Resenha do romance “Mayombe”, de Pepetela
Por: Bruno F.
11 de Dezembro de 2018

Resenha do romance “Mayombe”, de Pepetela

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Resenha do romance “Mayombe”, de Pepetela

 

Este livro é de autoria de Pepetela, pseudônimo para Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, escritor de nacionalidade angolana, nascido na região de Benguela em 1941. Em fins dos anos de 1950, Pepetela mudou-se para Lisboa para estudar engenharia no Instituto Superior Técnico, onde após um ano migrou para o curso de Letras, que também foi descontinuado em 1963 para o ingresso na militância do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola) e sua obra literária reflete a história contemporânea de Angola, tendo sido reconhecida internacionalmente, sendo inclusive ganhador em 1997 do Prêmio Camões.

O MPLA é o partido político que domina Angola desde 1975, sua origem está nos princípios da década de 1960, em Conacry, quando lançou os fundamentos da sua organização e começou a preparar-se para a luta de libertação nacional, tendo um papel fundamental no processo de independência do país, juntamente com a Frente pela Libertação de Angola (FNLA) e a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), além de outros grupos menores. Há de se considerar que é justamente esse enclave de movimentos políticos e grupos armados que vão proporcionar ao país décadas de guerra civíl após a independência e atualmente ainda é muito contestado entre a população, colocando-se em dúvida, inclusive a legitimidade dos processos eleitorais, por meio dos quais, José Eduardo dos Santos governou desde 1979 até 2018, sendo sucedido por João Lourenço, também membro do alto bureau do MPLA.

Além das divergências externas ao MPLA, soma-se as internas, que são presentes desde a sua fundação e que em determinados momentos, como o 27 de maio de 1977 que ficou famoso pela reação do governo ao suposto movimento fraccionista, vão provocar eventos com dimensões desproporcionais. Tais discordâncias internas ao movimento abordadas, ainda que de maneira sutil se comparada aos problemas reais, em sua história, através de conflitos entre os personagens do enredo. É interessante apontar que o livro foi escrito entre 1970 e 1971, apesar de ser publicado só em 1980, porém as divergências internas remontam desde a sua fundação e estará presente nas mais diversas instâncias do movimento, desde o topo do bureau político até o cotidiano dos guerrilheiros, conforme apresentado em algumas relações e problemas vividos pelos personagens do livro.

Ainda quanto às discordâncias ideológicas, o próprio Pepetela será personagem na vida real de um dos momentos mais atrozes na história do país, o já mencionado 27 de maio de 1977. Essa participação (acusado de envolvimento com as prisões, sequestros e torturas), tem sua natureza questionada na publicação da “Carta aberta a Pepetela”, de Carlos Pacheco, publicada originalmente no jornal “Público” [Lisboa]. Apesar de a trajetória política e pessoal de Pepetela não ser o foco deste trabalho, é interessante que se tenha em mente que o envolvimento com os personagens na guerra de libertação contra os portugueses (movimento em que Pepetela participou diretamente como guerrilheiro do MPLA, inclusive na região cenário do livro), ele também é participante das outras versões não tão heróicas do movimento.

A história se passa cronologicamente alguns anos que antecedem a independência em relação a Portugal e tem como cenário a floresta do Mayombe, que fica em um enclave entre o Congo, a República Democrática do Congo e o norte de Angola, mais especificamente em Cabinda, cuja maioria da população pertence ao grupo Fiote, do povo Bantu, cuja língua é o Ibinda, um dos dialetos do Kikongo. Curiosamente, Cabinda pertence politicamente à Angola mas é uma região de instabilidade política dado o ideário separatista que domina a região e tem uma expressão mais vivaz através da Frente para a Libertação do Enclave de Cabinda - Forças Armadas de Cabinda (FLEC-FAC) que até hoje reivindicam a independência da região e tendo entre as suas alegações para o julgo de Angola a ambição desta pelo petróleo da região.

