Irã e Tajiquistão: Conflitos entre Países Irmãos
Por: José J.
24 de Agosto de 2019

Irã e Tajiquistão: Conflitos entre Países Irmãos

Laicismo e Ideologia Religiosa: O Confronto Interno Mais Importante no Mundo Muçulmano Atual

Relações Internacionais Historia Política Internacional Geopolítica

                                                                                                     Irã e Tajiquistão

                                                                   Conflitos Políticos e Ideológicos entre dois Países Irmãos       

Irã e Tajiquistão são nações irmãs: compartilham um fundo cultural comum, um mesmo idioma erudito, uma identidade geral persa e a mesma literatura clássica. Numa situação assim, um relacionamento harmônico e um intenso intercambio cultural seriam desenvolvimentos naturais na relação entre os dois países, mas não é o que costuma ocorrer desde que o Tajiquistão se tornou independente da URSS em 1991 devido à implosão desse estado. Não que não existam o constante fluxo de artistas, intelectuais, estudantes, diplomatas, professores, técnicos de diversos tipos, além de haverem tajiques que fazem turismo no Irã e vice-versa, no entanto, por conta da ideologia presente nos dois estados, seguidas de maneira hegemônicas pelas classes dominantes de ambos e países, além das tensões geopolíticas fortíssimas da Ásia Central há por parte do Tajiquistão uma forte desconfiança em relação ao irmão maior e, de tempos em tempos, o governo tajique esfria ou mesmo congela as relações com Irã. 

Por outro lado, os interesses, necessidades e ambições dos governantes tajiques e de suas classes dominantes também criam problemas e desconfianças do lado iraniano. Desde 2013 o Tajiquistão começou uma aproximação com a Arábia Saudita, país antes visto como inimigo por seu apoio forte aos islamistas durante a guerra civil dos anos 1990. Essa aproximação dos sauditas, realizada como parte de um projeto (amparado pelos EUA) de isolar o Irã e sabotar os processos de integração russo-chineses na Ásia Central, foi respondida por Teerã com um convite ao presidente do recém-banido Partido do Renascimento Islâmico do Tajiquistão, Muhiddin Kibiri, para a Conferência da Unidade Islâmica em Teerã (setembro de 2015), assim colocando pressão sobre o governo em Dushambe (a capital tajique).

Isto foi o que ocorreu desde 2014 até agora em 2019, quando a visita a Dushambe , primeiro do chanceler iraniano Muhammad Javad Zarif e do presidente do Irã Hassan Rohani, que realizaram encontros com o presidente tajique Emomali Rahmon no palácio presidencial (o Palácio das Nações) levaram a um forte afrouxamento das tensões e impasses entre os dois países, assim como a assinatura de diversos acordos nos setores de segurança, inteligência, transportes, comércio e saúde. Do lado tajique, o ministro das relações exteriores Sirodjidin Mukhriddin visitou Teerã para a assinatura de mais acordos políticos e de inteligência. Nesse processo de retomada plena das relações os voos entre Dushambe e Teerã foram retomados após oito meses de suspensão, embaixadores apontados em ambos os lados e o comércio e as relações de negócios, públicas e privadas, reassumidas.

Essas tensões entre dois países cuja colaboração seria algo normal é um fato de grande repercussão na Ásia, pois dificulta os processos de integração em curso e é explorado pelos EUA e seus aliados muçulmanos como um meio de sabotagem das organizações políticas surgidas nos últimos vinte e cinco anos na Eurásia e como forma de promover desestabilização nos países locais. Um exemplo importante foi a recusa recente do Tajiquistão em permitir a entrada do Irã como membro pleno na Organização de Cooperação de Shanghai, apesar da provação pública dos governos da China e Rússia, impedindo assim, momentaneamente, que essa organização chegue ao Oriente Médio. Essa região, estratégica para a segurança russa, nessa década vem presenciando um forte protagonismo russo e chinês dos quais a ação militar russa na Síria e os acordos da China com vários países locais para expandir e aprofundar o seu projeto de integração econômica, cultural e de infraestrutura (a Nova Rota da Seda) são dois dos exemplos mais importantes.

 Qual a origem de relação conturbada entre os dois países iranianos?

