POPULISMO ILIBERAL: HISTÓRIA E ELEIÇÕES 2014
Por: Edison M.
30 de Maio de 2015

POPULISMO ILIBERAL: HISTÓRIA E ELEIÇÕES 2014

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POPULISMO ILIBERAL: HISTÓRIA E ELEIÇÕES 2014[1]

No dia 14 de maio de 2000, há mais de 14 anos, o jornal Folha de São Paulo publicou no seu caderno de domingo uma matéria de quatro páginas intitulada “América Latina não está satisfeita com a democracia”. Segundo a reportagem na época menos de 40% dos latino-americanos demonstravam apreço pelos valores democráticos.

A distancia de mais de uma década fica fácil explicar o que estava acontecendo, e as escolhas que ocorreram de lá pra cá no continente americano e no Brasil. Vamos realizar uma rápido trabalho de recapitulação, passando pela época da reportagem (2000), até chegarmos ao momento presente (2014) refletindo: como o católico, o cristão, o homem de boa vontade deve reagir perante a realidade política que nos envolve.

1964-1984: ditaduras militares que contavam com a simpatia mais ou menos aberta dos EUA começaram a pulular pelo continente. Violações sistemáticas dos direitos humanos ocorriam, mas o publico em geral pouco ficou sabendo disso devido a censura das mídias. Os dissidentes e opositores que não foram mortos eram perseguidos, torturados e partiam para o exílio.

O clero católico se dividiu: alguns apoiaram entusiasticamente os novos regimes em seus países, outros engrossaram as fileiras da oposição chegando alguns ao extremo de endossar a luta armada na resistência às ditaduras, mas a grande maioria ficou ao largo desse debate, preocupada com a pastoralidade e menos com a política, entendida já nessa época como campo de atuação dos leigos no mundo[2]. Eram os anos do Concílio Vaticano II (1962-1965) e a palavra de ordem do momento era a “modernização na Igreja – aggiornamento”.

No Brasil o PCB (Partido Comunista Brasileiro) ainda na década anterior e inspirada pela “abertura política” do premiê Nikita Kruschev (1953-1963) decide apoiar iniciativas não violentas para almejar a tomada do poder. A “opção revolucionária de tomada do poder pelas armas”, como ocorrera em 1917 na URSS, em Cuba em 1959 e na Argélia em 1962 não era mais apontada como adequada ao país.

É nessa época que a UNE (União Nacional dos Estudantes) lança o projeto dos CPCs (Centros Populares de Cultura). A idéia era recrutar jovens e talentosos artistas para começar a produzir uma cultura de massas de forte apelo popular e, a partir desse meio, divulgar a mensagem libertária socialista. Nascia a MPB (Música Popular Brasileira), o Teatro de Arena, entre outras iniciativas que contaram com o patrocínio do PCB e da UNE. Tudo dentro de um contexto maior: o chamado Nacional-Popular. Na frase do crítico Zuenir Ventura, nesse momento: “Nos templos da cultura burguesa (teatro, cinema, clubes, casas de espetáculo) a esquerda dá o tom”.

Graças a conjunção de fatores como ditadura militar e censura, de um lado, e artistas engajados de outro, uma geração extremamente talentosa surgiu: Geraldo Vandré, Vianinha, Chico Buarque de Holanda, Edu Lobo, e depois Milton Nascimento (engajado, apesar de seu rótulo de alienado), o Clube da Esquina (Fernando Brant, Márcio Borges, Lô Borges), e somado a tudo isso o Tropicalismo de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria Betânia, Gal Costa, Os Mutantes (Rita Lee, Roberto de Carvalho)... A lista é gigantesca! (Quando vejo os católicos reclamando no Facebook, What’sApp e similares da cultura anticristã que grassa pela mídia é preciso lembrar que esse trabalho de conscientização de classe vem de mais de 50 anos atrás, não surgiu da noite para o dia. Contra culturar a contracultura levará no mínimo outro tanto...).

