Ensino de Estética: o belo e a arte
Por: Robert P.
26 de Novembro de 2018

Ensino de Estética: o belo e a arte

Filosofia

Gérard Lebrun, em seu ensaio A mutação da obra de arte, introduz um conceito importante para o estudo da estética: o conceito da aura da obra de arte. Segundo o autor, a obra de alguma forma, relaciona o conhecimento sensível e o conhecimento inteligível, a partir da particularidade de um único objeto ao estabelecer nas pessoas uma sensação e uma relação única com a obra, e a isso ele denomina a aura da obra.

O autor discute estética de acordo com a sua etimologia, do grego aisthesis que se refere à sensibilidade, não há uma sensibilidade gerada pelos sentimentos, mas sim uma sensibilidade gerada através dos sentidos. Assim sendo, o termo foi definido por Alexander Baumgarten no século XVIII, como ciência da percepção em geral, um conhecimento dos sentidos.

Nesse sentido, a estética como um estudo do conhecimento sensível, inicia um movimento que busca domar esse conhecimento, uma vez que ele é mutável, particular e acidental e assim muito aberto à interpretação. Esse movimento se estabelece através de um canal de contato com os estímulos do que se recebe do mundo. Logo a percepção estética dá-se pela observação da natureza ou pela observação de uma forma ideal. E assim, o conhecimento adquirido a partir do sensível se dá como teoria das artes liberais, como arte de pensar de modo belo, para que a sensibilidade seja colocada nos ditames da razão.

A arte dessa forma é classificada por três faculdades: o inteligível, sensível e a imaginação. E embora ainda não houvesse sido utilizado o termo como o utilizamos agora, desde Platão é que filósofos se colocam a pensar sobre a arte e o belo. Antes do século XVIII se discutia a ideia, em um sentido transcendental, e como o artista dava a forma à matéria, se era um dom, emanação divina ou outra inspiração. Os questionamentos da antiguidade se davam sobre a natureza da criação, e a sua tentativa de alcançar algo puro e perfeito na sua totalidade. Além de Platão, outros filósofos trataram do assunto, como Aristóteles, os neoplatônicos Marcilio Ficino e Cícero, Kant entre outros.

 

O Belo em Platão

 

Para Platão, o entendimento do Belo parte do conhecimento do mundo das Ideias, em um movimento de ida e vinda, ao se aproximar das verdadeiras essências. Segundo o autor, a beleza é um ato, um impulso, uma graça que nele se exprime sob influência de sua Ideia.

O ser humano deve ascender ao Belo em uma escala gradual, primeiro amando todos os belos corpos, passando a amar um só corpo, da beleza pessoal chega aos belos costumes, dos costumes ao belo aprendizado e, por fim, àquele estudo particular que se ocupa da própria beleza e apenas dela, de forma que finalmente venha a conhecer a essência da própria beleza. Assim, para escapar das limitações dimensionais e ascender à verdadeira beleza. Portanto, devemos caminhar do corpo à alma, da alma aos belos costumes e dos belos costumes ao Belo em si.

Platão é conhecido como um crítico da arte, mas sua crítica não era da arte em si, pois o autor não rejeitava a concepção de arte como um todo, apenas aquela que se ocupava com a mimesis, ou seja, com a reprodução fiel da natureza pela obra de arte. As esculturas e as pinturas gregas, por exemplo, que se preocupavam em reproduzir de modo fiel a realidade sensível eram consideradas inferiores, pois estavam copiando o que, segundo Platão, já era uma cópia em si. Assim, as esculturas de deuses, como Dionísio e Afrodite, que eram criadas reproduzindo o movimento do vento na maleabilidade dos tecidos e na curvatura dos corpos; ressaltando os músculos e o despojamento do corpo criava uma sensação que distorcia os sentidos para o que era verdadeiramente importante, a saber, o mundo das formas inteligíveis. Platão também compara a mimesis a um espelho, no qual tudo que temos é uma imagem das coias.

