelamente, universidades francesas receberam professores do Brasil para doutorado. As experiências francesas e brasileiras foram compartilhadas, livros e artigos trocados, escritos e publicados, individualmente e em conjunto" (MACHADO, 2010, p. 178).

Culminando na realização de três Colóquios Internacionais de Psicossociologia e Sociologia Clínica em Belo Horizonte, nos anos de 2005, 2006 e 2009, evidenciando o vigor, ainda vívido, deste vínculo. Deste modo, a intervenção psicossociológica mostra-se eficiente quando o agente principal, através do ato reflexivo e deliberado, instigado pelo questionamento, solução de conflitos, criando autonomamente novas formas coletivas e lúcidas de pensar, agir e na autoalteração de sua realidade social (MACHADO, 2010, p.179).

O que se pode perceber é que ao contrário da pesquisa tradicional que explica como as coisas são e/ou funcionam, a intervenção psicossociológica operam na realidade concreta da vida, num sistema aberto a uma “multiplicidade indefinida de interações” (STENGERS, 1983, p.49 apud MACHADO, 2010, p. 179). Não podendo, ainda, ser pensada que a intervenção psicossociológica é uma situação cotidiana, mas uma situação artificalizada pela intervenção do psicossociólogo junto ao objeto de análise, inclusive pelo fato da contratransferência e resistências do pesquisador também fazerem parte da pesquisa e se encontrarem como pertencentes ao objeto de pesquisa.

Visto que a Psicologia Social, assim como a Sociologia e a Psicologia, é uma ciência moderna que se adequa às diferentes realidades sociais que são desenhadas por todos os indivíduos que, como expressado anteriormente, é social e cria diversas relações sociais cotidianamente.

Neste diapasão, Guareschi (2012) aponta quatro temáticas contemporâneas para direcionar pesquisas psicossociais e vislumbrar novas possibilidades dentro dessa ciência que volta, no século XXI, a ganhar força e fôlego. Para ele (GUARESCHI, 2012), merecem destaque as pesquisas psicossociais na sociedade e na cultura midiada, mostrando como os sujeitos lidam com a subjetividade nesses ambientes; também o resgate no ser humano, objetivando o estudo da psique diante das ciências neurológicas, genéticas e biológicas; nas questões relacionadas à pesquisa e metodologias; e, por fim, nas questões referentes à ideologia e ética, ou seja, nos valores quando se tratando de intervenções psicossociais e nas ações sociais no dia a dia. Contudo, a perspectiva de Guareschi, como já mostrado no início deste artigo, é de uma Psicologia Social de viés psicológico, focando suas perspectivas futuras para as pesquisas em Psicologia Social no indivíduo, esquecendo, como de fato essa perspectiva sempre fez, a superação da dicotomia coletivo/indivíduo.

Se tratando de uma Psicologia Social que supere a disputa entre Psicologia e Sociologia, temas que repensem a constituição epistemológica da ciência, assim como busque novos métodos que sejam exclusivamente seus, além de delimitar melhor seu objeto de pesquisa. Não obstante, questões epistemológicas e ontológicas, assim como a história da Psicologia Social e, em certe medida, uma Sociologia da Psicologia Social, seriam temas interessantes para que o campo científico da Psicologia Social seja melhor delimitado.

Temas de interação social frente às novas tecnologias não podem deixar de existir. Na sociedade em rede bem explanada por Manuel Castells (2006), a tecnologia e o conhecimento estão, na contemporaneidade, mais imbricados com as perspectivas de hiper-especialização, fragmentação de identidades e de instantaneidade das informações. Ou seja, compreender as relações sociais que transcendem as noções de tempo/espaço, e que quebra com a necessidade da presença para a manutenção de relações sociais passíveis à análise psicossociológica.

Talvez esse seja o grande lócus da investigação psicossocial, a sociedade em rede, a sociedade digital, as redes sociais, a reclusão aos meios tecnológicos e o abandono de ambientes de relacionamento, ou, em outras palavras, a utilização de tecnologia e meio tecnológicos para manter os relacionamentos que, outrora, eram realizados, unicamente, face a face.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Visto o problema a que se propôs este artigo e os questionamentos elucidados em seu início, notou-se que a própria gênese da Psicologia Social é confusa, nebulosa e complexa. Não há como se definir onde e quando a Psicologia Social nasceu, visto que a afirmação de que sua gênese se deu ou com a Sociologia ou com a Psicologia parece bastante rasteira e pouco convincente, já que seu entendimento nasceu de forma espontâneo tanto por psicólogos que buscaram compreender as relações sociais dos indivíduos, como por sociólogos que se interessaram por compreender as motivações e a subjetividade dos indivíduos que compõem a sociedade.

Sendo uma ciência híbrida entre a Psicologia e Sociologia, a Psicologia Social contribuiu e ainda contribui, podendo ampliar, sobremaneira, o entendimento do ser humano frente ao “outro” e como suas ações são influenciadas e influenciam a coletividade. É um processo de retroalimentação entre ação e estrutura, entre indivíduo e sociedade, assim como uma visão que esteja para além da dicotomia apresentada, como também para além da dicotomia Psicologia Social sociológica e psicológica, mas uma Psicologia Social integrada e integradora.

Os métodos utilizados para a intervenção psicossociológica são, em sua totalidade, métodos qualitativos, descritivos e etnográficos, ou seja, há uma preponderância para a utilização do método de pesquisa participante, como também da pesquisa-ação, visto o viés político-pedagógico da intervenção psicossocial.

De todo, os temas atuais em Psicologia Social parecem serem fragmentados, mais voltados para a perspectiva psicológica, até mesmo pela nomenclatura utilizada, fazendo com que se creia que a Psicologia Social é um ramo da Psicologia e não um campo de intersecção entre Psicologia e Sociologia.

A falência da Psicologia Social talvez se deva pelo fato de sua psicologização, em detrimento das contribuições sociológicas, fazendo com que o social, o coletivo, fosse cada vez mais perdido em meio ao indivíduo como objetivo. Na sociedade em rede, da individualização compreender apenas o indivíduo parece tomar lugar comum, e a perspectiva sociológica talvez seja uma saída para o soerguimento da Psicologia Social como ciência capaz de explicar o ser humano de forma integral e completa.

As indagações sempre ficam. Desvendar e desbravar o campo da Psicologia Social é uma tarefa que tanto psicólogos como sociólogos devam se aventurar. Explicar por explicar não resulta em nada, além do discurso vazio repetido nas academias, porém a pesquisa que tem preocupação com a sociedade e com sua transformação é, deveras, importante para a concretização de um projeto de humanidade que seja capaz de se compreender e, posteriormente, compreender o outro. A Psicologia Social me parece uma saída bastante plausível para o alcance de tal intento.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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