Metabolismo das paratireoides, do Ca++ e do PO4-
Por: Leonardo S.
30 de Janeiro de 2022

Metabolismo das paratireoides, do Ca++ e do PO4-

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O elemento cálcio desempenha diversas funções dentro do organismo humano. Os níveis plasmáticos de cálcio garantem:

  • Transmissão do impulso elétrico; 
  • Sinalização intracelular;
  • Coagulação sanguínea;
  • Estruturação óssea/ dentária;
  • Secreção hormonal (ex.: insulina)
  • Estabilização da membrana celular.

A regulação da homeostase do cálcio está sujeita a ação de três hormônios: (1) paratormônio (PTH); (2) 1,25 (OH)2-Vitamina D e (3) calcitonina. Outros fatores locais como o fator de crescimento de (4) fibroblasto (FGF-23) e citocinas, ambos presentes nos ossos, participam ativamente da homeostasia do cálcio.

(1) O PTH é um hormônio calcêmico sintetizado e secretado pelas glândulas paratireoides com o objetivo primário de manter a concentração extracelular deste importante mineral dentro de um estreito intervalo de normalidade. A redução da [Ca++ ] é rapidamente detectada pelos receptores sensores de cálcio (CaSR) acoplados à proteína G, presentes nas células principais das paratireoides, assim como nas células tireoidianas secretoras de calcitonina, no rim e no encéfalo. Como resposta,  haverá aumento na secreção de PTH, o qual tentará restaurar os níveis plasmáticos adequados a partir de tais mecanismos: 

  • Estimular a reabsorção de Ca++ por atividade osteoclástica. Esse processo de desmineralização óssea depende da presença dos osteoblastos, uma vez que os osteoclastos não possuem receptores para PTH. Dessa forma, o PTH liga-se aos osteoblastos, que por sua vez secretam citocinas ativadoras da atividade osteoclástica;
  • Estimular a hidroxilação do C-25 da 25(OH)-Vitamina D (principal forma circulante, com ½ vida de três semanas), pela enzima 1∝-hidroxilase, na TCP dos néfrons, que então assumirá sua forma biologicamente ativa 1,25(OH)2-VD, que irá atuar no intestino delgado (jejuno principalmente), aumentando a absorção de cálcio dietético;
  • Estimular a reabsorção de Ca++ por via transcelular no TCD e via paracelular no ramo espesso do segmento ascendente. 

Além da hipocalcemia (e da hiperfosfatemia), as catecolaminas também estimulam a liberação de PTH. Por outro lado, o Ca++ (iônico), em sua concentração fisiológica, é um potente inibidor da secreção de PTH, realizando tal controle pelo mecanismo de retroalimentação negativa. A 1,25(OH)2-VD também o faz pelo mesmo mecanismo, embora atue nos receptores nucleares, inibindo diretamente o gene codificador de PTH. 

A molécula PTHrP (peptídeo relacionado com PTH) exerce pouca influência na homeostasia do cálcio, exceto em estados patológicos. Níveis plasmáticos elevados de PTHrP são frequentemente observados em casos de hipercalcemia humoral da malignidade (HHM). Tal síndrome se assemelha ao hiperparatireoidismo primário (HPTP), exceto pela concentração plasmática de PTH que se encontra normal na HHM e elevada no HPTP.

Características do PTH:

  • Possui secreção contínua (cerca de seis ou sete pulsos por hora)
  • 80% do PTH circulante é inativado por ter sofrido metabolização hepática (possui fragmento carboxiterminal). 
  • 10% do PTH circulante apesar de ter sofrido metabolização hepática ainda é ativo (possui fragmento aminoterminal)
  • 10% do PTH circulante está íntegro, isto é, não sofreu metabolização hepática e portanto está ativo. Essa fração é utilizada para dosagem dos níveis de PTH. 