Na República, o filósofo coloca o artista como um fingidor, pois para ele todas as coisas existentes no mundo já são cópias do mundo das ideias e os artistas estariam construindo aparências falsas, que ainda confundem a nossa alma.

Com efeito, a pintura só diz respeito à aparência das coisas, não à sua essência. Diz Platão que ela está afastada da verdade em três graus, uma vez que o pintor imita um objeto que já é por sua vez uma imitação, uma imagem da Ideia (é o célebre exemplo das três camas: a Ideia da cama, a cama fabricada pelo artesão que contempla a Ideia, e a cama do pintor que imita a do artesão). Ao mesmo tempo mentirosa e sedutora, a pintura é portanto uma atividade inútil e perigosa.[1]

Contudo, Platão apreciava a arte egípcia que transmitia uma noção de força, poder e justiça, expressa na rigidez dos corpos, nos traços fortes e uniformes. Pois, segundo Panofsky, Platão acreditava na existência de um caminho que levava a contemplação dessa beleza inteligível que está para além da obra de arte. Segundo o autor, a alma precisa ocupar-se ao espetáculo das belas ocupações, depois ao das belas obras, isto é, não tanto por aquelas produzidas pelas artes, mas daquelas realizadas pelos homens de bem e, por fim, devem comtemplar a própria alma daqueles que executam essas belas obras. (PANOFSKY, pg. 32)

O encantamento da obra, na experiência estética, estaria ligado ao encantamento da obra bela e seria um dos fatores responsáveis pela busca da compreensão conceitual, buscar, portanto, um conhecimento do Belo. A busca platônica pelo belo, não é o belo estético, mas a essência do belo. A beleza estética, embora subjetiva, é facilmente reconhecida, enquanto as outras virtudes, como justiça e sabedoria não são tão fáceis de reconhecer através do olhar. Na Grécia antiga, o bem, o belo, e a verdade (sabedoria) são entendidos como uma tríade inseparável.

Na República, a obra explora não só o governo da pólis, mas o governo da alma, o governo de si mesmo, Platão analisa o papel das artes na educação dos jovens, que como são muito impressionáveis, deveriam estudar apenas os “bons artistas”, pois esses “bons artistas” seriam aqueles que descrevem homens virtuosos do passado, de modo que os jovens se sintam inspirados a imitá-los e se tornarem bons.

O Belo no mundo sensível é o caminho condutor até o mundo das ideias, esse caminho é o amor, mas também se refere a Kalokagathia, que é o ideal pedagógico da sociedade grega de um indivíduo melhor, Kalo significa Belo e Kagathia, ser Belo e Bom. Assim temos a tríade inseparável: Belo, Bem e Verdade, Belo enquanto estético, pois diz a respeito da simetria, harmonia, cores, Belo enquanto moral, que é o equilíbrio das almas e por fim, o Belo enquanto intelectual, que se relaciona com a sabedoria. Essa tríade nos mostra que a preocupação de Platão na República, por exemplo, não é só com uma boa polis, mas também com as virtudes da alma, o governo da alma e de si mesmo.

 

Aristóteles e a Mimesis

 

Ao contrário de Platão, para Aristóteles a Ideia não possui uma existência separada da realidade. Conhecer a realidade significa, de alguma forma, conhecer a causa das coisas. Na teoria de Aristóteles existem quatro causas, a causa material, a causa motora ou eficiente, a causa formal e a causa final.

Segundo Aristóteles, a psuchê[2] é a forma do corpo vivo. Portanto, ao que Platão se referia como o mundo inteligível das Ideias, Aristóteles define a psuchê como forma causal de um corpo. Nesse sentido, todo corpo natural que tem vida é uma substância no sentido de composto de forma mais matéria.