Região de clima quente, com predominância de floresta densa e homogênea, típica de clima equatorial úmido. Esta floresta e suas características próprias vão ganhando tal relevância no discurso do autor que conforme vai se esboçando com as palavras dos personagens, tal como o comandante Sem Medo, este próprio aspecto fisiográfico torna-se um importante personagem do enredo, tendo papel definidor sobre diversas circunstâncias e outros personagens do enredo, podendo até essa floresta ser considerada o personagem principal dessa história.

Essa possível dúvida quanto ao personagem principal coloca-se pelo estilo de escrita apresentado pelo autor, onde a cada momento o foco narrativo é alterado, porém sendo, além da própria floresta do Mayombe, o comandante “Sem Medo” que possuem recorrentes aparições na história de Pepetela.

Aproveitando já a menção de um dos principais personagens que nos é apresentado pelo seu pseudônimo, ou nome de guerra, esta era uma prática comum aos membros do MPLA e cuja nomeação normalmente era inspirada em alguma característica pessoal, após um certo tempo de iniciação e serem observados por seus camaradas. Os outros personagens também vão ser apresentados desta maneira, tal como o “Comissário, “Das Operações, “Lutamos”, “Teoria” e outros.

Em alguns momentos da escrita, acredito que a narrativa se aproximaria de uma novela, dada a pluralidade dramática, com vários enredos entrelaçados, pela sucessividade do enredo, pelo tempo sequencial dos eventos e tendo em vista a facilidade com que o autor consegue prender a atenção do leitor na sequência de eventos e nas tramas pessoais dos personagens e no andamento da guerrilha, sem recorrer à narrativas recheadas de emoção da guerra que é mais uma espécie de pano de fundo. Esta mostrar-se-á principalmente através de dois momentos mais decisivos ao longo da história, num primeiro momento, que na verdade é um equívoco estratégico percebido antes de uma tragédia maior, pois eram seus próprios co-partidários que estavam dentro do acampamento que o comandante Sem Medo e outros voluntários pensavam estar retomando e um momento  no  final do livro, onde é narrado um enfrentamento entre os guerrilheiros do MPLA e os tugas[1].

O primeiro capítulo chama-se “A Missão” e vai mostrar um grupo de guerrilheiros do MPLA em marcha pelo Mayombe. O objetivo desta missão é encontrar alguns habitantes locais e colonos portugueses, mas principalmente armar emboscadas contra o exército português. Logo no início é apresentada a discussão se o guerrilheiro Teoria deveria ou não continuar na missão após machucar o joelho na incursão. O Teoria é um mestiço em meio a maioria de negros e então temos uma situação em que ele vivia tentando provar para os outros e para si mesmo que ele também era capaz de fazer qualquer coisa.. Essa discussão também é levantada em outro momento do livro durante uma conversa sua com o comandante Sem Medo.

Arrisco dizer que essa discussão faz alusão à situações incômodas que alguns guerrilheiros mulatos, de fato vivenciaram no interior do MPLA. Em um mundo de sim ou não, o Teoria representava o talvez.

Após alguns debates o comando composto pelo Comandante Sem Medo, pelo Comissário Político e pelo Chefe de Operações, e a pedido do próprio Teoria, é decidido que este continue na missão.

O grupo segue então pela selva até ouvir o barulho de uma motosserra, todos param, menos o Lutamos, que segue distraído. Muitos vão achar, instigados por essa situação e pela questão tribal, que o Lutamos é um traidor, que seguia para tentar avisar os trabalhadores que o grupo do MPLA estava chegando.

Essa questão suscita a discussão sobre tribalismo, já que o Lutamos pertence à mesma etnia que esses trabalhadores. Em outros momentos do livro, por situações com outros personagens, essa discussão será levantada novamente, evidenciando uma peculiaridade de Angola e como algo que seria inclusive um impedimento para o avanço do ideário revolucionário embandeirado pelo MPLA sobre uma Angola unida. Entre os diversos grupos presentes em Angola, merece destaque os Kimbundo, Kikongo, Lunda, Xindonga, Ovimbundo, entre outros.