Essa resistência durou até o retorno dos exilados ao Brasil em 1979 com a Lei da Anistia. A partir daí veio a redemocratização (1985), a constituição (1988) e as eleições diretas para presidente (1989). Processos similares ocorriam em outros países, por exemplo Argentina (1976-1983), Chile (1973-1988), Paraguai (1954-1989), Uruguai (1973-1985).

Como o leitor pode facilmente imaginar, os anos 1980 mesclaram sentimentos diversos. De um lado um sentimento de revanchismo contra os militares e a direita em geral expressa nas novas constituições que surgiram; de outro lado o contexto global de crise econômica, inflação e desemprego, violência urbana e exclusão social, as cidades latino-americanas inchadas e desprovidas de serviços de mínima qualidade... Tudo isso criava um clima de ansiedade e impaciência em vastos setores das sociedades latino-americanas, em especial entre os menos favorecidos. Os jovens regimes democráticos seriam rapidamente testados em sua capacidade de responder aos anseios de todos.

1985-2000:

A conjuntura crise econômica, inflação e desemprego deixou um alto preço às jovens democracias latino-americanas: os anos 1980 ficam conhecidos por aqui como “A Década Perdida”.

No Brasil os governos Sarney e Collor deixaram a má impressão de que a democracia, tão duramente conquistada não valia a pena. Uma novela ficou muito popular nestes anos: Vale tudo. Nela, o vilão (Reginaldo Farias) na cena final foge do país com a mala cheia de dinheiro e “dando uma banana aos telespectadores”. Era o epílogo da velha frase dos tempos da ditadura: Brasil: ame-o ou deixe-o. Milhares decidiram abandonar o Brasil. Outro filme de muito sucesso desses anos foi “Terra estrangeira”, de Valter Salles. Morar no exterior era a norma nesses anos. Era a época em que muitos brasileiros emigram do país para os EUA (o fenômeno Governador Valadares-MG), a Europa e o Japão (os Dekasseguis), formando enormes comunidades de brasileiros no exterior. Oficialmente estima-se que hoje vivam três milhões de brasileiros fora do país, homenageados periodicamente pelas “Brazilian Day”, festivais organizados pela Rede Globo.

A década seguinte é impactada pela crise do comunismo soviético (1991) e, no Brasil, pela renúncia do Presidente Collor (1992). Cresce o consenso de que era necessário abandonar o modelo de Estado intervencionista e estatizado, marca no Brasil desde os anos 1930, e passar a investir em um novo modelo, de Estado Mínimo, com concessões á empresas serviços como telefonia, estradas, portos, de um lado, e cortes de pessoal e gastos públicos de outro. Era a chamada Doutrina Neoliberal. O chamado Neoliberalismo, nascido ainda nos anos 1980 nos governos da 1ª Ministra Margaret Thatcher (Inglaterra, 1979) e Ronald Reagan (EUA, 1980) havia desembarcado no continente latino-americano e tornara-se um consenso.

O vice-presidente de Collor, Itamar Franco (1992-1994) montou uma equipe econômica com a missão de debelar a crise econômica e social. Nela destacava-se o sociólogo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), eleito em 1994 presidente do Brasil. Ainda em 1993 nascia o Plano Real, que conseguiu algo que parecia impossível desde os anos 1970: controlar a inflação.

2001-2014:

O momento da reportagem da “Folha” (14/05/2000) já revelava o desgaste do modelo neoliberal: os ajustes macroeconômicos vinham acompanhados de recessão e desemprego. Ok, já não havia inflação alta, mas o descontentamento popular era grande. A esquerda latino-americana, após o refluxo provocado pela queda da ex-URSS, aos poucos ia percebendo que havia espaço para voltar a crescer. Até mesmo um órgão extra-oficial de troca de informações havia sido criado para esse fim: o chamado Foro de São Paulo (1991), da qual nunca se confirmou oficialmente a existência. Mas ele existe.

