Companhia de Jesus no Brasil
Por: Pedro O.
16 de Agosto de 2018

Companhia de Jesus no Brasil

Da itinerância ao comodismo

História História do Brasil Brasil Colônia

          Companhia de Jesus? Este nome que se espalhava por todo mundo rapidamente, era ainda uma incógnita para povos, reis, eclesiásticos. Ainda assim, foram eles os maiores responsáveis das missões durante o período moderno. Mas qual a importância dessa Companhia para o Brasil Colônia, especificamente no século XVI? Ou ainda, qual a importância da realidade brasileira para transformação dessa Companhia?

 

           Após o Tratado de Tordesilhas de 1491, que foi validado posteriormente pelo papa Júlio II em 1506 com a bula Ea quae, determinava que 300 léguas ao leste da ilha de Cabo Verde, havia ficado como posse de Portugal. Nessas léguas, o Brasil foi encontrado em 1500. Primeiramente não foi visto como foco para os lusos, já que esse tinha como foco maior as Índias, centro do monopólio comercial, de onde se comercializava especiarias, ouro e marfim (HANSEN, 2010: 58). Através do mercantilismo, os portugueses expandiam e fortaleciam o reino.

            Nesse período, o governo do Brasil foi dividido em Capitanias, essas que eram hereditárias, ou seja, passadas de pais para filhos. As Capitanias eram um dos problemas começavam a preocupar D. João III, pois não estavam dando certo. Haviam as invasões francesas que ao invés de cessar aumentavam, as guerras contra os indígenas e a ausência de Cristo nessa terra. Além disso, o governo espanhol havia encontrado ouro e posteriormente pérolas, prata e mercúrio, trazendo consequentemente um maior interesse para descobertas das riquezas do Brasil e, também, o perigo de uma invasão maior de outros países da Europa.

            O envio do primeiro governador geral, foi realizado por dois motivos. Para sanar os problemas da Colônia e organizá-la como fonte de renda para coroa Lusa. Isso se deu através da exploração e defesa militar, agricultura extensiva e conquista espiritual (HANSEN, 2010: 79). Outro aspecto importante, que fazia-se urgente a evangelização nessas terras, na visão de D. João III, era a crescente do protestantismo. A França aos poucos abandonava a tradição católica, mas não o cristianismo. Por isso, estando ela a invadir nossas terras, o perigo de que as “heresias” fossem fomentadas no Brasil, trouxe uma urgência de evangelização, evangelização da “verdadeira fé”, assim, missionários se fizeram necessários (SILVA, 2011: 113). Mas se por um lado o risco do protestantismo de vir para cá era um problema para os portugueses, os rituais antropofágicos dos indígenas, que foram considerados bruxaria, era um problema importante à ser combatido, ainda mais ao considerar o espírito da Inquisição que permanecia se respirando na Península Ibérica. 

            Inácio de Loyola, que de soldado em guerras, se transformou em “soldado de Cristo”, com mais alguns amigos, fundou a Companhia de Jesus. Obedientes a Igreja e dispostos para defender e ensinar a fé, a qualquer custo, ainda que com a própria vida, os jesuítas deveriam fazê-lo. Nesse sentido, uma mentalidade de martírio era formada em cada novo membro. Quando se lê as histórias contadas sobre eles, ou por eles próprios, é perceptível a semelhança com a dos primeiros apóstolos citados na bíblia. Foi com esse espírito paulino, de evangelização e obediência, que Loyola e os seus, aos poucos conquistaram espaço na Europa. Principalmente porque fortaleciam os ideais que estavam surgindo no Concílio de Trento e eram patrocinados pela Coroa Lusa, não só no Brasil, mas em outras missões.

            Ainda um ponto necessário para poder entender o contexto no qual se situa a Companhia de Jesus no Brasil e suas posturas, é o Padroado. Desde o início do séc. XV, o rei de Portugal era pelo Padroado, considerado um representante do papa em suas terras (HANSEN, 2010: 59-60). Desse modo, a nomeação de bispos, a fundação de dioceses, a criação de ordens religiosas, tudo passava pelas mãos do rei. Assim, nem tudo o que o papa ordenasse para os católicos, necessariamente aconteceria nas terras do rei, já que deveria passar pela sua aprovação. Com isso, para um cristão seguir as ordens do rei, era seguir as ordens do papa e, consequentemente, estaria seguindo as ordens do próprio Cristo.

            Em meio a necessidades pontuais, Dom João III envia os primeiros seis jesuítas, sendo o padre Manuel da Nóbrega o superior, para colônia brasileira junto com Tomé de Sousa, primeiro Governador Geral, em 1549. A missão da Companhia de Jesus no Brasil, ficou dividida entre os colonos e negros da terra, modo como também eram chamados os indígenas naquele tempo. Sobre o trabalho com os colonos, que eram cristãos-velhos, não irei aprofundar, mas apenas mencionarei o fato que para Nóbrega, eles estavam em pecado mortal, pecado esse que não eram denunciados pelos clérigos que aqui se encontravam, já que esses, eram mais sacerdotes do demônio que do próprio Cristo (Cartas Avulsas, 1931: 76).