A decisão do comando é pela captura para conscientização desses trabalhadores e armar uma emboscada para os portugueses.

A missão é bem sucedida e os trabalhadores são retidos. O objetivo junto aos trabalhadores é mais uma conscientização política, com o intuito de angariarem novos simpatizantes, já que o MPLA luta pelo povo de Angola. O Comissário irá aplicar o seu discurso sobre os trabalhadores, alegando que todos deveriam trabalhar pelo povo de Angola e não para enriquecer os portugueses. Após caminhar por algum tempo com os trabalhadores, sem amarrá-los ou usar de força contra eles, sendo que nenhum deles tentara fugir, vai ocorrer a “libertação”. Os guerrilheiros vão devolver todos os pertences dos trabalhadores, porém fica faltando uma nota de cem escudos que estava no bolso do guerrilheiro Ekui-kui e que pertencia ao Mecânico dos trabalhadores.

Essa nota teria sido roubada durante a noite por algum dos guerrilheiros e foi muito mal vista pelo Comando, pois poderia prejudicar a imagem do MPLA que eles tentavam inculcar nos Trabalhadores de Cabinda.

Após uma breve investigação entre os guerrilheiros, descobrem que o autor do roubo havia sido o Ingratidão do Tuga. Este tem suas armas retiradas e seria julgado quando eles retornassem à base.

Nessa altura da narrativa começam a aparecer algumas discordâncias internas (entre os motivos do tribalismo) e aparece então a narrativa do Milagre, que sente-se injustiçado na vida e como se já tivesse sofrido mais que os seus camaradas, inclusive o Comandante Sem Medo, sendo motivo para duvidar de sua autoridade. Milagre conta a história da morte de seu pai, por parte dos portugueses. Infelizmente é de uma forma que está presente em outros relatos de guerra e textos literários sobre as carnificinas e extermínios promovidas pelos portugueses durante a guerra de independência, tal relato aparece inclusive, no “Estação das Chuvas” de Eduardo Agualusa, onde os angolanos são enterrados apenas com as cabeças para fora da terra, tendo-as separadas de seus corpos pela pá de um trator que passa raspando o terreno junto ao chão.

Na sequência da narrativa há um combate do grupo de aproximadamente vinte guerrilheiros contra cerca de setenta militares do exército português. Esse combate não termina em aniquilação, mas promove muitas baixas entre os portugueses pelo bom planejamento do Comando dos guerrilheiros.

Após a retirada dos guerrilheiros, percebem a falta do Muatiânvua, sendo que retornam para procurá-lo o Ekui-kui, o Lutamos e, após esses dois saírem para procurar pelo camarada, o Comandante Sem Medo chama a atenção de seus comandados por ninguém mais se oferecer para buscá-lo pelo Muatiânvua ser destribalizado. O Comandante Sem Medo discursa que o tribalismo não podia continuar acontecendo dentro do grupo.

Muatiânvua conta que havia ficado para trás para contar quantos portugueses haviam caído na batalha, contabilizando quase duas dezenas de baixas no exército português, o ataque fora então um sucesso.

Após uma conversa entre o Comando, levantada pelo Comissário, fica decidido que um grupo ficaria encarregado de levar o dinheiro recuperado para o Mecânico e outro grupo retornaria para a base de operações. Após o encontro com o trabalhador na aldeia, este não aceita o dinheiro de volta e oferece em apoio ao MPLA.

Com o retorno dos guerrilheiros à base, vai ocorrer o julgamento do Ingratidão do Tuga, pelo roubo dos cem escudos do trabalhador, que estavam no bolso de Ekui-kui, durante a noite. O Comissário acha que o Ingratidão do Tuga deve ser fuzilado, o Chefe de Operações acha que essa seria uma pena muito grave e que esta poderia causar um motim entre os combatentes. Fica decidido pela prisão após o Comandante Sem Medo ouvir a opinião de todos, mesmo tendo voz de decisão final, atitude que vai se mostrar marca de sua personalidade.