A relação tajique-iraniana nascerá conturbada por conta da posição que o governo do Irã tomará durante a sangrenta guerra civil do Tajiquistão (cerca de 60 mil-100 mil mortos e 1,2 milhão de deslocados- aproximadamente 20% da população) ocorrida entre 1992 e 1997, poucos meses após a sua independência devido à dissolução da União Soviética. A dissolução e consequente independência tajique foram seguidas por um processo eleitoral em 24 de novembro de 1991 no qual as duas forças políticas principais se enfrentaram: 1) o Partido Comunista do Tajiquistão do presidente Rahmon Nabiyev e outros grupos secularistas; 2) as forças anticomunistas representadas pelos liberais-conservadores do Partido Democrata do Tajiquistão e os islamistas, seguidores de uma ideologia religiosa semelhante a da organização egípcia Irmandade Muçulmana, do qual o Partido do Renascimento Islâmico do Tajiquistão éra o mais importante.

Rahmon Nabiyev venceu as eleições com 56,9% dos votos e se tornaria presidente do país recém-independente. No entanto, a oposição: tanto islâmica quanto liberal-conservadora acusou o processo de ser fraudulento. Agitações se seguiram nas cidades de todo o país e se mesclaram as tensões com a minoria pamir (povo iraniano oriental das províncias de Garm e de Gorno-Badakhshan na metade leste do país) e dos habitantes das cidades de Kulyab e Khujand que acusavam o governo central de não permitir sua representação de forma adequada nos postos do estado.

O processo em curso de derrota do Partido Democrático do Povo Afegão (PDPA) –comunista-, a partir de 1990 Partido Democrático Watan,  no Afeganistão frente à oposição islâmica sustentada pelos EUA e por partidos (como a Irmandade Muçulmana paquistanesa: o Jamiat al-Islami) e órgãos estatais do Paquistão (o serviço secreto do país, fortemente vinculado a CIA dos EUA-o ISIS) estimulou a ação dos mesmos grupos no Tajiquistão. Estes grupos também recebiam apoio dos EUA via a liderança de etnia tajique do Afeganistão Ahmad Shah Massud que lhes dava treinamento, armas, munição e repassava o dinheiro da CIA e os instrutores políticos e militares paquistaneses.

Em 3 de maio de 1992 uma grande manifestação teve lugar na Praça Shakhidon na capital Dushambe por parte dos islamistas. Uma contra manifestação foi respondida pelas forças politicas seculares nos dias seguintes também na capital. Safarali Kenjayev, o presidente do Soviete Supremo, havia distribuído armas a população nos meses anteriores e milícias seculares se formaram com a ajuda dos militares da Rússia e também contando com a participação dos russos étnicos locais. A situação rapidamente degenera e os combates começam nos arredores da capital, nas proximidades com a fronteira afegã e no Gorno-Badakhshan.

A guerra rapidamente se alastra e conduz o país ao caos e nos primeiros meses os islamistas e liberais, reunidos na Frente de Oposição Unida, levam vantagem e avançam sobre grande parte do país, chegando em setembro de 1992 a capturar Rahmon e obriga-lo, com uma arma na cabeça, a renunciar a presidência. A principal liderança dos islamistas é Sayd Abdulloh Nuri, presidente do Partido do Renascimento Islâmico do Tajiquistão, figura ligada tanto ao Irã como aos EUA. Frente à possibilidade da guerra se estender as outras ex-repúblicas soviéticas centro-asiáticas, o Cazaquistão, o Uzbequistão, o Quirguistão e a Rússia formam uma coalizam em apoio ao governo tajique. Em dezembro a coalizão secular retoma a vantagem e ao controlar a capital, o Soviete Supremo tajique, ao se reunir em dezembro, confirma Rahmon como presidente.

Assim, no plano externo tínhamos o governo tajique apoiado por Rússia, as vizinhas ex-repúblicas soviéticas da Ásia Central e a China. Os rebeldes recebiam apoio do Paquistão, Arábia Saudita, do recém-instalado Estado Islâmico do Afeganistão, central nisso tudo, dos EUA através do esquema de guerra encoberta da CIA como foi utilizado no vizinho Afeganistão na década anterior. Nesse cenário o Irã tomou uma posição que envenenou até hoje a sua relação com o Tajiquistão: eles irão publicamente apoiar a oposição islâmica de direita.

Com a morte de Khomeini em junho de 1989 sobe ao poder no Irã uma ala dita “pragmática” favorável a um capitalismo liberal e propensa a assumir compromissos com os EUA, então o vencedor da Guerra Fria. Ela é representada pelo presidente Ali Akbar Rafsanjani (presidente entre 1989 e 1997). Essa ala participara anos antes das negociações para a compra de armamentos dos EUA, via Israel, durante a guerra com o Iraque e viam com simpatia a campanha norte-americana contra o governo comunista afegão. Tudo isso ocorreu apesar do Irã oficialmente estar rompido com os EUA e combater o poder de Israel no Oriente Médio.