Dessa forma, as quatro causas mencionadas anteriormente se definem como, a causa material que se refere aquilo do que é feito o objeto, a causa motora ou eficiente, ou seja, o que deu lugar a esse objeto, a causa formal, isto é, o que dá a forma ao objeto e a causa final ou teleológica, que é aquilo que um objeto visa, em outras palavras sua finalidade.

No caso de uma esfera de bronze, por exemplo, a forma se dá pelo formato esférico e a matéria é o bronze. No caso de um machado a sua forma se dá pela capacidade cortar lenha, enquanto que a matéria é a madeira talhada, ferro, ou seja, o que possibilita ao machado desempenhar a sua capacidade de rachar lenha. De maneira similar no corpo humano, o olho que, tem como forma a capacidade de ver, é composto por pupila, retina, músculo, entre outros. O animado (planta, animal, ser humano), por conseguinte, teria como forma a capacidade de viver, nutrir-se, perceber e de conhecer e a matéria seria o conjunto de órgãos, tecido, sangue, entre outras.

Aristóteles define a noção de necessidade hipotética que diz respeito à forma vinculada a matéria, por exemplo, se é machado, para que a sua capacidade de machado (rachar lenha) seja atualizado é preciso que a sua matéria seja composta de uma parte rígida e cortante de ferro, madeira talhada em formato cilíndrico, para que assim ele possa ser um machado completo e não apenas por homonímia.

Cada um dos sentidos possui uma explicação específica da sua constituição, assim como tudo da natureza se move e/ou se transforma de maneira característica e isto quer dizer, cada um tem uma natureza, Aristóteles busca compreender quais são as contribuições da matéria e suas propriedades à substância que ela instância.

Da mesma forma, o processo de abstração do ser humano se dá na medida em que ele usa o seus órgãos sensíveis para perceber o mundo sensível e a consciência do ato de pensar, universaliza verdades que deixam de ser particulares, por exemplo, determinar o conceito de ser humano, a partir da experiência sensível de ver pessoa x, y, ou z.

Percebe-se que a relação de Aristóteles com a matéria é completamente diferente da relação de Platão com o mundo sensível. Para Aristóteles, é preciso estabelecer uma relação entre o mundo sensível e a essência das coisas, uma vez que as duas estão intrinsicamente interligadas. Nesse sentido, a arte se baseia na imitação e isso se estende até as coisas que são desagradáveis, pois como vimos, a relação entre os órgãos e as suas capacidades estão combinadas, e Aristóteles precisa conhecê-los como um todo.

Portanto, a visão de uma pintura de olho exposto com todos os seus nervos e membranas é mais agradável do que um olho real. E, além disso, possibilita um aprendizado da matéria que compõe o órgão. A representação, isto é, a imitação nos causa certo prazer de contemplação. Como Aristóteles mesmo expõe, “Prova disso é o que acontece na realidade: das coisas cuja visão é penosa temos prazer em comtemplar a imagem quanto mais perfeita, as formas dos bichos mais desprezíveis e dos cadáveres.”[3]

Aristóteles afirma, “Imitar é natural ao homem desde a infância”[4], é a partir da imitação que possuímos os primeiros conhecimentos. A arte nesse contexto se configura como uma produção humana e o belo, por conseguinte, é atribuída a uma obra de arte quando esta segue determinados critérios de proporção simetria, entre outros. A arte é uma disposição para produzir conforme se segue as regras. E a mimesis tem o objetivo de se confundir com a realidade, busca na natureza uma verdade e na arte a perfeição na representação.

 

Cícero e Marsílio Ficino: os neoplatônicos e a arte

 

A teoria de Platão foi retomada por alguns autores, que ficaram conhecidos como neoplatônicos, entre eles temos Cícero e Marsílio Ficino. Ambos foram leitores de Platão e o utilizaram para construir as suas teorias. Cícero que pensou a arte como uma ideia interior e Ficino que a pensou como o esplendor da face de Deus.

