MEDICINA RESPIRATÓRIA | INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA
Por: Leonardo F.
11 de Novembro de 2021

MEDICINA RESPIRATÓRIA | INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA

Medicina Fisiologia Anatomia Curso superior Patologia pneumologia Fisiologia Respiratória Medicina Medicina de Emergência Medicina Intensiva ANESTESIOLOGIA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO - ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA | CLÍNICA MÉDICA  - 2021  | Data: 20/10/2021.

Autor: Leonardo de Sena Fessori.

A insuficiência respiratória ocorre quando o sistema respiratório não consegue manter as trocas gasosas, causando disfunção de outros órgãos ou pondo em risco a vida. Didaticamente, divide-se a insuficiência respiratória em hipoxêmica (ou tipo I), quando predomina o déficit de oxigenação sanguínea, e hipercápnica ou ventilatória (tipo II), quando predomina a retenção de gás carbônico por hipoventilação.

 

A insuficiência respiratória hipoxêmica é definida como uma PO2 arterial de menos de 60 mmHg, ao passo que a hipercápnica como PCO2 > 50 mmHg com pH < 7,3. É importante salientar que as duas condições coexistem frequentemente. O limiar de 60 mmHg é um valor arbitrário e reflete a forma da curva de dissociação da oxiemoglobina, marcando a PO2 arterial abaixo da qual a saturação de hemoglobina com o oxigênio cai vertiginosamente na maioria das pessoas.

 

É essencial determinar se a insuficiência respiratória hipoxêmica é aguda (duração de horas a dias) ou crônica (duração de semanas a meses), pois tem implicações não apenas para o diagnóstico e tratamento, mas também para as adaptações fisiológicas à hipoxemia que se desenvolvem ao longo do tempo.

 

Uma coorte realizada em 45 UTI brasileiras detectou que 31% dos pacientes em terapia intensiva preenchiam critérios para síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA), requerendo o uso de ventilação mecânica invasiva ou não invasiva e carregando uma mortalidade de 52%.No Hospital das Clínicas da FMUSP, uma coorte prospectiva em 12 UTI detectou prevalência de 57% de insuficiência respiratória com incidência de 16% durante a internação em UTI.

 

Fisiopatologia 

 

Existem cinco principais mecanismos fisiopatológicos para hipoxemia, e eles podem coexistir:

 

1) Distúrbio ventilação-perfusão: predomina na IR tipo I. Ocorre quando o sangue perfunde unidades alveolares com ventilação reduzida (efeito shunt, como nas doenças obstrutivas e no edema alveolar cardiogênico) ou quando a ventilação ocorre em regiões não perfundidas (efeito espaço morto, como no tromboembolismo pulmonar).

 

2) Shunt direito-esquerdo: ocorre quando uma parte do sangue arterial atinge a circulação sistêmica sem passar através de regiões ventiladas.

 

3) Hipoventilação: diminuição da chegada de oxigênio ao alvéolo e da saída do gás carbônico. Não há alteração do mecanismo de captação de oxigênio, e o gradiente alveoloarterial (DAaO2) é preservado.

 

4) Alterações na difusão: diminuição da área de troca alveolocapilar, da diminuição do tempo de trânsito capilar (sangue perfunde muito rápido e não dá tempo de oxigenar) e do espessamento da barreira alveolocapilar (como na fibrose pulmonar, em que há depósito de colágeno e/ou fibroblastos no interstício).

 

5) Redução da fração de O2 inspirada: ocorre em situações de altitude elevada, como durante um voo comercial ou na prática de montanhismo.

 

As causas para hipoxemia arterial aguda também podem ser classificadas com base na localização da patologia primária: nos espaços aéreos, interstício, coração e vasculatura pulmonar, vias aéreas ou espaço pleural.












Vale ressaltar que a fadiga diafragmática que pode se instalar em uma insuficiência respiratória inicialmente hipoxêmica pode levar a hipoventilação, piorando a hipoxemia e gerando hipercapnia.

 

A consequência da hipoxemia é a redução do conteúdo arterial de oxigênio (CaO2) e da oferta de oxigênio (DO2) aos tecidos. A hipóxia tecidual ocorre quando a taxa de extração de oxigênio não pode mais ser aumentada pelas células para compensar a hipoxemia. Com isso, o metabolismo celular fica limitado e ocorre glicólise anaeróbia com produção de grandes quantidades de ácido láctico, podendo evoluir para morte celular e, por fim, disfunção orgânica. 

 

Diagnóstico: os achados clínicos dependem do quadro clínico do paciente, podendo se relacionar à hipoxemia e à hipercapnia. De modo geral, observamos dispneia, taquipneia, cianose, além de que a hipoxemia costuma levar a ansiedade, taquicardias, arritmias, confusão mental e convulsões. Já a hipercapnia gera sonolência, inquietação, tremor, cefaleia, letargia e coma. Além dos achados clínicos relacionados a alterações gasosas, o paciente apresenta também sinais e sintomas relacionados à doença que desencadeou a insuficiência respiratória: tosse (produtiva ou não), sibilos (sugerem broncoespasmo), crepitações (sugerem pneumonia, edema agudo de pulmão ou SDRA). Redução do murmúrio vesicular pode sugerir pneumotórax, derrame pleural ou mesmo broncoespasmo grave.  O parênquima pulmonar não tem inervação que resulte em estímulo doloroso, portanto dor torácica associada a um quadro de insuficiência respiratória deve levantar a hipótese de acometimento da pleura parietal, doença vascular pulmonar, como o tromboembolismo pulmonar, ou ainda do ventrículo direito, como no caso da hipertensão pulmonar. Por fim, devemos buscar comorbidades relevantes como insuficiência cardíaca ou imunossupressão, que poderiam levantar hipóteses como congestão e infecção oportunista, respectivamente.