A ideologia desses grupos era muito próxima da direita islâmica sunita e desde a revolução islâmica em 1979 eles sempre mantiveram contatos com ela, incluindo as direitas muçulmanas sunita e xiita do Afeganistão e, possivelmente, das repúblicas muçulmanas da União Soviética. A presença dos tajiques como uma importante nacionalidade na União Soviética pode ter favorecido esses contatos, além do fato de que, historicamente, esses povos usaram a língua persa como idioma erudito, comercial e oficial e a cultura do Irã sempre teve forte influência sobre eles.

Ao mesmo tempo a política “pragmática” do grupo de Rafsanjani buscava acomodação ao poder unilateral mundial dos EUA ao qual a população iraniana se opunha. Essa situação politica interna complexa leva, em nome da defesa da religião muçulmana, o governo iraniano dos anos 1990 a apoiar ações políticas e militares dos EUA no mundo contra países com população muçulmana que se recusam a se submeter de forma total a burguesia dos EUA. Este foi o caso do apoio forte (envio de tropas da Guarda Revolucionária) ao governo muçulmano pró-americano na Bósnia em sua luta contra os sérvios locais e a república da Iugoslávia e esse foi o caso da guerra civil tajique no qual os EUA buscavam destruir todos os elementos de secularismo e socialismo para instalar, a partir do Tajiquistão, regimes islâmicos de direita na Ásia Central.

A guerra durou até 1997 e teve, como já dito, a intervenção militar da Rússia, Cazaquistão, Uzbequistão e Quirguistão ao lado do governo para conter os islamistas, sendo que esses, ainda em 1992 chegaram a capturar Rahmon Nabiyev e, com uma arma na cabeça, o obrigaram momentaneamente a renunciar.  Em 1993, Emomali Rahmon, do centro-direitista Partido Democrático do Povo do Tajiquistão assume a presidencia. A incapacidade dos islamistas de vencer, mas a dificuldade da coalizão secular e derrota-los forçaram a ambos os lados a buscar um acordo de paz mediado pela ONU (que contou com a participação do Irã, como intermediário da oposição e da Rússia, como intermediário do governo) que trouxe a paz e permitiram à participação das forças de oposição no governo e a incorporação dos guerrilheiros as forças armadas. Contingentes militares russos permaneceram no país e a administração das fronteiras foi entrega a guarda de fronteira russa. Nas eleições de 1999 Rahmon foi eleito novamente.

Dessa forma, o governo e a maioria da população tajique (que apoiou Rahmon contra os islamistas) passam a ver com certa desconfiança o Irã e tudo o que de lá vem. O fato de diversos membros da Oposição Unida Tajique também se exilarem no Irã, incluindo aí muitos militantes e boa parte da liderança do Partido do Renascimento Islâmico no Tajiquistão, contribui fortemente para manter acesa a desconfiança.

 Nunca houve um rompimento total entre os dois países e o intercambio de pessoas e produtos bem como a instalação no Tajiquistão de organizações iranianas (culturais, sociais, médicas, etc.) sempre aconteceu. Os dois países também estavam associados no apoio ao grupo armado afegão Aliança do Norte (majoritariamente tajique) entre 1996-2001 em sua oposição ao governo do Taliban (composto majoritariamente por pessoas do povo Pashtun, o maior do Afeganistão), assim como ambos os países colaboraram com os EUA em sua invasão do Afeganistão em outubro-novembro de 2001, bem como na montagem do governo fantoche de Cabul no qual os tajiques foram o elemento étnico dominante. Também, ainda que não exatamente pelos mesmos motivos, ambos os países persas, na maior parte do tempo, sempre mantiveram uma forte desconfiança da Arábia Saudita devido à política hostil dela em relação aos seus regimes políticos.

A desconfiança com a oposição islâmica nunca desapareceu e ela era compartilhada pelos dois maiores parceiros internacionais do Tajiquistão: a Rússia, país vital para a sua segurança e que abriga uma grande diáspora tajique cuja remessa de dinheiro é essencial para a saúde econômica e social da nação e a China, o maior parceiro e investidor do Tajiquistão, além de um parceiro militar, pois os chineses sempre temem que o seu aliado seja usado como caminho para a oposição islâmica uigur ter contato com a CIA.

Como o Tajiquistão faz parte da Organização de Cooperação de Shanghai, organização liderada por russos e chineses e que teve na guerra civil tajique uma das causas do seu surgimento, no qual o combate ao terrorismo islamista é um dos seus objetivos básicos, o ambiente geopolítico favorável a aceitar como força política legitima os partidos da Oposição Unida Tajique dos anos 1990 estava desaparecendo. O fato de essa oposição ter sido muito ajudada pelos tajiques colaboradores dos norte-americanos na ocupação militar do Afeganistão os tornava aliados potenciais dos EUA caso esse país resolvesse agir contra Rahmon por ter posturas mais favoráveis a Moscou e Pequim do que a Washington.

