O Papel Histórico da Turquia no Século XX
Por: José J.
07 de Agosto de 2019

O Papel Histórico da Turquia no Século XX

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                                O Papel Histórico da Turquia no Século XX

 

Possuindo na figura do militar e veterano da I Guerra Mundial (1914-1918) Mustafa Kemal Atatürk (1881-1938) o seu fundador, a moderna república da Turquia, estabelecida em 1923, se caracterizou por implementar uma política de modernização, desenvolvimento sócio-econômico e industrialização mesclada com um forte etnocentrismo turco-muçulmano, que destacava mais o componente islâmico nacionalizado frente aos povos cristãos da Anatólia (armênios, gregos pônticos e capadócios, assírios e outros) e o componente turco frente os muçulmanos (curdos e zazas, árabes sírios de Antioquia, lázicos, ciganos, etc) que eram obrigados a se turquificarem. Frente aos muçulmanos não-sunitas, como os alevitas, havia simultaneamente uma política de laicização e turquificação.

Nesse cenário complexo onde se mesclam o nacionalismo antiimperialista modernizador-desenvolvimentista com um forte exclusivismo étnico confessional, o apoio da URSS foi, em determinados momentos, decisivos e a incorporação parcial do seu modelo de planejamento econômico, mais uma relação ambígua com o Ocidente colonial (ora modelo, ora inimigo, ora favorecedor e apoiador) e períodos de autoritarismo seguidos de momentos de distensão política, temos, entre 1923 (fim das guerras com os gregos e potências coloniais, fim do holocausto armênio e da “troca” de populações com a Grécia de acordo com o Tratado de Lausanne) e 1945-1950, sob o comando de Atatürk, Celal Bayar e Ismet Inönü as bases de como se estruturará o estado turco até a ascensão do governo do Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP nas siglas em turco) e de seu líder, o atual presidente Recep Erdogan em 2002, um político islamistas vinculado ao grupo político internacional da Irmandade Muçulmana.

A inclinação ocidental, sempre existente desde os tempos de Atartük, ficará definitivamente estabelecida durante o mandato do primeiro-ministro Adnan Menderes (1950-1960), onde o kemalista Bayar será presidente, que incorporará a Turquia a Aliança Militar Ocidental (OTAN) em 1955, bem como será um dos criadores do Pacto de Bagdá- isso, após Inönü permitir, em 1947, a aceitação do Plano Marshall-e garantirá a entrada maciça do capital ocidental, comandado pelo norte-americano, que se associará ao local.

Mas, ainda assim, o estado turco assumirá no Mundo Muçulmano no século XX um papel em parte semelhante ao do Japão no Extremo Oriente: a política de industrialização por meio da participação do estado no qual os planos qüinqüenais, em boa parte de forte inspiração soviética, o sucesso em começar a livrar o país do subdesenvolvimento e dependência em relação aos centros capitalistas ocidentais, estimulará, sob diversas formas, os mais variados projetos políticos desenvolvimentistas nos países muçulmanos. Assim, desde governos de direita como o do rei Reza Khan no Irã (1921-1942) e até pró-americanos como os de Reza Pahlevi (1953-1979), a monarquia saudita, Israel, o rei Hassan no Marrocos (1961-1999), etc, indo até os revolucionários como o de Gamal Abdel Nasser no Egito (1954-1970), o Iraque (1958-2003), a Síria do Partido Ba´ath (1963 até hoje), a Líbia da Jamahiria kadhafista (1969-2011), o Iêmen do norte de Abdullah al-Sallal (1962-1967), a Argélia revolucionária entre 1962-1979 e mesmo a Tunísia de Habib Burguibá ,pelo menos até o ano de 1973, entre outros exemplos, veremos o experimento turco do entre-guerras ser estudados, adaptado e total ou parcialmente implementado.

No entanto, a entrada da Turquia na OTAN mudou radicalmente a posição geopolítica desse país no Mundo Muçulmano: embora fazendo parte do que era chamado na Guerra Fria de Terceiro Mundo, agora esse estado estava na mesma aliança militar do qual faziam parte os países imperialistas europeus (os colonizadores do Mundo Muçulmano) e o líder e sucessor deles depois de 1945: os EUA. Assim, era como se a Turquia fosse parte do Ocidente, convertendo-se em inimiga e colonizadora dos países muçulmanos e de outras partes do Terceiro Mundo. Ela funcionava geopoliticamente como uma cunha ocidental no Oriente Médio, dividindo e fragmentado a região junto com o estado de Israel, com o qual se aliaria, secretamente, em 1958, durante a I Guerra Civil Libanesa.

