Sabemos realmente o que á Ética e Moral?
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Por: Francisco S.
16 de Agosto de 2020

Sabemos realmente o que á Ética e Moral?

Por que os cursos universitários de graduação e pós-graduação não formam com competência ética?

Filosofia Geral Profissional

A resposta é simples e direta: Porque não interessa e custa!

Com exceção do curso de filosofia, em que a disciplina de ética e moral faz parte da grade curricular e é explicada com mais profundidade, os demais cursos existentes no país deixam de lado essa disciplina pois querem formar pessoas para o mercado e nada mais.

Todos os cursos que pesquisei, fora filosofia, tanto em graduação: bacharelado, licenciatura e tecnólogo, como em pós-graduação de qualquer área. Focam no saber prático utilitarista e as disciplinas de ética e moral são, na verdade, uma análise dos códigos morais, os quais chamam de ética, da categoria do curso em questão.

Ética médica, ética em educação física, ética em engenharia, ética no direito, ética na pedagogia, ética na administração, ética... ética... e ética. Tudo isso, na verdade, não é ética. Os cursos são tão deficientes que chamam as “regras de condutas” de determinada formação/profissão de “ética” quando se trata de regras morais.
 
Não há como conceber conceitos éticos para um determinado curso em si. A ética trata do bem comum com viés universal. O que essas cursos querem, é mostrar o conceito de moral (condutas), que é particular com viés específicos para a categoria que o curso abrange: administração, engenharia, medicina etc. É como querer dizer que o médico é mais ético que o engenheiro, que o advogado, que o pedagogo e assim por diante. Isso é uma sandice sem tamanho e lugar.
 
Assim, quando você vê em um curso de graduação e/ou pós graduação, a disciplina “Ética em enfermagem” por exemplo, na verdade o discente vai estudar o que o código de conduta (moral) desta categoria prevê como regras a serem seguidas. Nada mais que isso. Não se estuda por exemplo: por que devemos cuidar do outro? Como se desenvolve o processo de alteridade? Por que e para que devo querer ser bem sucedido? Para que eu existo? Quem devo colocar na UTI com respirador, se só tenho uma vaga e dez pacientes precisando?
 

Origem do Problema

Em 1964, com a ditadura militar, foi retirado do ensino público os cursos de Filosofia e Sociologia por eles criarem um pensamento crítico e não alienado. Com a retirada do curso de filosofia, saiu também a disciplina de ética e moral. Em 1969, o governo percebeu esse problema e criou a Educação Moral e Cívica, informando que ela substituía o ensino da ética e moral. Na verdade, essa disciplina apenas queria adestrar as pessoas a serem bons cidadãos para que não questionassem as determinações e permanecessem alienados. Hoje percebemos a consequência nefasta desta decisão.
 

Além disso, incutiram nas cabeças dos discentes que: os valores familiares, valores religiosos e valores cívicos era repertório suficiente para criar uma sociedade mais justa, equânime, imparcial e portanto virtuosa (ética). Ledo engano. Nos tornamos pessoas, na sua maioria, com a síndrome da lei de Gerson, ou seja, um desejo desumano de levar vantagem em tudo. Em época de pandemia global, roubamos respiradores necessários para salvar vidas.

Somente em 2004, o então ministro da Educação Fernando Haddad, estabeleceu um marco para a volta da Filosofia e Sociologia no ensino público. De lá para cá não conseguimos evoluir nessa desejável e urgente volta. Até hoje, tanto a filosofia como a sociologia são optativas nos cursos. Como optar por algo que você não conhece? É assim que os discentes têm que agir.

Assim, passados 51 anos após a retirada do estudo estruturado da ética e moral, continuamos sem aprender a importância desses temas para nos tornarmos seres humanos melhores. Uma tragédia.

Nós brasileiros, somos um povo sem nenhuma postura ética e moral genuínas. Achamos que nossos valores familiares resolvem tudo, como se as famílias fossem o centro da virtude. Somos religiosos mas não praticamos nada que os códigos de conduta de nossa religião estabelecem. (Bíblia, Alcorão, Torá etc.)
 