No caso especifico do Brasil, o partido da chamada nova esquerda, o Partido dos Trabalhadores (PT), surgido em 1980 como uma opção mais moderna ao velho PCB congregando intelectuais (da USP especialmente[3]) e profissionais liberais; líderes de movimentos sociais e associações de bairro; e principalmente católicos e alguns protestantes (em particular da IECLB – Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil) ligados a linha de atuação da chamada Igreja Popular, após sucessivas derrotas eleitorais para a presidência (1989-1994-1998) decidem mudar de tática e renovar o discurso político a fim de angariar mais votos, acalmar os empresários e finalmente eleger um presidente da república. O candidato seria o seu presidente de honra, cuja história de vida era considerada um exemplo de superação: Lula.

O governo Lula (2002-2010) representou a vitória da esquerda na América Latina, seguida de outros governos ideologicamente semelhantes: Argentina (Nestor e Cristina Kirchner); Uruguai (Mujica); Paraguai (Lugo); Bolívia (Evo Morales); Venezuela (Hugo Chaves). O caso venezuelano ainda hoje é apontado como um modelo a ser seguido por todos, em particular devido ao forte aparelhamento ideológico do Estado, os programas sociais financiados pelo petróleo, e a fuga em massa dos dissidentes para Miami.

A reportagem da Folha de 2000 era profética ao alertar que os governos latino-americanos no séc. XXI estariam alicerçados em dois pontos: seriam uma releitura dos populismos dos anos 1930-1940 (governos autocráticos centrados em figuras carismáticas) e, assim como seus antecessores, estariam tentados a atropelar a democracia em nome de um bem ou verdade maiores: o “povo”, o partido, a nação, o “pobre”. Claro que aqui o povo e o pobre estariam confundidos com os “esclarecidos”, ou seja, apenas seriam identificados como povo e pobre a partir do momento em que demonstrassem apreço ao pensamento do governo ou dos movimentos sociais e partidos políticos apresentados como seus representantes[4].

O panorama atual (2014):

O cristão, o homem de boa vontade, ao ver esse panorama deve se perguntar: “Mas e agora a menos de duas semanas das eleições (05/10/2014)? O que faço com meu voto?”.

Fiz mais ou menos essa pergunta a Pe. Lodi, um sacerdote de Goiania-GO que há duas décadas luta contra o aborto. Na sua conferencia ele praticamente excluiu a possibilidade do católico votar em Dilma (PT) e Marina Silva (PSB) devido ao programa dos dois partidos contemplar agendas progressistas (aborto, união homo-afetiva, descriminalização de drogas) e apontou o voto em Aécio Neves (PSDB) como a única solução viável para o primeiro turno (05/10/2014) devido ao fato do partido não deixar essa opção “liberal-afetiva-sexual-comportamental-moral-doutrinal” clara como os demais partidos. Aí eu perguntei a ele no intervalo: “Mas Pe. Lodi, como fica a liberdade do católico em política?”. “Como pastor eu tenho o dever de orientar os católicos. Quem quiser ser coerente com a religião não pode votar nesses candidatos”.

Aí eu voltei à carga e perguntei: “Mas padre, e se sobrar Dilma e Marina no segundo turno, como apontam as pesquisas? Em quem votar?”. “Aí fica difícil escolher”, ele me respondeu.

Antes que alguém invada minha conta no Facebook e WhatsApp e a lote de xingamentos, é preciso reiterar que de fato a doutrina cristã desaconselha apoiar tais iniciativas como descriminalização do aborto e das drogas ilícitas. Obviamente isso não vale para quem esteja fora da Igreja ou não concorde com seus ensinamentos. Mas, a partir do momento em que a pessoa queira ser coerente com essa doutrina, precisa pensar em termos de moralidade–vida social–vida civil. Mas o papel do cristão neste mundo seria qual? A política do cristão se resumiria apenas a isso: ver desdobramentos da moral na política, ou haveria mais coisas?

