ENDOCRINOLOGIA | DIABETES MELLITUS
Por: Leonardo F.
01 de Janeiro de 2022

ENDOCRINOLOGIA | DIABETES MELLITUS

DIRETRIZES NACIONAIS DE DIABETES 2021

Medicina Fisiologia Curso superior Fisiologia Humana Fisiologia endócrina Saúde Pública Diabetes Medicina

Definição de DM: grupo heterogêneo de doenças metabólicas que causam hiperglicemia decorrente de falhas na secreção insulínica pelas células β-pancreáticas e/ ou de resistência periférica aos efeitos da insulina. O DM possui diversas etiologias, porém os dois principais tipos DM tipo 2 e DM tipo 1 envolvem fatores genéticos/ ambientais/ comportamentais e genéticos/ imunológicos, respectivamente. Independentemente da etiologia,  todos os tipos de DM apresentam a disfunção de células β-pancreáticas como consequência da hiperglicemia sustentada. Ademais, a glicotoxicidade provocada pelo status hiperglicêmico constante provoca danos microvasculares (retinopatia diabética, nefropatia diabética e neuropatia periférica), assim como danos macrovasculares (doença arterial periférica, doença coronariana e doença vascular encefálica). Além disso, a deficiência de insulina altera o metabolismo das proteínas e dos lipídios, ocasionando catabolismo proteico e dislipidemia. Todas essas condições estão associadas  a pior morbidade em relação a doença renal terminal, infarto agudo do miocárdio, perda de visão, amputação não traumática de MMII e acidente vascular encefálico. A classificação do diabetes mellitus (DM) é o ponto de partida para a escolha do tratamento mais adequado, assim como para a definição das estratégias de rastreamento de complicações e comorbidades relacionadas. Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) recomenda a classificação baseada na etiopatogenia do DM.  

Epidemiologia: estima-se que a prevalência global de DM seja de 9,3% nos indivíduos entre 20 e 79 anos, porcentual equivalente a 463 milhões de diabéticos. Entretanto, apenas 2 em cada 3 indivíduos são diagnosticados. Outro dado alarmante é o crescimento exponencial de casos entre crianças e adolescentes. Estima-se que 1.100.000 vivem com DM principalmente do tipo 1, apesar do aumento de casos do tipo 2 em decorrência da alta prevalência de obesidade observada nessa faixa etária.  Lamentavelmente, em 2019, ocorreram cerca de 4 milhões de óbitos provocados por algum tipo de DM. O cenário nacional não é diferente. Estima-se uma prevalência em torno de 16,8 milhões, dos quais quase 50% ainda não foram diagnosticados. Fato este que coloca o Brasil em 5º lugar no ranking de países com maior número de casos. A maior parcela dos casos está atrelada a condições sócio-ambientais desfavoráveis, tais como baixa escolaridade, baixa renda, urbanização e aquisição de hábitos de vida nocivos (aumento da ingestão de alimentos ultraprocessados, aumento da ingestão calórica, sedentarismo, tabagismo, estresse, etc). 

Classificação DM | American Diabetes Association (ADA) 

TIPO

PRINCIPAIS ASPECTOS 







Diabetes tipo 2 (DM2)

Etiopatogenia: resistência periférica à insulina precede hiperglicemia permanente por perda progressiva de secreção insulínica pelas células β-pancreáticas. Os principais órgãos-alvo da insulina são: músculos esqueléticos, órgão adiposo, fígado e encéfalo.

- Provoca resistência/ deficiência incretínica e sinais clínicos de resistência insulínica (acantose nigricans e hipertrigliceridemia). 

- 90-95% do total de casos.

- 80 % dos indivíduos são obesos. 

- 30-50% são assintomáticos ou oligossintomáticos, situação que se reflete no atraso de cinco anos, em média, no diagnóstico. 

- Evolução insidiosa.

- Fatores de risco: obesidade/ desnutrição (IMC > 28 kg/ m²), idade ≥ 45 anos (prevalência aumenta com a idade, contudo tem sido observado maior incidência de DM2 em crianças/adolescentes), história familiar positiva, sedentarismo, dieta hipercalórica, tabagismo, SOP, DMG (risco aumentado para o binômio mãe-neonato), RCIU (fenótipo poupador), síndrome metabólica (fase de pré-diabetes + HAS/DLP/obesidade abdominal)

- Principal complicação aguda: hiperglicemia hiperosmolar 

- Tratamento inicial: dieta + atividade física + fármacos não insulínicos.













