Como improvisar e ser coerente ao mesmo tempo
Por: Renato V.
09 de Outubro de 2019

Como improvisar e ser coerente ao mesmo tempo

Improvisação não pode ser notas aleatórias tocadas a qualquer momento

Teoria Musical improvisação Harmonia bom gosto

Existe uma frase do Bill Evans pianista (se você não sabe quem é, meu Deus, por que você tá lendo este artigo mesmo?) em que ele diz algo como "cada parte do seu improviso têm de ser um espelho do todo". Se não estou enganado, essa ideia está no documentário Universal Mind of Bill Evans uma das poucas entrevistas que o pianista concedeu em sua carreira.

Por sinal, à época, Evans estava em sua melhor forma. Há quase 7 anos havia se separado do quinteto de Miles e havia galgado passos maiores dentro de sua carreira solo. O documentário registra várias ideias extremamente criativas e curiosas que o tecladista tinha sobre jazz e música em geral.

Bem, esse artigo de hoje é despretensioso, no mínimo. Existe uma questão à ser respondida: como improvisar? Eu vou respondê-la debaixo de duas perspectivas: o espelho de Bill Evans e a necessidade de uma fundamentação básica musical para o improviso.

Coerência e Discurso Musical

Primeiro o espelho de Bill Evans. Digamos que você vai iniciar um improviso e sua primeira frase é a escolha das notas A, C e E tocadas em colcheias. É o início do seu discurso musical. A maneira a qual você a toca depende do estilo em que você está inserido, de sua linguagem. Pra facilitar essa frase é tocada em swing feel como se fosse um solo de standard jazzístico. A última colcheia é uma nota longa como indica a pauta abaixo:

exemplojazz1

A partir desse primeiro argumento existem algumas direções que você, como improvisador, pode seguir. Uma delas é se ater  a: 1) um grupo de notas, digamos, lá, dó e mí; 2) um padrão rítmico constante; 3) um padrão rítmico constantemente variado. Todas são boas opções e é possível explorar um pouco de cada uma delas sem perder consistência.

Veja que o mesmo padrão rítmico (e até as mesmas notas, porém em alturas diferentes) se repete nos compassos um e dois. O terceiro compasso começa com o mesmo padrão rítmico e as mesmas notas do um, no entanto há um desenvolvimento de ritmo diferente dos primeiros compassos. O quarto compasso é uma repetição do segundo.

Fundamentalmente, há uma simetria entre os compassos com uma pequeno senso de variação no terceiro compasso. Compassos 1 e 3 são similares, 2 e 4 também partilham as mesmas ideias um com o outro. Depois desses quatro compassos o discurso dá uma pausa e retoma no quinto compasso com novas ideias.

exemplojazz2

Essas ideias se iniciam também com uma pausa no tempo 1 e uma nota no contratempo desse pulso, exatamente como o primeiro parágrafo do discurso. Veja que as notas escolhidas são as mesmas só que mais altas e em uma ordem diferente. Seguimos para o segundo compasso onde há uma ideia de cromatismo interessante na terceira nota (Ré sustenido) que é uma aproximação cromática de Mí, uma das três notas iniciais desse improviso.

Há nesse compasso uma coesão de ritmo em relação ao posicionamento das notas no beat (pausa na primeira colcheia, uma nota na segunda). Uma sequência familiar de notas culmina em G, fazendo um contorno harmônico até então inexplorado. Essa frase possui o dobro de notas da primeira frase do solo e se desenvolve para uma frase maior ainda dentro do compasso três, esse em que uma nova figura rítmica adentra o jogo: a quiáltera de colcheia.

O compasso três, assim como compasso três do primeiro parágrafo, tem o maior número de variação de notas e ritmos. Há uma nota Mí ao fim desse compasso que se liga ao Lá do início da quarta barra, exatamente como no parágrafo anterior. Esse último compasso termina com exatamente a mesma frase que inaugurou essa nova série de quatro tempos.

Por meio desses recursos rítmicos, de repetição, de transformação e recapitulação das frases é possível espelhar partes do solo umas nas outras. A organização das ideias de quatro em quatro compassos, apesar de extremamente tradicional,  é muito eficaz na hora de dar concisão para o seu improviso.

Se organizar as frases em quatro compassos é pouco pra você, experimente com menos. Sempre com menos. Nunca alongue demais seus parágrafos a ponto deles não terem conexão nenhuma com a ideia original. A coerência está em sempre se referir ao início da história.

Fundamentos básicos

Infelizmente a grande maioria dos músicos não chega fundamentar os conceitos mais básicos sobre música antes de chegar na improvisação. A criatividade não é desorganizar tudo, ter a capacidade de fazer o que quiser ou fazer sem propósito algum. A criatividade floresce entre limites.

Os limites são os fundamentos básicos de música: tempo, afinação e interpretação. Sua técnica vai servir a esses três fundamentos básicos sempre. Se você tenta improvisar mas não consegue achar o seu caminho durante o seu improviso um desses três pilares está quebrado.

Para conseguir formar uma história a partir da correção desse problema, volte ao básico. Volte a uma nota apenas, uma figura rítmica apenas tocada de um jeito específico. Mude uma dessas variáveis sem força-la. Comece adicionando outra nota, mas mantendo o mesmo ritmo.

Mude a interpretação de uma das duas notas. Adicione uma terceira. Só depois tente uma variação simples dentro do ritmo. Retire uma nota. Volte ao estágio original. Dessa maneira o seu improviso vai se tornar mais orgânico, uma vez que você participa ativamente das decisões à cerca dos fundamentos musicais mais básicos.

 

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Renato V.
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