Nestes dias a Arquidiocese de São Paulo distribuiu um folheto onde pede serenidade e calma ao católico escolher seus candidatos:

http://www.arquidiocesedesaopaulo.org.br/elei%C3%A7%C3%B5es-2014-orienta%C3%A7%C3%B5es-para-comunidades-cat%C3%B3licas-da-arquidiocese-de-s%C3%A3o-paulo-0

O folheto lembra que não basta votar em presidente da república bem, mas lembra que precisamos escolher bem candidatos a governador, senador, deputado federal e estadual. O folheto lembra quais questões devem ser refletidas pelo católico coerente com sua fé na hora de votar:

Promoção do bem estar; Educação; Saúde; Moradia digna; Trabalho e remuneração justa; Saneamento básico; Respeito pela vida (nascituro em qualquer estágio do desenvolvimento embrionário e até o final da infância); Respeito pela dignidade humana (doentes, deficientes, idosos); Combate a violência; Proteção e promoção da família e do casamento (Heterossexual, com ou sem filhos. Respeito pelos ritmos naturais e biológicos da concepção humana); Justiça e solidariedade social; Respeito a natureza e ao ambiente de vida. (os comentários entre parêntesis foram acrescentados por mim para fins didáticos).

Para cada um dos candidatos é necessário aplicar esses critérios. Se você, amigo cristão, apenas usar o critério do não-voto em abortista, só contemplará as linhas em itálico deixando de fora outros aspectos também importantes. Um amigo meu, bom católico e economista semanas atrás já havia me alertado para isso. Em suas palavras:

“Amigos do Face, vamos ENRIQUECER O DEBATE POLÍTICO, aqui vão uma idéias para clarear:

1)       Quem do grupo do G3 (Dilma-Marina-Aécio) vai ter coragem de prometer a redução de ministérios?

2)       Quem do grupo do G3 vai admitir que o ano de 2015 vá ser difícil e o Brasil só crescerá se o mundo exterior crescer - e muito !!?

3)       Qual a alternativa que os candidatos apresentam para crescer o país, se o povo esta endividado e não responde mais por estímulos ao credito, nem redução por impostos?

4)       Qual dos candidatos vai admitir que a taxa de juros NÃO É PARA COMBATER A INFLAÇÃO, mas para que o mercado financeiro (Bancos) emprestem dinheiro para o governo?

5)       Quando a LUCIANA GENRO vai continuar misturando NEGROS E HOMOSSEXUAIS? Ser negro é ETNIA !!!! Homossexualismo é COMPORTAMENTO?

6)       A ÚLTIMA VAI PARA A IMPRENSA: O povo está preocupado com a MANUTENÇÃO DE EMPREGOS, com a SAÚDE, com a EDUCAÇÃO, e com um PAÍS MAIS SEGURO, porque os jornalistas ESTABELECERAM COMO FILTRO que o candidato deve PRIMEIRO ATENDER À CAUSA GAY, DEPOIS O RESTO? (sim, porque Marina foi bombardeada - no Jornal da Globo - com três ou quatro perguntas seguidas sobre "casamento gay", não dando tempo ao que realmente interessa à maioria esmagadora do povo, mas a imprensa PREFERE MILITAR PELA CAUSA GAY, mesmo que o país na saúde, na educação e no emprego, caminhe para a...!!!)”.

Como podem notar, ele soube mesclar bem os diversos aspectos que devem ser refletidos por nós, católicos com direito de voto. E assim todos nós deveríamos fazer, porque “o católico tem os pés no chão e a cabeça no céu”. (S. Josemaría Escrivá).

Reino de Deus, Santidade, Doutrina Social da Igreja: o cristão em movimento!

Quando lemos a vida de Chiara Luce Badano vemos que sua lenta agonia pelo câncer a levou a se aproximar muito de Deus, a ponto de ela desejar morrer logo para ver Deus face a face. Mas isso não a impediu de se apiedar dos dramas do mundo. Hospitalizada entre os anos de 1989-1990, ela acompanhou e rezou pelos grandes acontecimentos do período: o fim da URSS, o Massacre da Praça da Paz Celestial (Pequim, China), a invasão do Kuwait pelo Iraque de Saddam Hussein, a copa do mundo na Itália...

