Papel dos mitos
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Por: Lia L.
27 de Janeiro de 2021

Papel dos mitos

Estruturalismo de Lavi-Strauss

Antropologia Geral

O PAPEL DOS MITOS

Para compreender as culturas de povos indígenas brasileiros Lévi-Strauss estudou não apenas as estruturas de parentesco, mas também os mitos e a linguagem. A nomenclatura que designa os parentes permite o reconhecimento de quais são os casamentos permitidos e os proibidos. Essa nomenclatura aparece tanto no relato de informantes como em mitos. Ao estudar os mitos temos que nos ater à significação do mito, é ali que se encontrará a organização lógica e o sentido dos elementos fundantes da estrutura social. Qualquer modificação nos elementos de um mito vai interferir no sistema como um todo. Ou seja, para compreendermos o sistema cultural teremos de compreender as partes integrantes desse sistema e como elas se relacionam entre si.

 

O que Lévi-Strauss estudou e conclui sobre os mitos nós podemos pensar o mesmo funcionalmente em relação as nossas lendas, folclore, mitologia, histórias, analogias, etc. É por meio das histórias que a gente passa as regras sociais. Por exemplo, quando a gente conta a história da Chapeuzinho Vermelho, a gente está ensinando o papel de mãe, o amor pela avó, a preocupação com os homens mau intencionados e o que é o homem bom. Essas informações vão organizar o pensar, o sentir e o agir das crianças que vão se espelhar nessas relações da história na vida real.

 

Nas palavras de Lévi-Strauss “o mito faz parte integrante da língua; é pela palavra que ele se nos dá a conhecer, ele provém do discurso” (LÉVI-STRAUSS, 2003, p. 240). O mito está na linguagem e além dela, possui uma língua e palavras que pertencem a um tempo passado; ou seja, possui um sistema temporal e, ao mesmo tempo forma uma estrutura permanente que se relaciona ao passado, ao presente e ao futuro que pode ser estudado e compreendido. Assim, os elementos que provêm de um mito são grandes unidades constitutivas, portanto estruturas possíveis de serem estudadas e compreendidas.

Para compreendermos um mito temos três princípios básicos a observar:

1) Se os mitos têm um sentido, este não pode se ater aos elementos isolados que entram em sua composição, mas a maneira pela qual estes elementos se encontram combinados. 2) O mito provém da ordem da linguagem, e faz parte integrante dela; entretanto, a linguagem, tal como é utilizado no mito, manifesta propriedades específicas. 3) Essas propriedades só podem ser pesquisadas acima do nível habitual da expressão linguística; dito de outro modo, elas são de natureza mais complexa do que as que se encontram em uma expressão linguística de qualquer tipo. (LÉVI-STRAUSS, 2003, p. 242)

Diante desses princípios e aplicando um método de estudo emprestado da linguística é possível chegar a estruturas de duas dimensões se estudado um mito recolhido apenas dentro de uma tribo, mas quando se estuda diversas versões do mesmo mito, em diversas tribos, o esquema se torna tridimensional ou multidimensional. Afinal, “quem conta um conto aumenta um ponto”.

 

Saiba mais

Para compreender como estudar um mito e sua estrutura leia o capítulo “A estrutura dos mitos” no livro Antropologia estrutural de Lévi-Strauss.

 

Em Antropologia Estrutural 2 é possível compreender o método estrutural de leitura dos mitos. Há vários exemplos de métodos de estudo dos mitos, citemos apenas um dos exemplos sobre “o sexo dos astros”. Diversas culturas indígenas das Américas possuem mitos sobre o sol e a lua, a palavra para sol e lua pode ser a mesma ou ter a mesma raiz em alguns casos, ou ter nomes diferentes com gêneros diferentes.

Nos casos de mesma palavra para designar os astros, pode ser designado a cada astro uma qualidade de iluminação ou de calor, distinguindo assim um do outro; ou então o mito acaba mostrando a qual gênero pertence cada um, pois o sol nasce do homem e a lua nasce da mulher; ou ainda, a lua tem qualidades masculinas e o sol qualidades femininas. É isso mesmo, não existe um consenso quanto ao gênero da lua e do sol.

Em outros mitos eles podem ser parentes (irmãos, por exemplo), o que ajuda a transmitir o que é incestuoso em cada cultura, podendo ser um incesto homossexual ou heterossexual. Em algumas tribos ao invés dos astros terem gêneros diferente é a diferença de idade que se torna importante, sendo o sol mais velho que a lua. Ou então, trabalha-se a dualidade sagrado/profano. Sendo assim, existe a oposição física de gêneros ou a oposição moral, mas sempre há fatos e casos discordantes. Chega-se então à seguinte conclusão:

Ou os astros não são distintos, ou o são. Se eles não são distintos, o sol é um modo da lua, ou o contrário. Se eles são distintos, a diferença é sexual, ou não sexual. Se ela é sexual, o sol é macho e a lua fêmea, ou o inverso, e em cada caso, os astros podem ser marido e mulher, irmão e irmã, ou as duas coisas ao mesmo tempo. Se a diferença não afeta o sexo, eles podem ser duas mulheres ou dois homens, que se opõem então por seu caráter ou por seu poder. Esta última oposição se enfraquece às vezes a tal ponto que um dos germanos perde sua individualidade e se torna uma espécie de cópia do outro. (LÉVI-STRAUSS, 1993, p. 225)

Tanto mais se estuda, mais variantes se encontra, mas pode-se concluir “que os mitos não tratam o sexo dos astros como um problema isolado” (LÉVI-STRAUSS, 1993, p. 228). O pensamento mítico traz em si estruturas do pensamento, da linguagem e da organização social do seu povo.

Diante de tantas análises o próprio Lévi-Strauss conclui “a análise não deve jamais contentar-se em considerar os termos, mas deve, para além dos termos, apreender as relações que os unem. Apenas as relações constituem o seu verdadeiro objeto.” (LÉVI-STRAUSS, 1993, p. 91). Portanto, é nas relações entre os termos, conceitos e definições que conseguiremos absorver, entender e compreender a essência do nosso objeto de estudo.

Resumindo, de acordo com Marconi e Pressotto (2001)

(…) o estruturalismo é (…) um conjunto de teorias e um método de análise, cujos postulados básicos podem ser assim configurados: 1. visão sincrônica e sistêmica da cultura, 2. visão globalizada do fenômeno cultural (o conhecimento do todo leva à compreensão das partes), 3. adoção das noções de estrutura social e relações sociais, 4. utilização de modelos de análise cultural, 5. unidade de análise: estruturas mentais inconscientes, 6. compreensão ampla da realidade cultural. (MARCONI e PRESSOTTO, 2001, p. 273)

 

O que podemos observar é que a visão binária e de opostos é bem constante nas diversas culturas: homem/mulher, sagrado/profano, permitido/proibido, bem/mal. Isso faz parte da estrutura, do sistema, da mentalidade, das regras. No entanto, observa-se também que existe espaço para variações, adaptações, exceções. Ou seja, existe o modelo ideal, mas é reconhecida as adaptações e variações das regras, pois a humanidade e a vida acontecem nesse meio de campo, nessa busca por se tornar humano, é isso o que veremos a partir de agora.

 

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