O capítulo termina com uma narração do Milagre achando que a pena foi muito rigorosa e questionando a decisão do comandante Sem Medo, sem saber que ele na verdade aliviou a pena do Ingratidão do Tuga.

No capítulo dois, tendo como título “A Base”, é onde a narrativa constrói a base dos guerrilheiros em meio à floresta do Mayombe, bem como as relações pessoais entre os guerrilheiros, além de nos apresentar uma descrição mais aprofundada das características da floresta e através de sua construção colocá-la não só como um dos personagens principais do enredo, mas como personagem delimitador de vida e morte para os guerrilheiros, sendo palco de batalhas e esconderijo, sendo motivo de isolamento e fonte de alimento para o corpo e para a mente, esse era o “deus Mayombe”.

No decorrer do envolvimento da narrativa com a base dos guerrilheiros e apresentando-se a falta de recursos para a manutenção da alimentação deles, é acrescentada à preocupação o incremento da tropa com dezessete novos guerrilheiros, jovens, que se apresenta enquanto mais um motivo de preocupação, também pela inexperiência deles para a guerrilha.

Entre os novos integrantes vai aparecer um que se destaca na narrativa, que receberá o nome de guerra de Vewê[2] que é “primo[3]” do Comandante Sem Medo, onde este  deixa claro que não haverá tratamento diferenciado dado o parentesco.

O Comando se reúne para discutir o fato de receber novos integrantes para o grupo e não novos mantimentos, que já estavam em falta. Assim alguém precisaria ir até Dolisié[4] para encontrar com o camarada André, que era o responsável pela base de operações do MPLA naquela região. Fica decidido que o Comissário seria o enviado, tendo em vista que há tempos ele não tirava uma folga e possuía pendências pessoais (com sua noiva, Ondina) para resolver. Seguiria junto nessa empreitada o Ingratidão do Tuga, para ser encaminhado à prisão e mais um guerrilheiro.

A relação do Comissário com sua noiva irá ganhar destaque na narração conforme ela, Ondina, se torna um elemento chave para alguns momentos da história. Ondina era professora em Dolisié e também membro MPLA.  Além de o Comissário passar meses longe de sua noiva, em missões, a relação entre os dois nunca se estabeleceu de fato, havendo um problema de harmonia entre os dois, inclusive sexual, que ambos pareciam disfarçar e procuravam no tempo a resposta e a solução para seus problemas conjugais.

Quando o Comissário finalmente consegue se encontrar com o André para solicitar recursos para a base dos guerrilheiros no Mayombe, é informado da falta de recursos financeiros, mas que, enquanto aguardava a procura de uma solução pelo André, este deu uma nota de quinhentos francos para que o Comissário “tomasse uma cerveja” com a Ondina.

Ou seja, a partir desse momento, ainda mais com a convicção de disciplina e corretude do Comissário, fica claro que o André estaria desvirtuando os ideais do movimento.

Entre idas e vindas, encontros e desencontros, e muitos desacertos, tanto com Ondina quanto com André, o Comissário guiado por seu senso de responsabilidade retorna para a base mesmo com poucos recursos.

O Comissário perturbado pela sua relação conturbada com a Ondina pede conselhos para Sem Medo e em meio aos diálogos dos personagens fica claro a relação paternal que havia do Comandante Sem Medo com o Comissário.

Outros guerrilheiros são enviados em breve, pela falta de mantimentos, para levantar recursos junto à base de operações em Dolisié, já que o André não havia cumprido a promessa de enviar alimentos para a base, tornando a viagem do Comissário praticamente inútil.