Parafraseando Jean Daniélou, o cristão que busca e atinge a santidade move-se pelo mundo mas não é do mundo, almeja o Céu. Sua freqüência aos sacramentos o leva a ter uma visão sobrenatural da História Humana e da História da Igreja Católica. Para o cristão (não ouso usar o termo SANTO porque aqui neste mundo ainda somos todos pecadores), os fatos históricos ganham uma nova perspectiva, recebem o seu verdadeiro peso. O cristão que atinge a santidade é um profundo realista: vê tudo pela perspectiva divina. Nas palavras de São Josemaría Escrivá:

“O mundo nos espera. Sim! Amamos apaixonadamente este mundo porque Deus assim no-lo ensinou: "Sic Deus dilexit mundum..." - tanto amou Deus o mundo -; e porque é o lugar do nosso campo de batalha - uma formosíssima guerra de caridade -, para que todos alcancemos a paz que Cristo veio instaurar. (Ponto 290 - de Sulco : CAPITULO CIDADANIA)”.

E mais adiante:

“Não é verdade que haja oposição entre ser bom católico e servir fielmente a sociedade civil. Assim como não há razão para que a Igreja e o Estado entrem em choque, no exercício legítimo da sua autoridade respectiva, voltados para a missão que Deus lhes confiou. Mentem - isso mesmo: mentem! os que afirmam o contrário. São os mesmos que, em aras de uma falsa liberdade, quereriam “amavelmente” que nós, os católicos, voltássemos às catacumbas (Ponto 301 de SULCO, capítulo: CIDADANIA)”.

O cristão não é um lunático que sonha acordado. A vida sacramental o leva a se apiedar das mazelas humanas, e a agir para remediá-las. Digo remediá-las porque o cristão é realista: ele sabe que o mal pode ser diminuído mas infelizmente não será eliminado, pois seguindo a doutrina de sua Igreja ele entende que o pecado e o inspirador do pecado, o Demônio, fazem os homens errar. Mas por outro lado o cristão crê que Deus permite esse mal e chega a tirar até um bem dele. Mas o mal definitivamente só será eliminado após a escatologia, o apocalipse, o final dos tempos e da História.

Aqui o cristão diverge claramente dos socialistas e marxistas ao reconhecer que qualquer solução neste mundo nunca será definitiva: a dor, o mal, o sofrimento, a miséria, em resumo, a desigualdade são companheiras do ser humano. Negar isso é ser irrealista, é construir o castelo de cristal nas nuvens, do mesmo modo que Marx criticava Hegel ele (Marx) montou um castelo (sua teoria filosófico-sociológico-política) descolada do mundo.

A redenção do homem para Marx realiza-se na terra. Mas para o cristão a Redenção será realizada no Céu. Chiara Luce Badano sabia disso. Além dela Aléxia González, Montse Grases, Teresa de Lisieux, Bernadete Soubirous também sabiam. Muitos militantes políticos ainda não sabem dessas coisas, provavelmente porque ninguém teve a paciência e a preparação remota para explicar a eles essas coisas. E que coisas são essas que fazem o cristão pensar na política e demais coisas terrestres sem esquecer da sua missão sobrenatural? É o que se chama, desde 1891, de DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA.

Criada pelo papa Leão XIII a partir da encíclica Rerum novarum, a doutrina social da Igreja quer orientar os cristãos para que atuem no mundo a fim de mitigar as misérias e sofrimentos humanos, mas sempre tendo como ponto de partida a doutrina católica. Ao longo destes anos os sucessivos papas publicaram diversas encíclicas sociais. Segue abaixo uma curta lista de documentos que todo católico deveria ler para se inteirar do seu papel neste mundo criado por Deus:

_ Rerum novarum - Leão XIII (1891)

_ Quadragesimo anno - Pio XI (1931)

_ Humani generis – Pio XII (1950)

_ Mater et magistra - João XXIII (1961)

