O que é filosofia?
Por: William A.
01 de Abril de 2022

O que é filosofia?

Filosofia Geral


É curioso notar que a própria definição de filosofia é objeto de discussão entre os filósofos. Os físicos e biólogos não precisam discutir entre si sobre a natureza da física ou da biologia, mas os filósofos precisam. Dizer o que é a filosofia já é uma questão filosófica. Assim, diferentes pensadores podem ter diferentes concepções de filosofia. Aqui, pretendo apresentar minha própria visão da natureza da filosofia.
 

Podemos responder o que é filosofia observando a origem da palavra. Sabemos que o termo 'filosofia' deriva dos vocábulos gregos philos (amizade) e sophia (sabedoria). Literalmente, filosofia seria amizade ou apreço pela sabedoria. Mas isso não ajuda muito, pois o termo 'sabedoria' não é muito claro. Se queremos entender a filosofia em termos de interesse pela sabedoria teremos que investigar a noção de sabedoria no contexto de origem da palavra, a Grécia do século VI antes de Cristo, uma tarefa que certamente não é muito simples.
 
Apesar disso, penso que é mais fácil compreender a natureza da filosofia em termos de sua prática como disciplina acadêmica. Filosofia é estudada em escolas e universidade, logo podemos entendê-la como uma área de estudo e pesquisa. Assim, filosofia é uma disciplina como tantas outras estudadas no mundo acadêmico, mas se é uma disciplina, um ramo de estudos, o que ela estuda?
 
Essa pergunta também não é muito fácil de responder. Diferentes estudiosos oferecem diferentes respostas para ela. No meu caso, tendo a concordar com o que foi dito pelo filósofo britânico Anthony Quinton: filosofia é pensar sobre pensar [1]. Em outras palavras, filosofia seria um trabalho de reflexão no qual trabalhamos em pensamentos e ideias sobre alguma coisa.
 
Quando digo "alguma coisa" entenda qualquer coisa. Ao contrário de outras disciplinas, a filosofia não possui um domínio particular de investigação. Como podemos pensar sobre qualquer coisa, podemos pensar sobre os pensamentos que temos a respeito de qualquer coisa. Por essa razão podemos ter uma filosofia sobre qualquer tema. Daí temos campos como filosofia da ciência, da religião, da arte, da educação, da política e até mesmo da própria filosofia. Por isso entender o que é filosofia também é uma questão filosófica, afinal, podemos ter ideias a respeito da filosofia e essas ideias podem ser examinadas.
 
Isso torna a filosofia uma disciplina de segunda ordem. Uma disciplina de primeira ordem estabelece os pensamentos sobre o domínio de interesse. Já uma disciplina de segunda ordem estabelece os pensamentos sobre esses pensamentos. O trabalho filosófico, portanto, envolve esse processo de reflexão no qual as ideias e pensamentos são avaliados, examinados e revistos.
 
Na prática acadêmica, a filosofia também separa seus estudos em várias áreas. Os filósofos sugerem divisões diversas. Pessoalmente, creio que as questões abordadas em estudos filosóficos podem ser separadas em três campos principais: metafísica, epistemologia e axiologia.
 
A metafísica é a área da filosofia que estuda ideias relacionadas aos fundamentos da realidade, as noções necessárias para entender o mundo como ele é. Isso inclui questões sobre os tipos de coisas que existem (como objetos materiais, objetos imateriais, Deus, espaço, tempo e pessoas) e em que sentido elas existem. Se somos parte da realidade, nossa própria realidade também é investigada e isso inclui entender que tipo de coisas nós somos (seres materiais? Imateriais? Os dois?), bem como entender nossa relação com o mundo (somos realmente livres para agir no mundo? Temos um propósito nesse mundo?).
 
A epistemologia é a área da filosofia interessada em estudar ideias relacionadas ao conhecimento. A palavra “epistemologia” significa justamente estudo do conhecimento. Isso inclui compreender o que é o conhecimento, os tipos de conhecimento que há, como nossas crenças se tornam conhecimento sobre as coisas e se obter conhecimento é mesmo possível.
 
A axiologia é a área da filosofia que estuda valores. Atribuímos valor a tudo, de objetos e pessoas a crenças e ações. Podemos, então, separa a axiologia em várias subáreas que se ocupam, cada uma, de um tipo de valor. A ética, por exemplo, é a parte da axiologia que se interessa por nossas ideias sobre valores morais, ou seja, aquilo que determina quais ações devem ser realizadas, o que é certo fazer ou o que é bom. A estética é um outro campo da axiologia, mas preocupado com valores sensíveis, ou seja, aquilo que determina nossas preferências e gostos, o que torna uma experiência mais desejável do que outra, como beleza, elegância e graça. 
 