Há um desentendimento público entre o Comissário e o Sem Medo após uma confusão deste com o Vewê, o que passa a ser motivo para a formação de grupos segundo opiniões diferentes sobre quem deveria assumir o comando da base, sendo na verdade, discussões motivadas novamente por questões tribalistas e de parentesco.

O segundo capítulo termina com uma exposição do Muatiânvua sobre sua crença de que essas discussões baseadas em questão tribalista são sem sentido e que para ele todos são angolanos, todos são africanos.

O terceiro capítulo possui o nome da noiva do Comissário, “Ondina”. Se passa após a comida na base já ter acabado e as comunas[5] próximas à base já apresentarem sinais de esgotamento, enquanto todos aguardam o regresso do “Chefe de Operações” com os mantimentos para todo o acampamento.

Quando ele retorna, além dos alimentos, ele relata a dificuldade de se encontrar o André, porque esse fora flagrado no “capim” com a Ondina, que além de ser noiva do Comissário, um membro do partido, suscitava outras questões, como um possível conflito entre tribos, dado que o André era Kikongo e o Comissário do grupo dos Kimbundos. Diante dessa situação, todos aguardavam a chegada de um dirigente do MPLA e segundo o Chefe de Operações o Comissário deveria ficar logo sabendo, visto que todos já sabiam, além de a Ondina ter lhe enviado uma carta.

Em sua carta Ondina confessa a traição e afirma que irá retirar-se de Dolisié, causando grande transtorno ao Comissário, que quer ir atrás dela no mesmo instante, nem tanto pelo André, pois ele acredita que isso seria responsabilidade do partido, mas sim por querer encontrar com a Ondina para esclarecimentos pessoalmente.

Na tentativa de Sem Medo em convencer o Comissário a deixar a incursão para Dolisié para o dia seguinte, ele conta um pouco de sua história antes da guerra de independência e de sua entrada no MPLA.

Ambos partem no dia seguinte para Dolisié. Sem Medo encontra então com o André e um dirigente do MPLA, que o coloca como sucessor temporário das atribuições do André enquanto este seria levado para o bureau para julgamento. Sem Medo aceita a atribuição, com a condição de ser em caráter temporário, enquanto ele indica dois dos seus comandados como possíveis sucessores para o André, o Teoria e o Mundo Novo, sendo este último que seria escolhido pelo bureau como o substituto.

Enquanto isso o Comissário em seu encontro com Ondina, procura por detalhes da relação que ela teve com o André e procura meios de reatar com ela terminando a discussão em uma relação sexual violenta que finalmente vai proporcionar o prazer que os dois ainda não tinham experimentado juntos.

André segue em sua viagem para longe de Dolisié acreditando que tudo fora uma armação de Ondina, Comissário e Sem Medo, para tirá-lo da direção e que, durante o seu julgamento no bureau, um discurso de auto-crítica poderia garantir-lhe uma absolvição.

Sem Medo tem como primeiro problema para resolver durante sua função como chefe em Dolisié a fuga de Ingratidão do Tuga, mostrando-se muito firme na busca da verdade e no cumprimento da lei segundo os princípios do partido.

O Comissário insatisfeito com a decisão de Ondina em não reatar o noivado com ele e inconformado com a posição de Sem Medo em apoiá-la, retorna para a base no Mayombe após discussão com o comandante e sair afirmando que iria desfazer o mito de “sem medo” do comandante.

Chega a Dolisié a notícia de que os tugas aproximavam-se da atual base dos guerrilheiros no Mayombe, criando um cenário de tensão para o encerramento do capítulo e início do quarto capítulo intitulado “A Surucucu”.

Após algum tempo sem notícias da base dos guerrilheiros no Mayombe, já com a notícia dos tugas que se aproximam e em meio às sombras da meia luz noturna, Sem Medo e Ondina se envolvem em uma noite com relações sexuais, que é interrompida por Vewê chegando à porta com a notícia de um suposto ataque dos portugueses e com o pedido de reforços.