Diabetes tipo 1A ou 1B (DM1A e DM1B)

Etiopatogenia: polimorfismos do HLA-2 predispõem ao desenvolvimento do DM1A, o qual é desencadeado por fatores ambientais, tais como infecções virais (rubéola congênita, enterovírus e sarampo), exposição precoce ao leite bovino e deficiência de vitamina D, responsáveis por sensibilizar o sistema imune, que responderá com produção de anticorpos (reação cruzada) e, posteriormente, autoanticorpos. Consequentemente, haverá destruição indolente das células da ilhota pancreática, resultando deficiência na capacidade secretora de insulina. Portanto, há deficiência absoluta de insulina, a qual é estabelecida quando há destruição de 90% das células das ilhotas.

- 5-9% do total de casos.

- É mais comum em crianças e adolescentes, mas pode ocorrer em qualquer idade, porém, em adultos não costuma ter apresentação clássica.  

- Praticamente 100% dos casos apresentam a tríade poliúria, polidipsia e polifagia.

- Evolução abrupta.

- Complicação aguda mais frequente: CAD.

- Principais autoanticorpos:

  Anti-GAD

  Anti-ICA

  Anti-Zn8

  Anti-fosfatase 

- Tratamento: insulinoterapia desde o diagnóstico ou em até 6 meses. 


O DM1B é idiopático, portanto, não tem sua etiopatogenia determinada. Essa forma é fortemente herdada, mas não há atividade autoimune e polimorfismos em genes do HLA. 

Diabetes gestacional (DMG)

Hiperglicemia diagnosticada durante a gestação, descartando-se eventual DM preexistente. Geralmente ocorre na transição do 2º para o 3º trimestre.  




Outros tipos de Diabetes

DM por defeitos monogênicos na função das células β-pancreáticas (MODY e neonatal); DM mitocondrial; DM associado a doenças do pâncreas exógeno (pancreatite aguda, fibrose cística e carcinoma); DM associado a endocrinopatias (síndrome de cushing, acromegalia, feocromocitoma, hipertireoidismo, aldosteronoma, somatostatinoma e glucagonoma) ou DM induzida por fármacos (glicocorticóides, hipolipemiantes e antipsicóticos) e DM pós-transplante (rim e fígado)



Diabetes tipo 2 | Patogênese: manifesta-se, geralmente, em indivíduos obesos com idade entre 40 e 50 anos. Entretanto, vem se observando crescente aumento de casos em crianças e adolescentes, demonstrando que o principal fator de risco é a obesidade, principalmente a de padrão abdominal. A patogênese é determinada por diversos processos: 

1- Perda parcial, porém progressiva da função secretora das células β-pancreáticas.

2- Resistência insulínica em seus principais órgãos-alvo: músculo esquelético, órgão adiposo, fígado e encéfalo. 

3- Lipólise aumentada (liberação de triglicerídeos e ácidos graxos)

4- Aumento na reabsorção de glicose pelos túbulos renais por aumento na expressão dos receptores SGLT2. 

5- Aumento na produção hepática de glicose (gliconeogênese em jejum e pós-prandial)

6- Secreção inapropriada de glucagon pelas células α-pancreáticas

7- Disfunção no metabolismo das incretinas 

8- Alteração da microbiota intestinal

9- Desregulação do sistema imune e estado pró-inflamatório sustentado.  

Diabetes tipo 1 | Patogênese: a existência de polimorfismos nos genes que codificam as moléculas do HLA tipo 2 (variantes HLA-DR3 e HLA-DR4, embora apenas 5% dos indivíduos que apresentam tais mutações desenvolvem DM1) e nos genes que codificam a insulina determinam uma predisposição genética para o desenvolvimento do DM1A. Acredita-se que  processo patológico seja desencadeado por fatores ambientais, tais como infecções virais (rubéola congênita, enterovírus e sarampo), exposição precoce ao leite bovino e deficiência de vitamina D, que sensibilizam o sistema imune. Na maioria dos casos, há produção de anticorpos contra esses aloantígenos, determinando agressão indireta às células da ilhota por ocorrência de mimetismo molecular. Posteriormente, há produção de autoanticorpos, agravando o processo de destruição indolente das células β-pancreáticas, determinando deficiência permanente e absoluta de insulina. A velocidade do processo é variável, sendo determinada pela diversidade de autoanticorpos, mas também pelos seus títulos. Quanto menor a idade, maior é a tendência de rápida destruição. Os principais autoanticorpos são:

- Anti-descarboxilase do ácido glutâmico (GAD)

- Anti-insulina 

- Anti transportador de zinco 8

- Anti-tirosina fosfatase IA2 e IA2b

Tais anticorpos são produzidos meses ou anos antes do status de hiperglicemia permanente por deficiência insulínica definidor de DM1, permanecendo detectáveis pelo menos até o momento do diagnóstico em 85-90% dos casos, com a possibilidade de permanecerem na circulação por até 10 anos ou mais após o mesmo. 