Nesse tempo todo, podemos dizer que perdemos uma geração toda. A falta do estudo da ética e moral, deu lugar ao estudo superficial dos códigos de condutas das profissões (formações) específicas que, sem estudar ética, fazem pouco ou nada de sentido para o discente. É mais um monte de regras que ele vai ver mesmo, quando quebra uma ou mais.

 
Em resumo: continuamos ignorantes do ponto de vista da ética e da moral.
 

Pior ainda, como o ser humano discente acha que os valores familiares, valores religiosos e valores cívicos, o supre do conhecimento da ética e moral, não dá importância alguma a esse estudo. O que recebe das universidades já está de bom tamanho. O importante é ter sucesso e vencer no mercado, não é mesmo?

 
Os predadores do mercado
 
Aproveitando essa visão distorcida dos discentes, as universidades públicas e privadas dos diversos cursos de graduação e pós-graduação existentes (exceto Filosofia), não investiram nada nessa formação mais virtuosa. Como eu disse, apenas colocam as regras morais (que chamam de ética) para o conhecimento dos estudantes.
 
Fizeram isso por dois motivos básicos: faltam filósofos para ensinar as disciplinas, ou seja, durante esses 51 anos poucos filósofos se formaram, até por que não existia mercado para eles trabalharem, e também por que as universidades foram para o caminho de formarem predadores, gente de sucesso, gente que se dá bem em tudo e assim por diante. Sem mostrar de forma mais profunda o que é sucesso no mundo contemporâneo, visto aos olhos da ética e da moral.
 
Na verdade, as universidades são as predadoras pois buscam o caminho mais fácil no mundo competitivo. Vendem uma formação rápida com matérias que servem para o mercado. Por exemplo: uma das competências que são avaliadas para o discente escolher uma universidade é a pegada da qual ela solta o egresso no mercado. Todas fazem isso e só isso. Na área de administração/Gestão, as universidades são avaliadas, pelos discentes, por: Universidade tal, o egresso sai com uma pegada mais de finanças, em outra, mais de gestão de projetos, em outra ainda, mais de economia, e assim por diante. Você não vê nenhuma universidade divulgando que seus egressos saem com um conhecimento ético e moral que pode fazer diferença no mercado, criando relações mais justas, inspiradoras e ética e morais. Não existe nenhuma universidade de primeira linha que faça isso. Nem de segunda, terceira etc.
 
Eu cheguei a dar aulas de ética e moral para quatorze MBA’s de uma universidade de primeira linha, onde a carga horária máxima, da disciplina para esses MBA’s, era de 4 horas. Para um total de 360 horas/MBA, essas quatro horas representam 1,1% do volume de cada um. Como alguém pode aprender ética e moral em 4 horas?
 
O ensino da ética e moral de forma estruturada
 

A ética e moral iniciam sua trajetória de forma mais contundente com o trio: Sócrates, Platão e Aristóteles. Para os estudiosos, há alguns conceitos importantes com os pré-socráticos, mas vamos deixar isso para outro dia. São mais de 2.500 anos que estes temas permeiam a vida do ser humano. Pelo menos no ocidente.

Passamos pelo medievo, modernidade, pós-modernidade e contemporaneidade. Vários são os filósofos que desenvolveram diversos tratados e escritos sobre os temas durante todo esse período: Agostinho, Espinosa, Tomás de Aquino, Hume, Kant, Descartes, Nietzsche e tantos outros.

Os conceitos se ajustaram com o tempo e as restrições a época, mas nunca perderam o fio condutor de que:

  • Ética: trata do bem/mal com viés universal

  • Moral: trata do certo/errado com viés singular

Sou um estudioso contumaz da ética e moral. A filosofia entrou na minha vida de forma tardia e nunca mais saiu. Meus conhecimentos anteriores são na área de negócios e gestão com uma longa experiência em corporações. Hoje tenho um consultoria especializada na implantação da Cultura Ética e Moral nas organizações. Depois de tanto tempo, entendi que a Ética e Moral são a gênese de tudo dentro de uma organização. Quando vira cultura, quase todos os problemas desaparecem. Demorei para entender isso. Além dessas atividades, sou professor de ética e moral para graduação e pós-graduação. Quando falo que as universidades não dão atenção para esses temas, falo por experiência própria.