A releitura de Platão feita por Cícero o levou a conceber as Ideias como um local não metafísico, mas uma realidade que reside no interior do artista. Este, por sua vez, tem o dever de exprimir essa realidade na obra de arte. A problemática que se insere nesse contexto é a seguinte: Mas o que confere a perfeição da Ideia se ela está no interior do artista? A resposta para essa questão está dividia em sua.

A primeira resposta parte de Sêneca ao afirmar que ao contrário do que pensam, não existe perfeição na Ideia expressa pelo artista. E a segunda resposta, adotada pelos neoplatônicos, consiste no fato de que a legitimidade metafísica atribuída a obra reside na concepção de que pelo intermédio de Deus as Ideias foram colocadas no artista.

Nessa concepção neoplatônica de belo, as experiências sensíveis entram com a importância de possibilitar um caminho para as Ideias, ou seja, para o mundo das formas. No entanto, essa Ideia da beleza encontra-se, segundo Cícero, no interior, ou seja, na alma humana de tal forma que podemos conceber interiormente coisas que sejam mais belas que as obras de Fídias, por exemplo, que eram levadas em grande estima em sua época.

Outra visão decorrente da teoria das Ideias de Platão e sua relação com o belo e a obra de arte são os comentários de Marsílio Ficino a obra O Banquete. Em seu comentário Ficino descreve como se dá a irradiação do belo presente em Deus às coisas sensíveis. Segundo ele, a beleza do corpo é um ato, um impulso, uma graça que nele se exprime sob influência de sua Ideia. O caminho para o Belo estaria separado em quatro dimensões. A beleza do corpo que é limitada a um lugar e se perde com o tempo; a beleza da alma que é constituída de uma infinidade de partes, e é livre no espaço, mas ainda limitada pelo tempo; a beleza do anjo; e a beleza de Deus. Sendo Deus a fonte de toda a beleza e de todo o amor.

Essa ideia é próxima à ideia de Platão do amor como uma escada na qual o ser humano deve ir ascendendo. Primeiro amando todos os belos corpos, passando a amar um só corpo, da beleza pessoal chega aos belos costumes, dos costumes ao belo aprendizado, por fim, àquele estudo particular que se ocupa da própria beleza e apenas dela, de forma que finalmente venha a conhecer a essência da própria beleza. Assim, para escapar das limitações dimensionais e ascender à verdadeira beleza, devemos caminhar do corpo à alma, da alma ao anjo e do anjo a Deus.

Ficino, tendo por base a filosofia platônica, define o belo como transcendente e incorpóreo e o amor como desejo de beleza. O amor seria em última instância a busca dessa “suma beleza”, que não se encontra no mundo sensível e é o próprio Deus, todo o desejo de beleza e o amor são, portanto, a busca e o desejo pela divindade.

Assim, o amor tem por finalidade o desfrute da beleza e, para tanto, o autor identifica que a beleza pode ser encontrada na alma pelo equilíbrio das virtudes e pode ser percebida pela inteligência. Nos corpos, pelo equilíbrio de diferentes cores e múltiplas linhas captadas pela visão. Nos sons o equilíbrio do acorde de várias vozes juntas é percebido pela audição. Por isso o amor se satisfaz somente nessas capacidades humanas (inteligência, visão e audição) que percebem a beleza.

Para Ficino essa emanação da face de Deus não pode ser considerada um corpo, pois mesmo que digamos que este ou aquele corpo é belo não podemos atribuir isso à matéria, até porque esse mesmo corpo pode ser belo hoje e amanhã, feio. A beleza é, segundo ele, incorpórea por estar não só na matéria, mas também na alma e no som. Ela agrada a alma que recebe espiritualmente a imagem desse corpo através da visão que não seria capaz de receber corporalmente a beleza de corpos e transmiti-la a alma. Por isso, mesmo que a beleza se refira a um corpo exterior será incorpórea.