Na missão com os índios outras dificuldades foram encontradas para doutrinação. Poderia considerar o fato deles não terem fé, lei e rei (GÂNDAVO, 1980: 14). Mas como centro das dificuldades, sintetizarei em outras três:  os feiticeiros; o nomadismo; e a antropofagia. Para superar essas dificuldades, as escolas e as Reduções foram fundamentais. A escola não surgiu como um meio de ensinar gramática ou aritmética, mas como meio de doutrinação. Um programa de “catequese e escola”, onde o índio ainda pequeno, que está em fase de aprendizagem, aprende os bons costumes cristãos. Este vai questionar os modos de vida dos seus familiares, vai ensinar o que aprendeu, gerando uma visão diferente sobre a fé cristã a partir de dentro da tribo e não de fora, fomentando a criação de uma nova cultura. Além disso, os pais evitariam mudar, para que seus filhos permanecessem estudando e com isso, os jesuítas ganhavam concomitantemente a proteção dos índios.

Aos poucos, o estilo de itinerância e pobre, foi se tornando cômodo, exemplo disso é o aldeamento, onde tinham uma residência fixa, e os colégios, que de auxílio para evangelização, aos poucos se tornam o foco da missão, e deste modo, o apóstolo desbravador vai dando lugar ao pedagogo intelectual, reduzindo drasticamente o número de jesuítas nas missões, comparado aos que ficavam no colégio.

Os padres têm aqui collegio novo quasi acabado; é uma quadra formosa com boa capella, livraria, e alguns trinta cubículos, os mais delles têm as janellas para o mar. O edifício é todo de pedra e cal de ostra, que é tão boa com a de pedra de Portugal. Os cubiculos são grandes, os portaes de pedra, as portas d’angelim, forradas de cedro; das janelas descobrimos grande parte da Bahia (...). A igreja é capaz, bem cheia de ricos ornamentos de damasco branco e roxo, veludo verde e carmesim, todos com tela d’ouro; tem uma cruz e thuribulo de prata (...). O Collegio tem tres mil cruzados de renda, e algumas terras adonde fazem mantimentos; residem nelle de ordinario sessenta; sustentam-se bem de mantimentos, carne e pescados da terra; nunca falta um copinho de vinho de Portugal (...) vestem e calçam como em Portugal; estão empregados em uma lição de Theologia, outra de casos, um curso d’artes, duas classes de humanidades, escola de ler e escrever; confessam e pregam em nossa igreja, sé, etc. Outros empregam-se na conversão dos índios (CARDIM, 1980: 144-145).

            O “espirito evangélico”, missionário, que ansiava em desbravar as matas atrás de índios para “salvação das almas”, evangelização, vai aos poucos dando espaço para uma vida mais preocupada em manter o que se tem, em tornar-se mestres das escolas dos filhos dos colonos. Mentalidades diferentes? Desejos? Necessidades? Fato é que a Companhia de Jesus foi enviada para o Brasil como responsável da evangelização indígena, porém aos poucos percebe-se que a missão com os indígenas se torna para alguns. Os soldados de Cristo, tão acostumados a batalhar pelas almas, no fim do século vivem uma realidade muito diferente da idealizada pelos missionários que aqui chegaram inicialmente e pelos superiores. Tanto que em 1582, a Companhia de Jesus no Brasil é chamada de vinha estéril pelo superior geral, Aquaviva, em Roma (CASTELNAU-L’ESTOILE, 2006, p. 20). Porém, o que levou o superior a dizer isso sobre essa missão?

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARDIM, Fernão. Tratados da Terra e Gente do Brasil. Rio de Janeiro: Editores – J. Leite & Cia., 1925.

Cartas Avulsas: 1550-1568. Rio de Janeiro: Officina Industrial Graphica, 1931.

CASTELNAU-L’ESTOILE, Charlotte de. Operários de uma vinha estéril: os jesuítas e a conversão dos índios – 1580-1620. Bauru, SP: Edusc, 2006.

GANDAVO, Pero de Magalhães. Tratado da Terra do Brasil: História da Província de Santa Cruz. São Paulo, EDUSP, 1980.

HANSEN, João Adolfo. Manuel da Nóbrega. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Ed. Massangana, 2010.

SILVA, Mariana Maciel da. A chegada do protestantismo no Brasil. Disponível em: <http://periodicos.est.edu.br/index.php/nepp/article/download/162/269>. Acesso em 13 de Setembro de 2016.

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