Então, a partir dos anos 1950 a Turquia se colocaria como inimiga de todos os governos e populações que se opusessem a dominação americana no Oriente Próximo e, por sua vez, receberia pesado apoio político, militar e financeiro para reprimir grupos políticos, sociais ou étnicos (como os curdos dos leste do país) que se levantassem contra o governo, quase sempre exigindo direitos ou a completa independência do país das estruturas da OTAN.

Nos anos da Guerra Fria, enquanto no plano econômico interno, a aliança entre o capital nacional e o ocidental, especialmente o norte-americano, promoviam um grande processo de desenvolvimento e crescimento industrial, estimulando- desde a década de 1950- um grande êxodo rural, no plano regional a Turquia se oporá, de maneira aberta ou não, a qualquer projeto nacionalista, socialmente reformador ou revolucionário, agindo em conjunto com os governos dos EUA e Israel para destruí-los. Com esse país, como já dito, em meio a I Guerra Civil Libanesa (maio-setembro de 1958) firma um acordo secreto de aliança que torna o estado turco um agente colonizador dos países árabes e inimigo dos palestinos (no qual 700 mil haviam sido expulsos de seu país pelos israelenses em 1948), ainda que oficialmente defenda os seus direitos.

Assim, os governos turcos se opõem as várias formas do nacionalismo árabe (nasserista, baathista, líbio, argelino, etc), ficam a favor do presidente Camille Shamun na I Guerra Civil Libanesa, se aproximam das Forças Libanesas e das elites cristãs maronitas (árabes católicos do Líbano e da Síria) na II Guerra Civil Libanesa (1975-1990), ameaçam a Síria do presidente Adib al-Shishakli, com uma invasão  em 1957 por conta de sua aproximação com a URSS. Nos países muçulmanos não-árabes irão se opor ao governo comunista afegão dos anos 1980, tomaram distância do governo de Ali Bhutto no Paquistão na década de 1970,  etc. Tudo isso acompanhado de fortes processos de repressão interna contra a esquerda (armada ou não), os curdos, movimentos sociais e sindicatos de trabalhadores, grupos nacionalistas armênios (acompanhado da constante negação do Holocausto armênio da Primeira Guerra Mundial), entre vários outros grupos políticos e sociais.

Com a derrota da URSS na Guerra Fria, a Turquia passa a agir como um aglutinador dos povos das repúblicas falantes de línguas turcas que faziam parte daquele país (azeris, turcomenos, uzbeques, quirguizes, cazaques) em torno do poder norte-americano e, ao mesmo tempo, procura entrar na União Européia (estimulada pelos EUA) promovendo internamente uma identidade européia. Nos anos 1990, em meio a guerra contra os curdos na Anatólia oriental, o governo de Ankara continua o enfrentamento com a Síria baathista do presidente Hafez al-Assad, apoiador do movimento curdo aglutinado em torno do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão), cuja sede estava na capital síria: Damasco e a Armênia na sua guerra com o Azerbaijão (aliado turco) entre 1991-1994, o que quase leva a guerra aberta entre os dois países em 1999 por conta do asilo dado ao presidente do PKK e líder nacional curdo Abdullah Ocalam.

Também na década de 1990, as sucessivas administrações turcas também impõem políticas neoliberais que resultam numa grave crise entre 1998 e 2001. Uma dessas administrações foi a de uma força oficialmente de esquerda: os socialdemocratas do Partido Democrata de Esquerda do poeta e presidente Bülent Ecevit resultando tanto na desmoralização da esquerda moderada quando dos militares kemalistas que apoaiavam o neoliberalismo e o empobrecimento em massa da população turca. A desmoralização acabará levará ao poder o partido de Justiça e Desenvolvimento (AKP na sigla turca) de Recep Erdogan, nas eleições de 2002, de caráter islamista e apoiado pelos EUA. Sua subida significa a queda histórica dos kemalistas nos quais as prisões e expurgos dos cargos do estado e das forças a armadas turcas foram recebidos por boa parte da sociedade turca como um merecido combate a desmandos e corrupções

Bibliografia:

Ó Colmáin, Geraoid:Turkey’s New Role: From NATO Lapdog to Emerging Empire? http://www.globalresearch.ca/turkeys-new-role-from-nato-lapdog-to-emerging-empire. /Murinson, Alexander: Turkey's Entente with Israel and Azerbaijan: State Identity and Security in the Middle East and Caucasus (Routledge Studies in Middle Eastern Politics) 1st Edition. Routledge, Taylor and Francis Grup,-Routledge Studies in Middle East, London & New Yok, 2010. / Richards, Alan and Waterbury, John: A Political Economy of the Middle East. Second Edition. Westview Press, Boulder & Oxford, 1998.

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Mestrado: História (Universidade de São Paulo (USP))
Professor de História com Mestrado na USP. Experiência de ensino desde 2005. Venha conhecer uma disciplina muito necessária para a vida.
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