Efeitos do PTH nos órgãos-alvo: 

  • Os dois principais órgãos-alvo são: ossos e rim (indiretamente o intestino delgado)
  • Néfrons: no TCD, o PTH regula a reabsorção transcelular de Ca++ (no TCP  a reabsorção de Ca++ é ´paracelular, portanto, não sofre modificações diretas pela ação do PTH ou fármacos. No ramo ascendente espesso há os dois tipos de reabsorção, sendo que o PTH atua apenas no transcelular).
  • Também diminui a expressão de transportadores Na+/ PO4- , diminuindo a reabsorção de fosfato. (Também estão presentes nos enterócitos).
  • Osteócitos: 1º o PTH estimula a liberação de Ca++ de reserva. Somente depois que ocorre ativação da reabsorção óssea.  A ativação ocorre por meio de sinalização da proteína RANKL que ativa os osteoclastos, que são as responsáveis por promover apoptose dos osteócitos, liberando Ca++

(2) A 1,25(OH)2-Vitamina D, também chamada de calcitriol, é a forma biologicamente ativa desse hormônio lipossolúvel. Tem como precursores o colecalciferol (vitamina D3) e o ergocalciferol (vitamina D2). O colecalciferol é sintetizado na pele a partir de um precursor lipídico (colesterol) em resposta à radiação UVB ou pela dieta (peixes, gema de ovo e fígado bovino), ao passo que a ergocalciferol é de origem vegetal, sendo comercializado após tratamento com radiação. Ambas apresentações são transportadas até o fígado por uma proteína específica para VD, onde sofrem a primeira hidroxilação no C-25, transformando-se em 25(OH)-VD e, subsequentemente, em 1,25(OH)2-VD, após sofrer, no rim, a segunda hidroxilação. O calcitriol tem como principais funções:

  • Estimular a reabsorção intestinal de Ca++ ;
  • Estimular a reabsorção renal de Ca++ ;
  • Estimular a reabsorção óssea de  Ca++ .

(3) A calcitonina é um hormônio hipocalcêmico produzido pela tireoide com atividade limitada na regulação da homeostasia do cálcio, contudo, atua inibindo a reabsorção osteoclástica, ao mesmo tempo em que aumenta sua depuração renal, antagonizando as funções do PTH. Tem sido utilizado para tratar osteoporose e câncer (?).

Homeostasia do cálcio

O corpo humano contém cerca de 1 a 2 kg de cálcio, sendo que 99% estão depositados nos ossos e dentes. O restante (1%) está circulando no plasma de três formas: ionizado (50%); associado à proteínas de carga negativa  como albumina e imunoglobulinas (40%) ou combinado fracamente a ânions como fosfato, citrato ou sulfato (10%). Apenas a fração iônica desempenha função fisiológica. A concentração plasmática normal de cálcio total está contida entre 8,6 a 10,4 mg/dL e sua fração ionizada entre 4,4 e 5,2 mg/dL. Os distúrbios da concentração sérica de cálcio são frequentes na prática clínica e constituem indício de uma possível doença subjacente. Entretanto, devemos ter em mente que tais valores sofrem influência da concentração plasmática das proteínas de carga negativa - albumina e imunoglobulinas -, que se ligam a 40% do cálcio circulante, assim como; assim como da variação do pH. A hipoalbuminemia por desnutrição, doenças crônicas e síndrome nefrótica que podem induzir ao diagnóstico errôneo de hipocalcemia. O pH alcalino aumenta a afinidade do complexo cálcio-proteína, implicando em redução da fração iônica, em contrapartida, o pH ácido enfraquece essa ligação, aumentando a fração de cálcio livre. Existem duas soluções para contornar este problema: realizar dosagem de cálcio iônico ou utilizar a fórmula de correção do cálcio total para valores de albumina plasmática.

           Cálcio total corrigido (mg/ dL) = [Cálcio total] (mg/dL) x 0,8 [4 - albumina plasmática (g/dL)] 

A [Ca++ ] intracelular da célula em repouso é de 100 nM, ao passo que quando se encontra em atividade pode aumentar para até 1uM. Por outro lado, a [Ca++ ] extracelular é cerca de 1000 vezes o valor da concentração intracelular, com valores fixos próximos a 1mM. 

Hipercalcemia | Definição: cálcio total > 10,4 mg/ dL ou cálcio iônico > 5,2 mg/ dL.

