O poder da mão da mulher
Por: Roger T.
23 de Abril de 2023

O poder da mão da mulher

Como o hiragana começou...

Japonês Cultura Escrita Hiragana

A vida da mulher durante a história da humanidade não foi nunca fácil, sendo sempre banida de muitos benefícios que só os homens podiam usufruir.

A leitura e escritura foi uma de essas coisas. Em vários lugares ao redor do mundo, as mulheres tinham sido proibidas de aprender a ler e escrever.

Num pequeno conjunto de ilhas isoladas, locadas ao leste do Oceano Pacífico, também acontecia quase o mesmo; no Japão, de certa forma, as mulheres não tinham direito a ser completamente literatas. Mas foi justamente esta situação imerecida que causou uma revolução no idioma Nipon, que, ao dia de hoje, mantém o legado de mulheres ancestrais que deram forma à literatura e a toda uma linguagem de um país inteiro.

Isto aconteceu durante o período Heian, faz um milênio atrás. As mulheres da corte imperial, assim como os homens, tinham direito à mesma educação, só que a diferença recaía que elas estavam betadas de aprender os kanjis; escrita sinográfica trazida da China, que contém um conceito inteiro dentro de uma letra só.

O motivo desta diferença na educação era que, segundo os japoneses da época, o sistema de escrita chinesa era muito complexo para as mulheres.

Mas o que a gente aprendeu durante a história é que mulher sempre dá um jeito, não é? Pois bem, foi criado então um sistema simplificado, mais curvado e estilizado, que, ao em vez de expressar ideias inteiras em uma letra só, representava um som em específico (igualzinho ao nosso alfabeto, que representa sons em lugar de ideias). O silabário hiragana foi criado e ninguém sabia da importância que isso teria no futuro de uma nação inteira.

Não existem evidências que comprovem quem foi a pessoa responsável pela criação deste silabário, derivado dos kanjis, mas uma coisa é certa, foi neste exato momento que a literatura japonesa teve seu auge, e deu lugar a obras clássicas da literatura Nipon.

Este sistema de escrita era conhecido na época como Onnade (女手) ou “mão da mulher”, enquanto os kanjis eram chamados de Otokode (男手) ou “mão do homem”. “Eles” não podiam usar o Onnade por ser considerado na época como pouco refinado.

As mulheres da corte imperial usavam o Onnade para fazer as suas anotações, diários, cartas e documentos, mas foi um homem quem, ocultando sua identidade, concebeu a primeira obra escrita com este silabário, titulada “O Diário de Tosa”. Foi descoberto que o nome do autor é Ki no Tsurayuki, e, para manter o anonimato autoral, na hora de produzir esta narração, se fez passar por uma mulher que tinha perdido o seu filho.

Posteriormente a isto surgiram dois grandes obras literárias: Genji Monogatari (A história de Genji), de Murasaki Shikibu e Makura no Shôbi (O livro do travesseiro), de Sei Shônagon. O Genji é considerado como a primeira novela moderna e narra as aventuras amorosas do príncipe com o mesmo nome do livro. O Makura trata-se dum diário privado da própria autora. Mil anos depois, ambos livros seguem impressionando pela frescura e por serem uma janela direta à vida da capital japonesa durante o período Heian, que, naquele tempo, tinha o mesmo nome deste período histórico.

Lembra que os homens não podiam utilizar este sistema de escrita por ser pouco refinado? Bem, as provas nos dizem que isso ficou bem no campo da teoria porque no jogo do amor, homens e mulheres da corte faziam intercâmbio de cartas bem quentes, com poesias contendo muita paixão, que logo após iriam virar encontros amorosos que fariam que o fluxo de idas e voltas de cartas continuasse; tudo isto usando o Onnade ou, como se chama agora, Hiragana. A chamada “carta do dia seguinte” era uma coisa muito importante neste ritual de paixão desenfreada por correspondência, e era sempre esperado pela mulher após os encontros segredos na calada da noite.

Graças a mão da mulher, muitos estilos de poesias e narrações foram criados ao longo da história deste conjunto de ilhas, no Pacífico, e deu forma à linguagem e a cultura milenar do país do sol nascente, mantida firmemente até nossos dias.

A mão da mulher, com certeza, é poderosa...

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