_ Pacem in terris - João XXIII (1963)

_ Populorum Progressio - Paulo VI (1967)

_ Octogesima adveniens - Paulo VI (1971)

_ Laborem exercens - João Paulo II (1981)

_ Centesimus annus - João Paulo II (1991)

_ Caritas in veritate - Bento XVI (2009)

Aqui vale um aviso: quando o papa fala sobre Doutrina Social da Igreja ele não trata de dogma de fé. Ele reflete a realidade à luz do Evangelho. O cristão não precisa necessariamente concordar com as colocações do papa, embora elas sejam muito bem fundamentadas. Seguem abaixo dois exemplos:

O Papa São João XXIII na sua encíclica Pacem in terris comenta que seria necessária a reforma agrária (isso mesmo!) para uma justa redistribuição de terras. Um papa defendeu a reforma agrária... e agora? É dogma de fé vestir bonés vermelhos, enxadas nos ombros e morar em barracas de lonas pretas pelas beiradas das estradas do Brasil? Não. Mas muita gente fez essa confusão e usou a palavra de um santo para justificar a criação de órgãos de reforma agrária a partir da Igreja Católica: a CPT (Comissão Pastoral da Terra) nasceu nos anos 1970 inspirada nas palavras de João XXIII e o MST (Movimento dos Sem-terra) nasceu da CPT. Mas você pode discordar, se quiser. Pode contra-argumentar que as demandas agrárias de 1963 não são as de 2014.

Bento XVI na Caritas in veritate defende a criação de um “governo mundial internacional” colocado acima dos governos nacionais. Um amigo meu, promotor de justiça e pai de família muito católico discorda frontalmente do papa: “Essa idéia é um absurdo, Minami”, ele me disse. E ele não foi expulso da Igreja por dizer disso. O papa Bento, homem muito sábio por sinal, emitiu um juízo sobre um assunto que não é dogma de fé, logo você não é obrigado a concordar. Embora de fato a anarquia na política internacional atual (2014) prove que é preciso um órgão internacional a mediar os conflitos e a ONU, hoje desmoralizada, não é mais capaz de suprir essa demanda.

O campo da política, desde que não aborde temas inegociáveis ao cristão (vida humana, família, dignidade humana, liberdade religiosa) ainda reserva um vasto campo de debate. Nesse campo é preciso ao máximo respeitar a liberdade das pessoas, por isso alerto: NÃO SE DISCUTA POLITICA NA IGREJA. A DISCUSSÃO É RESERVADA AOS LEIGOS, EXCLUSIVOS PROTAGONISTAS NESSE ASSUNTO. UM SACERDOTE QUE LEGISLE SOBRE ESSE ASSUNTO IMPINGINDO TAL OU QUAL PARTIDO OU CANDIDATO EXTRAPOLA SEUS DEVERES SACERDOTAIS.

Pe. Lodi no II Fórum das famílias fez bem ao nos alertar sobre o programa dos partidos sobre a família e a vida humana. Mas qualquer outra coisa além disso extrapolaria o limite imposto sobre a liberdade do cristão na política. Isso precisa ficar bem claro!

Haveria muito mais coisas a falar da Doutrina Social da Igreja, mas aí seria necessário outro texto, e é melhor pararmos por aqui. Encerro minhas reflexões rezando para que este simples texto ajude os jovens a votar bem.

 

Edison Minami. 21/09/2014

 

 

BIBLIOGRAFIA

O assunto Doutrina Social da Igreja demandaria livros e mais livros para o analisarmos corretamente. A lista a seguir não pretende esgotar o assunto, apenas apontar algumas direções de reflexão e indicar os livros de onde tirei as idéias para este pequeno artigo:

BEOZZO, José Oscar. A Igreja do Brasil no Concílio Vaticano II: 1959-1965. São Paulo. Paulinas: 2005

CORIASCO, Franz. 25 minutos: a vida de Chiara Luce Badano. São Paulo. Cidade Nova: 2013.