É importante dizer que essas áreas não estão isoladas. É possível pensar em questões de metafísica na axiologia quando nos perguntamos sobre o tipo de coisa que os valores são. Semelhantemente, podemos perguntar questões axiológicas na epistemologia quando investigamos o que é valorizado na aceitação de uma crença como verdadeira. A epistemologia também pode aparecer na metafísica quando examinamos como podemos obter conhecimento sobre os aspectos fundamentais da realidade.
 
Além da separação de suas questões nessas três frentes, a filosofia possui seus próprios métodos, como já falado. Por se tratar principalmente de um estudo de ideias, a filosofia não emprega um método empírico, não exige experimentos ou dados experimentais como ocorre na física ou na química. Sua metodologia é mais próxima das disciplinas puramente teóricas como a matemática, embora a filosofia seja diferente da matemática em seu conteúdo. Matemáticos se preocupam com objetos abstratos específicos, como números e funções, enquanto filósofos se preocupam com ideias e pensamentos em geral. 
 
Novamente, também não há unanimidade entre os filósofos sobre qual metodologia deve ser empregada na reflexão filosófica. Mais uma vez, vou apresentar minha preferência, a saber, uma metodologia envolvendo uma etapa elucidativa e uma etapa argumentativa [2].
 
Temos uma etapa elucidativa na medida em que filósofos tentam expor claramente noções e conceitos. Uma boa parte do esforço filosófico consiste em deixar claro o que queremos dizer com nossas ideias. Apresentamos nossos pensamentos por meio de uma linguagem e, por vezes, muito do que pensamos ser um problema filosófico pode ser solucionado esclarecendo os conceitos que usamos, eliminando ambiguidades e vagueza. Filósofos como Ludwig Wittgenstein acreditavam que o trabalho da filosofia é justamente corrigir essas dificuldades da nossa linguagem. Para ele, problemas filosóficos só aparecem quando a linguagem sai de férias [3]. Não obstante, penso que há mais na filosofia do que apenas exame conceitual e linguístico. Se pretendemos que nossas crenças e ideias sejam verdadeiras, precisamos dar boas razões para isso.
 
Aqui entra a metodologia argumentativa da filosofia. Apresentar um argumento é mostrar se uma certa declaração é uma conclusão que se segue de outras declarações tomadas como premissas. Se a ideia declarada se segue quando certas premissas são admitidas, então temos uma razão para admitir essa ideia como verdadeira. Elaborar argumentos exige a aplicação da lógica, uma disciplina dedicada a estudar como um pensamento se segue de outros. É uma disciplina tão importante que alguns autores a consideram uma área da filosofia. Pessoalmente, discordo disso. Penso que a lógica já é uma disciplina autônoma, inclusive empregada em áreas fora da filosofia, como matemática e computação, mas seu papel na filosofia é indubitavelmente importante, pois apenas compreendendo o raciocínio lógico por trás do encadeamento de nossas ideias é que podemos oferecer razões adequadas para sustentá-las. Também é por meio do raciocínio lógico que podemos apontar os problemas nos pensamentos e ideias que não concordamos. Assim, o debate filosófico se dá em uma arena que possui a lógica como principal árbitro.
 
A filosofia, portanto, é uma atividade racional que busca estudar criticamente ideias e pensamentos sobre todas as coisas. Penso que essa é uma definição de filosofia apropriada e, por enquanto, é a visão que tenho endossado. Como falado, outros autores podem apresentar suas próprias concepções. Sendo sincero, o melhor modo de compreender o que a filosofia é seria estudando por si mesmos os problemas filosóficos e como os diversos filósofos na história tentaram resolvê-los. A partir disso, o leitor poderá desenvolver sua própria concepção de filosofia e decidir por si mesmo se concorda ou discorda da visão que apresentei aqui.
 
Notas
 
[1] QUINTON, Anthony. Philosophy. In: HONDERICH, Ted (ed.), The Oxford Companion to Philosophy, Segunda Edição, Oxford: Oxford University Press, 2005, p. 702.
 
[2] Sigo aqui BAKER, Ann. Introdução ao Pensamento Filosófico. In: BONJOUR, Laurence; BAKER, Ann (eds.), Filosofia: Textos Fundamentais Comentados, Porto Alegre: Artmed, 2010, pp 23-39.
 
[3] WITTGENSTEIN, Ludwig. Investigações Filosóficas. Tradução de José Carlos Bruni. In: Coleção Os Pensadores, São Paulo: Abril Cultural, 1999, p. 42.
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