A beleza é comparada à luz e sua emanação, portanto, a luz pura e única seria a beleza de Deus que refletindo e sendo corrompida por sombras chega à matéria. Nessa comparação Ficino visa ilustrar como Deus não se deixa enganar pela beleza do anjo que é sua sombra, nem o anjo pela beleza da alma, que é mais corrompida por sombras que sua própria beleza. Porém, a beleza da alma se deixa encantar pelas formas corpóreas e negligencia sua própria beleza apegando-se à sua sombra.

 

A Idade Média

 

O legado platônico na construção da cultura ocidental é imenso, e os seus desdobramentos chegaram à Idade Média. Autores como Panofsky (1994) definem a concepção estética neoplatônica da época como: a beleza visível que representa apenas o reflexo de uma beleza invisível, sendo esta, por sua vez, apenas o reflexo da absoluta beleza; essa concepção estética, tão curiosamente de acordo com as próprias características do 'espírito simbólico', pelo qual as artes da baixa Antiguidade se distinguem daquelas da Antiguidade clássica, pôde ser retomada, facilmente e sem modificação, pela filosofia paleocristã.

Percebe-se, dessa forma, que a concepção de arte como um caminho para o mundo das Ideias permaneceu no pensamento neoplatônico e adentrou a Idade Média. No entanto, o que se destaca desse período é o entendimento do belo na obra de arte como voltada para a valorização do espírito. Os valores cristãos estavam impregnados nas obras de arte feitas neste período. Deus era o centro e medida de todas as coisas.

No século IX, o pensamento filosófico medieval tem como questão a relação e harmonização da fé e da razão. A Escolástica foi bastante influencia pelos neoplatônicos e combinava os valores cristãos com os pensamentos de Platão. A arte nos da a contemplação de um tipo de beleza que através do artista se transfere a matéria, ou seja, o artista é um mediador entre Deus e o mundo material.

As ideias são as formas ou os princípios originários das coisas, não são passíveis de mudanças e são eternas, consistem em legitimar as realizações do espírito humano e, portanto, estabelecem as condições para um conhecimento certo. Logo, a arte é a expressão na matéria de uma imagem interior, dividida em três aspectos: (1) no interior do artista, (2) no instrumento utilizado e (3) na matéria que recebe a forma da arte.

 

O Renascimento

 

Posteriormente no renascimento, o conceito de Ideia será desprovido dessa noção a priori da busca de um mundo transcendente e caberá ao artista a autonomia de se conectar com essa busca pela perfeição através de si mesmo. A subjetividade será valorizada, em detrimento de postulados dados e empiricamente estabelecidos, a busca pela perfeição do mundo inteligível será um objetivo, na medida em que o artista e mais precisamente, o verdadeiro artista, estabelece as suas próprias regras.

A mimesis é tida como princípio para a obra de arte que visaria imitar a natureza tal como esta se apresenta aos sentidos. A teoria que deu base para esse conceito no Renascimento foi a doutrina de Aristóteles da mimesis. Na contramão de rejeitar a mimese por conta de ser uma cópia desfigurada do real, podemos entender tais obras de arte partindo de que “a imitação implica não uma relação de identidade, mas uma relação de semelhança ou analogia” (Ribon, 1991). Isso porque a pintura estava intimamente ligada ao conhecimento, nesse sentido Ribon (1991) afirma que a pintura não era simplesmente o espelho das aparências naturais, mas um meio de conhecer as razões ou as causas dessas últimas e de realizar uma encarnação da substância da natureza: as formas da natureza naturada deviam tornar sensível a ação da natureza naturante.

Ou seja, ao imitar a natureza como ela se apresenta aos sentidos, não é simplesmente reproduzir aquilo que os sentidos já captam, mas sim tentar entender aquilo que é intrínseco a ela e a forma como tal, isto é, tentar encarnar a natureza naturante.