Nesse contexto o governo tajique começou a tomar medidas no começo dessa década contra a direita muçulmana. Em 2011 foi emitido o protocolo número 32-20 de combate a organizações tidas como terroristas ou apoiadoras do terrorismo. O alvo foi rapidamente percebido como sendo o Partido do Renascimento Islâmico. O líder deste partido, após a morte de Abdulloh Nuri em 2006, Muhiddin Kabiri passou a protestar contra a atitude do governo frente ao seu grupo político.

Em 2015 o Partido do Renascimento Islâmico recebeu uma carta do governo pedindo para que ele encerrasse as suas atividades. No mesmo ano houve um incidente mal explicado envolvendo o ex-ministro da defesa Abduhalim Nazarzoda no qual o governo o acusou de organizar um golpe com o apoio da oposição. Assim, no mês de setembro, o partido de Kabiri foi banido. Nesse contexto ocorreu a sua visita a Teerã para a Conferência Mundial Islâmica e os protestos diplomáticos de Dushambe.

Nos anos seguintes as medidas de afastamento levam a queda do comércio entre os dois países de $165 milhões de dólares para $92 milhões. Diversas companhias iranianas deixaram o país, linhas aéreas foram interrompidas e o governo ordenou até a produção de documentários mentirosos no qual se acusava o Irã de ter criado a guerra civil dos anos 1990 e de o governo desse país dar treinamento ao Partido do Renascimento Islâmico na cidade sagrada xiita de Qom para este realizar ataques terroristas no Tajiquistão. Eram insultos muito grandes ao país irmão cujo potencial para um rompimento completo era muito claro.

Mas o governo iraniano não se deixou levar pelas manobras de Rahmon e seu gabinete. Afinal um rompimento com Dushambe favoreceria a ação da Arábia Saudita nesse país. Em 2015 o convite a Kabiri para a Conferência Internacional Islâmica ocorreu como forma de protesto e pressão por conta da aproximação do governo tajique com a monarquia saudita o que levou este a concederem um empréstimo de $200 milhões para a construção dos novos complexos parlamentares e governamentais na capital, assim como, o governo Rahmon, acertou com os sauditas, um financiamento de $35 milhões para a construção de escolas ao longo país.

Essa medida, a primeira vista, era uma contradição em relação às “medidas antiterroristas” até então adotadas, incluindo a proibição do partido de Kabiri, pois desde os anos 1970 os sauditas financiam a construção de centros educacionais no mundo muçulmano sunita com o objetivo de difundir a sua forma puritana e intolerante de islamismo: o wahabismo. Uma contradição aparente também com o laicismo tajique e dos grupos que ficaram ao lado de Rahmon contra a coalizão islâmica na guerra civil dos anos 1990.

Nos anos seguintes a posição pró-saudita do governo tajique ficou clara na sua participação na Cúpula de Riad presidida por Trump e o rei Salman da Arábia Saudita. Para o analista francês Thierry Meyssan essa cúpula indicaria que os EUA teriam se distanciado dos grupos islâmicos de direita como a Irmandade Muçulmana. A participação tajique nela indicaria um desejo de suas elites de se distanciar um pouco das organizações russas e chinesas, sem rompimento, e de se abrir mais ao capital ocidental e seus sócios muçulmanos como são os árabes do Golfo.

A aproximação tajique em relação aos sauditas também era algo complicado para os demais membros plenos da Organização de Cooperação de Shanghai, ainda mais, não só pelo fato de que todos, em algum momento, sofreram as consequências do patrocínio saudita a grupos políticos muçulmanos wahabitas em seus países, mas também pelo confronto saudita contra a Síria por meio dos diversos grupos islamistas (incluindo o chamado “Estado Islâmico”) no qual o governo russo enfrentava para impedir a queda do governo sírio e a destruição social do país e sua complexa teia de comunidades religiosas.

 E tanto os governos em Moscou como em Pequim procuraram agir para barrar a influência saudita e o perigo desta se estender aos demais países centro-asiáticos. Dessa forma, o governo Putin procurou reforçar a cooperação militar com o Tajiquistão. O Tajiquistão continuou mantendo a maior base militar russa no exterior, um acordo retomou a antiga participação dos anos 1990 dos guardas de fronteira russa no patrulhamento da fronteira com o Afeganistão e novos instrutores militares russos chegaram ao país. Moscou também investiu fortemente na modernização da infraestrutura de fronteira do país. Acordos no campo educacional levaram ao envio, em 2017, de professores russos para as escolas do país, bem como o envio de material escolar para o país- seria uma resposta aos acordos educacionais com os sauditas?