 

O gradiente artério-alveolar G(A-a) é uma ferramenta muito útil para distinguir se a hipoxemia se origina de hipoventilação ou da redução da difusão do O2. O G(A-a) pode ser calculado pela seguinte fórmula:

 

G(A-a) = 130 – (PaO2 – PaCO2)

 

A presença de algum mecanismo de hipoxemia que não apenas hipoventilação é considerada quando a G(A-a) é ≥ 20 mmHg, sendo nesse caso considerada insuficiência respiratória tipo I. Quando o G(A-a) é > 30 mmHg, considera-se insuficiência respiratória grave. Valores normais significam que a hipoxemia observada na gasometria é decorrente puramente de hipoventilação, o que, na presença de PaCO2 > 50 mmHg e pH < 7,3, é sugestivo de insuficiência respiratória aguda tipo II. Se o paciente estiver sob ventilação mecânica invasiva ou não invasiva, pode-se utilizar a relação entre a PaO2 e a fração inspirada de oxigênio (FIO2), sendo PaO2/FIO2 < 300 mmHg indicativa de insuficiência respiratória.




Propedêutica complementar:

- Gasometria arterial 

- Oximetria de pulso 

- LABS: hemograma, função renal, função hepática, PCR

- Função hepática 

- Cultura bacteriana (se a suspeita for PAC)

 

A radiografia de tórax pode detectar opacidades sugestivas de diagnósticos como pneumonia ou, quando bilaterais, alertar para a possibilidade de SDRA mediante critérios de Berlim, além de afastar outros diagnósticos diferenciais, por exemplo, derrame pleural ou complicações como pneumotórax pós-punção de cateter venoso central.

 

A tomografia computadorizada de tórax pode complementar a avaliação de casos de SDRA, hemorragia alveolar ou infecções oportunistas.

 

A realização de ultrassonografia à beira-leito (point-of-care) avalia o paciente na sala de emergência ou na UTI.  Pode detectar alterações que ajudem na suspeita diagnóstica e na monitorização da efetividade de intervenções. O blue protocol é um algoritmo de avaliação de insuficiência respiratória por meio da ultrassonografia beira-leito com acurácia diagnóstica de até 91%.

 

Tratamento: 

 

O paciente com suspeita de IR deve ser conduzido à sala de emergência para avaliação (se não tratado rapidamente, pode evoluir com parada respiratória), devendo receber monitoramento cardíaco, pressão arterial (PA), oximetria de pulso, acesso venoso e oxigênio suplementar. Em caso de instabilidade hemodinâmica, rebaixamento do nível de consciência ou risco iminente de parada respiratória (respiração agônica, bradicardia), deve-se proceder de imediato a intubação orotraqueal (IOT). Caso haja sinais sugestivos de pneumotórax hipertensivo, deve-se realizar de imediato a punção de alívio no segundo espaço intercostal com jelco calibroso, e posteriormente realizar drenagem torácica sob selo d’água.

Excluídas tais condições acima, deve-se fornecer O2 suplementar, objetivando uma SpO2 acima de 90%, e após a estabilização inicial, obter história e realizar exame físico, além de exames complementares também já mencionados, além de outros pertinentes às hipóteses diagnósticas aventadas. Em caso de persistência do desconforto respiratório, poderá ser indicada a ventilação não invasiva (VNI).

 

Oxigênio suplementar: o dispositivo mais simples para a oferta de O2 é o cateter nasal. É um sistema de baixo fluxo (até 5 ℓ/min) e que não permite determinar com exatidão a FiO2 fornecida. Estima-se um aumento de 3% na FiO2 para cada 1 ℓ/min de O2 fornecido. Havendo necessidade de O2 em fluxos mais altos, devem-se utilizar máscaras de O2. Para controlar a FiO2 fornecida, podem ser utilizadas as máscaras de Venturi, que possuem válvulas acopladas ao sistema capazes de ofertar uma FiO2 predeterminada, ou mesmo utilizar máscaras com reservatório de O2. Nessas últimas, a FiO2 ofertada chega a 100%.

 

Ventilação não invasiva (VNI): é um recurso muito importante que deve ser disponibilizado em todo departamento de emergência. Consiste em um ventilador, acoplado a uma interface que pode ser nasal, máscara facial ou full face. O sistema oferece FiO2 controlada com pressão positiva, que pode ser contínua (CPAP) ou em 2 fases (BIPAP), sendo uma na fase inspiratória e outra na expiratória. Com o uso adequado da VNI é possível obter alívio dos sintomas, redução do esforço respiratório, melhora das trocas gasosas, podendo-se evitar uma evolução desfavorável do paciente. Apesar dos inúmeros benefícios, não se deve retardar a indicação de IOT em detrimento da VNI, respeitando-se suas contraindicações: PCR franca ou iminente, instabilidade hemodinâmica, arritmias graves, rebaixamento do nível de consciência, presença de grandes quantidades de secreção em VA, trauma ou queimadura em face ou pacientes não colaborativos. 

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