Observação: logo após o início da insulinoterapia (5 a 7 dias), a maior parte dos pacientes desenvolvem anticorpos contra a insulina exógena, podendo haver interferência no teste do anticorpo anti-insulina, o que limita o uso para a classificação do DM

DM1 versus DM2: as novas diretrizes nacionais de diabetes recomendam (classe IIA e nível B) que a distinção seja realizada essencialmente pela história clínica, considerando-se os seguintes aspectos: idade ao diagnóstico, IMC/CA, necessidade de insulinoterapia e, caso faça uso, em qual momento foi prescrito (desde o diagnóstico?). Entretanto, em casos atípicos, tais como x, a pesquisa de autoanticorpos e a dosagem do peptídeo C podem fornecer ajudar no diagnóstico. O fato é que existem tipos de DM considerados como formas híbridas de DM1 e DM2. O DM autoimune latente em adultos (LADA) ocorre tipicamente em indivíduos acima de 30 anos, com independência de insulinoterapia por no mínimo seis meses, porém apresenta anticorpos (anti-GAD é o mais comum). Entretanto, sua apresentação clínica é mais insidiosa,  mais compatível com os critérios do DM2. Por outro lado, existe o DM2 com tendência a cetose (DM2TC), no qual os pacientes obesos apresentam CAD como primeira manifestação da doença, apesar de apresentarem reserva insulínica (β+). Justamente por apresentar tal reserva, evoluem de forma atípica (não se tornam dependentes de insulina, pois respondem bem aos hipoglicemiantes de via oral e à dieta balanceada). Contudo, esses indivíduos não apresentam autoanticorpos positivos (A-), apesar de frequentemente apresentarem HLA-DR3 e/ou HLA-DR4. 

DM MODY: existem 14 subtipos, sendo que os mais comuns são MODY 3 e MODY 2, seguido pelo MODY 1. Devemos suspeitar de diabetes monogênico em pacientes com hiperglicemia de início antes dos 25 anos de idade,  com diabetes surgindo na família antes dos 25 anos em duas ou três gerações. Os autoanticorpos devem ser negativos e o peptídeo C > 0,6 ng/dL (apresenta atividade secretora), após 5 anos do diagnóstico de DM. A maioria dos pacientes não apresenta sobrepeso, sendo que MODY 3 e MODY 1 apresentam piora progressiva da função secretora, consequentemente da hiperglicemia. Apesar disso, respondem bem às sulfanilureias. 

Diagnóstico | Clínico: em DM1, os sintomas clássicos poliúria, polifagia, polidipsia e perda ponderal estão presentes, no entanto, a obesidade não exclui o diagnóstico. Por outro lado, em DM2 os sintomas são mais inespecíficos como tontura, alterações visuais, astenia e câimbras e frequentemente apresentam acantose nigricans (sinal de resistência insulínica). Em mulheres, candidíase vulvulvaginal de repetição e, em homens, disfunção erétil podem ser sinais de resistência insulínica e merecem investigação. 

Laboratorial: o diagnóstico definitivo requer confirmação de hiperglicemia. As novas diretrizes nacionais de diabetes (2021) mantiveram as recomendações de utilizar como critério de diagnóstico de DM a (1) glicemia plasmática de jejum C 126 mg/dl, (2) glicemia duas horas após sobrecarga de 75g de glicose anidra ≥ 200 mg/dl e (3) HbA1c ≥ 6,5%. São necessários dois exames alterados para confirmação diagnóstica. Se somente um exame estiver alterado, recomenda-se que este seja repetido para confirmação. Valores entre 100-125 mg/dL; 140-199 mg/dL e 5,7-6,4% para GJ, TOTG 2 horas e Hb1Ac, respectivamente, definem pré-diabtes. Recomenda-se que se dê preferência para GJ e HbA1c em uma mesma amostra de sangue. Por outro lado, a glicemia ao acaso ≥ 200 mg/dL em indivíduos com sintomas inequívocos de hiperglicemia dispensam os critérios supracitados. 



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