O aumento de cálcio plasmático geralmente decorre de alguma falha em seus mecanismos regulatórios. Pode haver secreção inapropriadamente aumentada de PTH causada por (a) neoplasias primárias nas glândulas paratireoides (adenomas, hiperplasias ou, embora menos frequente, carcinomas), determinando falha na infrarregulação pelos níveis fisiológicos de cálcio, condição denominada de hiperparatireoidismo primário. A hipersecreção de PTH também é observada em hipercalcemias provocadas por (b) mutações genéticas autossômicas dominantes, principalmente no CaRS, interferindo na ligação do cálcio ao seu receptor, tal como se observa na Hipercalcemia hipocalciúrica familiar (HHF). A (c) atividade anômala de PTHrP produzido por células tumorais também aumenta a reabsorção de cálcio, pois tal molécula mimetiza o PTH no processo de hidroxilação do C-1 da 25(OH)-VD, resultando em aumento da absorção de cálcio pelo intestino delgado, rim e ossos. Contudo, o calcitriol inibe a secreção de PTH, reduzindo sua concentração plasmática. As (d) doenças granulomatosas (sarcoidose, tuberculose e paracoccidioidomicose) aumentam a formação de 1,25(OH)2-VD, portanto, também implicam em maior reabsorção de cálcio associada à inibição de PTH. Alguns (e) fármacos podem induzir hipercalcemia, tais como lítio, diuréticos tiazídicos, ácido retinóico, antiestrogênicos e suplemento de vitamina D (intoxicação). A (f) hipercalcemia humoral da malignidade (HHM) e  (g) excesso de cálcio em dieta parenteral também estão relacionados com o quadro. (h) hipertireoidismo e (i) imobilização também podem induzir aumento de cálcio sérico.

 Algumas considerações:

(a): O diagnóstico definitivo é determinado laboratorialmente pelos níveis plasmáticos concomitantemente aumentados de cálcio e PTH. Os exames de imagem, como USG e cintilografia devem ser reservados para planejamento cirúrgico, que é o tratamento definitivo de HPTP. 

(e): os tiazídicos aumentam a reabsorção tubular de cálcio.

(f): Juntamente com HPTP e com a produção anômala de PTHrP correspondem a 90% dos casos de hipercalcemia. As neoplasias malignas mais associadas são pulmões, mamas, cabeça e pescoço, esôfago, mieloma múltiplo e rins. Entretanto, pode ocorrer em qualquer um. 

Quadro clínico: o excesso de cálcio pode provocar sinais e sintomas em todos os tecidos com células excitáveis; portanto neurológicos, cardíacos, osteomusculares (inclui musculatura esquelética e lisa). Contudo, demais tecidos também são afetados, pois o cálcio é um importante estabilizador de membrana, além de participar diretamente da sinalização intracelular. Dessa maneira, podemos observar sinais e sintomas urinários (renais) 

Neurológicos: alterações comportamentais e cognitivas; rebaixamento de consciência (obnubilação, torpor e coma) 

Cardíacos: arritmias 

Ossos: deformidades

Músculos: fraqueza muscular

Urinários: poliúria (o PTH diminui a expressão de Na/PO4)

Diagnósticos diferenciais:

Hipercalcemia aguda → principal hipótese: neoplasias

Hipercalcemia com história insidiosa →  principal hipótese: hiperparatireoidismo primário.  

Avaliação laboratorial 

Solicitar cálcio total e/ ou cálcio iônico; PTH fração intacta; albumina para fazer a correção. 

Casos assintomáticos ou oligossintomáticos se correlacionam com níveis plasmáticos que não ultrapassam 12 mg/ dL. Em tais casos, investigar HPTP e revisar fármacos hipercalcemiantes e, se for o caso, suspender o uso se possível. No caso de HPTP, como já mencionado, a abordagem cirúrgica é a primeira opção, pois atinge 90% de efetividade em centros especializados. 

Casos graves e agudos se correlacionam com níveis plasmáticos acima de 12 mg/ dL, geralmente causados por neoplasias avançadas. Além de tentar tratar a doença de base, deve-se prescrever hidratação vigorosa (náuseas, vômitos e poliúria causam desidratação), além de prescrever furosemida (diurético calciúrico), tomando-se o cuidado com o status de hidratação do paciente. Pensando em reduzir a reabsorção osteoclástica, pode-se prescrever calcitonina ou demais opções como bifosfonatos (atuam inibindo aos osteoclastos) por VO ou IV (clodronato, pamidronato e ácido zoledrônico). 

Tratamentos alternativos:

- Denosumabe: anticorpo monoclonal anti-RANKL (RANKL é a proteína que induz a diferenciação de osteoclastos). Vantagem: não apresenta efeito nefrotóxico igual aos bifosfonatos. 

- Glicocorticóides: apenas em casos de hipervitaminose D, sendo associado a restrição de suplementação de vitamina D e cálcio dietético. 

- Calcimiméticos (cinacalcete): mimetizam o cálcio ao se ligarem nos CaSR, assim reduzindo a secreção de PTH. 

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