Sem Medo reúne trinta homens para ajudar a retomar a base dos tugas e resgatar os possíveis prisioneiros. O grupo organiza-se para um ataque ao amanhecer na base que eles acreditam estar tomada por portugueses. Durante a aproximação, instantes antes do ataque, eis que se deparam com o Teoria no rio a banhar-se e descobrem que tudo não passara de um mal entendido onde o suposto ataque com tiros que Vewê tinha ouvido, na verdade eram os guerrilheiros tentando capturar uma cobra Surucucu que havia tentado dar o bote em Teoria no dia anterior, ali mesmo no rio.

Este quarto capítulo encerra-se com a reunião do comando e a decisão de que eles atacariam a base dos tugas que estava nas proximidades.

O quinto e último capítulo denomina-se “A Amoreira”, em alusão à um cenário de uma árvore em meio ao docel homogêneo do Mayombe que se destaca com sua cor vermelha, durante um momento decisivo para Sem Medo e seus guerrilheiros. Sem Medo retorna à Dolisié para acertar os últimos preparativos para o ataque aos tugas que seria comandado pelo Comissário, pois ele iria ser sucessor no comando da base, tendo em vista que Sem Medo seria transferido para uma nova frente de guerrilha no oeste angolano.

Durante o ataque aos tugas, o Comissário, com uma atitude precipitada tentando provar o seu valor, ainda com o resquício de seu desentendimento com Sem Medo, coloca-se em uma situação de risco no meio da batalha. Lutamos tentando socorrer seu camarada é atingido fatalmente para, logo em seguida, pelo mesmo motivo, Sem Medo também ser baleado, porém no ventre, de onde vinham suas “comichões” psicológicas prévias a cada combate, levando-o à morte, tendo a amoreira como vislumbre no seio da morte.

O Comissário fica ao lado de Sem Medo até os últimos momentos ainda recebendo orientações tanto da guerrilha e quanto para seu relacionamento com Ondina, que Sem Medo confessa que ela ainda ama o Comissário. Sem Medo morre logo após reafirmar que o Comissário está no caminho certo, depois de relatar o fato do Mecânico, que estava em meio aos trabalhadores do primeiro capítulo, procurar o bureau de Dolisié para se juntar ao MPLA, motivado pelos últimos acontecimentos e com a postura exemplar dos combatentes do MPLA para com o povo de Cabinda.

O Chefe de Operações ressalta o fim trágico, mas cheio de significado, daquele combate em que Lutamos provou não ser um traidor e Sem Medo que morre como um herói. Este final favorece uma analogia semântica interessante - Sem Medo Lutamos / Lutamos Sem Medo - e fundamental para a ideologia de comprometimento dos partidários do MPLA.

O livro de Pepetela encerra-se com o Epílogo onde o Comissário exalta o heroísmo de Sem Medo e como ele, o Comissário, crescera até ali.

 

Bibliografia

 

Agualusa, José Eduardo. Estação das chuvas: romance. Leya, 2007.

 

CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico da língua portuguesa. 4ª edição revista e atualizada de acordo com a nova ortografia." Rio de Janeiro: Lexikon (2010).

 

Pacheco, Carlos. Carta aberta a Pepetela. Publicada originalmente no jornal “Público” [Lisboa] (nº 5753, 26 de Dezembro de 2005, p. 10)

 

Notas:

[1] Termo de caráter depreciativo para a designação ou característica de português, tendo-se originado de uma abreviatura de portuga e por sua vez de português, que remonta a fins do século XIX, segundo o dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (Cunha, A. 1986, p. 625)

[2] Cágado

[3] Não necessariamente num sentido sanguíneo, mas em Angola, quando se pertence à um mesmo grupo linguístico é considerado familiar.

[4] Cidade localizada no Congo e ao norte de Cabinda e do Mayombe.

[5] Alimento extraído de árvores no Mayombe.

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