A dependência econômica tajique em relação à Rússia também contribuiu para a ação diplomática de Moscou (geralmente as remessas dos imigrantes tajiques representam quase metade do PIB), o equipamento, material e munição das forças armadas locais são russas, bem como de boa parte das forças de segurança do país. O comércio bilateral continuou em crescimento e a estação hidrelétrica de Sangtuda-1, em Dushambe, recebeu 16 bilhões de rublos de investimentos de empresas russas e Moscou apoia o projeto tajique de fazer seu país um produtor e exportador de energia elétrica para os países vizinhos.

Já a China é o maior parceiro comercial do Tajiquistão, apoio e ajudou o governo na guerra civil dos anos 1990, muitas empresas chinesas atuam no país e a maior parte dos bens industrializados a venda no país são chineses. Os chineses também emprestaram, desde 2012, 1 bilhão de dólares na forma de créditos, doações e assistência técnica. Acordos educacionais e culturais, incluindo escolas de chinês e um Centro Confúcio na capital, bem frequentadas consolidaram a relação entre os dois países. Pequim também promoveu o Mecanismo de Cooperação e Coordenação Quadrilateral com o governo de Dushambe, mas também com o Paquistão e até o Afeganistão para a estabilidade do entorno tajique. A estabilidade do Tajiquistão é vital para a China evitar a infiltração de apoio estrangeiro para a direita islâmica separatista do povo uigur na região autônoma do Sinjiang.

Nesse quadro de esforços diplomáticos e fortes laços econômico-culturais-institucionais do Tajiquistão para com os dois maiores parceiros do Irã no mundo, um cenário para o alivio das tensões e melhora das relações entre Teerã e Dushambe começou a se formar. Do lado iraniano também parece ter havido ações no sentido de diminuir a tensão com os tajiques. Já em 2015 Kabiri fez declarações públicas afirmando que o Irã, ao contrário dos anos 1990, não estava mais preparado para receber os exilados do seu partido. Isto poderia ser um sinal de que, nos bastidores, o governo iraniano teria dito a Kabiri que priorizava as suas relações com o Tajiquistão em vez do seu partido.

Além disso, como afirmou o analista Andrew Koribko, a saída unilateral dos EUA do Acordo Nuclear de Viena (assinado em 2015) fez com que o Irã visse nas relações com os vizinhos da Ásia Central uma necessidade para garantir a sua segurança nacional frente à hostilidade americana e mesmo israelense. Dessa forma, recompor o conjunto das relações diplomáticas com o irmão tajique era importante para também não criar desavenças e desconfianças nas demais repúblicas da região, países com os quais o Irã também tem tanto laços históricos fortes como relações comerciais, político-militares e diplomáticas importantes. Essas boas relações com os demais países centro-asiáticos, por sua vez, também estimulavam a Rússia e a China a agir para abrandar a hostilidade do governo de Rahmon para com Teerã.

O Irã não rompeu com o Partido do Renascimento Islâmico do Tajiquistão, ele continua sendo importante para promover a imagem do país entre setores mais tradicionais da sociedade tajique como parte da população rural, mas os eventos dos últimos quatro anos mostram como são perigosos conflitos com países vizinhos estratégicos como o Tajiquistão, pois fragilizam o Irã internacionalmente e faz com que o país com o qual Teerã está em choque possa ser atraído para a órbita de governos inimigos como é o caso saudita, mas também poderia, possivelmente, ser também os casos americano e até israelense.

   O Irã, então, parece buscar uma politica equilibrada, sem romper com o Partido do Renascimento Islâmico (deixou de considera-lo, durante a visita de Rouhani a Dushambe, oficialmente uma organização terrorista em seus relatórios públicos), como pediu Rahmon publicamente em diverso momentos, busca recompor as relações com os tajiques afirmando ser contra todo tipo de terrorismo e de partidos e grupos armados extremistas. Também os iranianos parecem dar sinais de que aceitariam o filho de Rahmon, Rustam Emomali, como um sucessor do pai.

No momento, então, ambos os países seguem negociando a reconstrução de suas relações. Para o processo em curso de integração da Eurásia é uma boa noticia.

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José J.
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Mestrado: História (Universidade de São Paulo (USP))
Professor de História com Mestrado na USP. Experiência de ensino desde 2005. Venha conhecer uma disciplina muito necessária para a vida.
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