DANIÉLOU, Jean. Sobre o mistério da história: a esfera e a cruz. São Paulo. Herder: 1964.

LANGLOIS, J. Miguel Ibañes. Igreja e política. São Paulo. Quadrante: 1988.

______ Doutrina social da Igreja. Lisboa. Rei dos Livros: 1990, 2ª edição.

OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro de. Religião e dominação de classe: gênese, estrutura e função do catolicismo romanizado no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1985.

Secretariado de Pastoral (Cúria Metropolitana de São Paulo). Eleições 2014: orientações para as comunidades católicas da Arquidiocese de São Paulo. São Paulo. PUC-SP-UJUSCASP: 2014.

 

[1] Este texto nasceu da indagação de Maria Fonseca Jô e dos garotos da Comunidade Famílias Novas do Imaculado Coração de Maria, além de questionamentos colocados pelo amigo Fábio Luz Almeida. Agradeço o estímulo de todos. Quanto ás idéias contidas em diversos momentos do texto, agradeço ao cooperador do Opus Dei e debatedor incansável da família, da moral e da economia Eduardo Pereira.

[2] Em sua tese de doutoramento pela História - USP (2001) José Oscar Beozzo nos apresentou um levantamento dos bispos católicos brasileiros participantes no Vaticano II. A leitura atenta das biografias revela um dado interessante: ao contrário do que costuma apresentar a bibliografia especializada, os bispos em sua maioria estavam no centro, colocando-se separados tanto do apoio aberto ao Regime Militar quanto a oposição aberta ao mesmo. No meu ponto de vista, mais que uma suposta postura alienante dos bispos, esse alheamento em questões de política revelava uma preocupação voltada preferencialmente para a pastoral e administração das dioceses.

[3] Entre muitos destaco Sérgio Buarque de Holanda (o pai do Chico Buarque), Marilena Chauí, Florestan Fernandes, Arthur Giannotti (que hoje milita pelo PSDB). Era a nata intelectual amadurecida nos anos da ditadura querendo construir um Brasil novo, daí o prestígio que o PT ainda possui nos meios intelectuais (2014). Acrescento que outros partidos de esquerda nasceram ou ganharam adesões pelos corredores, gabinetes e CAs uspianos: P-SOL (Partido Socialismo e Liberdade); PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado), e o PCO (Partido da Causa Operária). Ao contrário do que a propaganda oficial desses partidos apregoa (a luta contra a classe média retrógrada, moralista e conservadora), é justamente entre os jovens nascidos e formados nessa mesma classe média, com famílias capazes de custear anos e anos de estudos em colégios de ponta e cursinhos pré-vestibulares caríssimos, que são recrutados seus melhores quadros, os militantes mais engajados e amadurecidos intelectualmente.

[4] Antonio Gramsci diria que o eleitor que não vota nos partidos de esquerda absorveu os valores conservadores pregados tanto pelos intelectuais tradicionais como pelos orgânicos. Intelectual orgânico, segundo Gramsci, é o intelectual que adota os valores da classe social dominante e usa seu conhecimento para defender e propagar os valores dominadores, repetindo-os exaustivamente, sejam verdadeiros ou não. Por exemplo, e fazendo analogia ao Catolicismo, um sacerdote seria um exemplo de intelectual orgânico genuíno na acepção de Gramsci. Um professor num curso de Apologética também. Gramsci insinua que o apologista (e o sacerdote) não se intimida em mentir a massa de ouvintes (no caso os fiéis católicos) em nome de um bem maior: o crescimento da fé. Quando mostrei a citação de Gramsci a um jovem católico de uma florescente comunidade leiga aqui de São Paulo, ele (que é um dos filhos do casal de fundadores) me respondeu: “Deixa ele tadinho. Tenho dó dessas pessoas (os marxistas)”.

Aqui o leitor decide: quem domina quem, quem está sendo dominado, e quem mente? Os ideólogos do partido ou um menino que procura comportar-se bem? Aqui não há espaço para debates: ou se escolhe um lado e exclui-se o outro. 

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