Um curso básico de ética e moral, ministrado por mim em empresas e EaD, tem no mínimo 80 horas. Com a evolução dos questionamentos e reflexão, chegamos a um total de 400 horas. Mais que a carga horária de um MBA. É 100 vezes mais que a maioria das universidades dos cursos de graduação e pós-graduação dedicam aos temas (exceto Filosofia como sempre). Mesmo Filosofia não se dedica tanto, quando não é uma especialização, mestrado ou doutorado.
 
Para que tudo isso: para entender o ser humano de forma integral, pois a única evolução possível é essa, o resto é acumular bens.
 

Os caminhos são difíceis e lentos

Não há, na minha análise, solução de curto prazo e rápida. São necessários investimentos profundos em educação, é necessário colocar ética e moral como pano de fundo de todos cursos, disciplinas e matérias, e é necessário esperar as futuras gerações. Se você quer fazer isso para ver acontecer agora, esqueça. Seu tempo acabou. Mesmo assim, plante tâmaras.
 
É muito comum um ser humano ir para o exterior, principalmente na Europa, e voltar falando que deixou sua bolsa/carteira em um banco de um parque e, quando voltou uma hora depois, a bolsa estava lá, intacta. O ser humano elogia isso e fala: “Por que no Brasil não é assim?”. A resposta é simples: porque não estudamos ética e moral de forma estruturada e acreditamos que os valores familiares, valores religiosos e valores cívicos são suficientes. Nosso espanto mostra que não são e nunca foram.
Com tudo isso, não devemos jogar a toalha. Se queremos que nossos descendentes sejam éticos e morais, temos que criar oportunidades para eles. Algumas coisas pontuais devemos fazer:
  • Devemos dedicar um tempo para estudar os clássicos da ética e moral;

  • Devemos assumir o que chamo de postura ética: um exame permanente das minhas ações com o outro, em relação a fazer ou deixar de fazer o bem e o mal;

  • Devemos exigir que as escolas de nossos filhos: infantil, fundamental, médio e superior, ensinem ética e moral, com professores formados em filosofia, com carga horária adequada e profunda;

  • Devemos exigir que as organizações que trabalhamos sejam éticas e morais e discutam esses temas em relação as ações do dia a dia;

  • Devemos exigir que os políticos (aqui o mais difícil) concebam leis que punam com mais rigor atos antiéticos e imorais de quem quer que seja;

  • Devemos ser radicais com quem não é ético e não age moralmente. Seja quem for: família, parentes, amigos, vizinhos etc.

Tenho certeza de que, o ensino da ética e moral deve começar pela base, ou seja, na educação infantil, fundamental I e II e ensino médio. Começar depois já é muito tarde. Um dos cursos superiores que mais cresce na Europa é a Filosofia para Crianças (formam professores para ensinar filosofia). Sim é possível e os resultados são extraordinários. Começar com a base, ganhamos tempo na formação superior. Os jovens já vêm sabendo os conceitos fundamentais da filosofia para a compreensão da vida. As crianças têm menos preconceito com tudo que existe e, por isso, são mais abertas ao novo, a evolução. O caminho será mais suave e genuíno.

Enfim, percorrer essa trajetória é complexo e só vale a pena aos seres humanos que não têm alma pequena. Você será mais criticado do que amado. O dia que você for mais amado defendendo a ética e moral, é porque esses temas venceram.
 
Esqueça os políticos. Tenha a ética e moral como “mito” e não as pessoas. A ética não é de esquerda, direita ou centro. A ética é sua evolução.
 
Tratar o outro como você gostaria de ser tratado, não é uma atitude ética. É uma atitude egoísta. O certo é tratar o outro como ELE gostaria de ser tratado. Isso sim é ético. Pense nisso e comece a conhecer esses temas. Afinal, seus filhos aprenderão ética e moral com você ou com Aristóteles?
Francisco S.
Francisco S.
São Paulo / SP
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MBA: Gestão escolar e Coordenação pedagógica (ESALQ - USP)
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Sou especialista em desenvolver competências éticas e morais. Me dedico há 16 anos ao estudo sistemático desses temas.

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