No renascimento temos o homem como criador, intelectual, de posse de conhecimentosmatemáticos para mimetizar o mundo. Com isso, Brunelleschi, artista florentino doséculo XV, cria um grande movimento da arte nesse período, que é a invenção de umnovo sistema de representação do espaço. Brunelleschi, segundo Francastell, pensa em uma nova visão de espaço e isso édemonstrado pela cúpula de Santa Maria de l Fiore, na qual Brunelleschi fez parte dafinalização, pois na cúpula não há uma ideia de um sistema fechado, mas sim de umsistema geométrico que se relaciona com todo o universo:

 

Instrumentalização do belo no nazismo

 

No documentário “Arquitetura da Destruição” de Peter Cohen, apresenta-se o uso da arte feita por Hitler. Nessa apropriação do belo feita por ele as propagandas ao nazismo, os desfiles, os uniformes, e até mesmo as insígnias militares transmitiam uma ideia de higienização estética e bom uso da noção grega de beleza. Cohen sugere que Hitler arquitetou os seus planos como uma grande ópera. De fato, Hitler vê na opera Rienzi de Wagner fonte de inspiração.

Na obra, que se passa na Roma medieval, Rienzi é um porta-voz do povo que luta com a aristocracia e quer restabelecer a república romana da Antiguidade. Mas, vítima de conspiração, Rienzi acaba morrendo queimado. Além de Wagner, Hitler tinha outras duas fixações: Linz, sua cidade natal, e a Antiguidade.

A ideologia nazista consistia na ideia de um mundo harmonioso, defendendo também um ideal de belo estético. Tudo que ia contra a esse ideal era considerado danoso e digno de eliminação, nesse contexto os deficientes, os mestiços e os judeus deveriam ser eliminados para a proteção do que se colocava como o “corpo do povo alemão”. Hitler igualou princípio de beleza e saúde, dessa forma, o médico passou a ser visto como um perito em estética. Contudo, o ideal de beleza foi muito mais além que apenas os corpos, essa preocupação atingiu diversas outras áreas, como afirma Kangussu na resenha do filme A questão estética no nacional-socialismo.

Limpeza foi o lema da “Beleza no trabalho”, “trabalhadores limpos em locais limpos” era seu slogan. Pretendia-se libertar os trabalhadores livrando-os do estigma da  sujeira. Considerava-se que se o trabalhador fosse elevado, através da limpeza e da beleza, ao nível da burguesia, ele entenderia que não havia razões para a luta de classes. (Kangussu, p.2)

Hitler seguindo a sua ideia de higienização da arte faz as exposições de “arte degenerada”, que exemplificam o que deve ser evitado. Dessa forma, essa arte degenerada era considerada corruptora do intelecto e do espírito. Como colo Kangussu:

A ofensiva contra a arte moderna tinha caráter “higiênico”.  A arte moderna, segundo os nazistas, mostrava sinais da doença mental de seus criadores. O teórico Paul Schultze-Naumburg mostrava fotos de deformações reais, tiradas de revistas médicas, comparando-as com obras de arte moderna e conectando degeneração com perversão artística. A arte deveria ser o espelho da saúde racial, sua referência deveria ser, portanto, a Antigüidade Clássica e o Renascimento. Como as esculturas gregas, deveria expressar o desejo – atribuído ao povo – de representar a raça ideal. Ao passo que, na arte moderna, nada poderia ser identificado além da desgraça observada em hospitais e manicômios, onde se reuniria a degeneração da espécie. Visão que precisaria ser banida, para sempre, da “nova Alemanha”. (Kangussu, p.2)

 

Era da veneração e era da beleza pura

 

A Alemanha era o centro da arte no pós-guerra e as suas obras tentavam de alguma forma representar o sofrimento, o conflito. As obras possuíam figuras angulosas e transmitiam a ideia de espaço confinado. O que vemos nesse ponto é uma reconfiguração na relação do indivíduo com a arte.

Fiat ars, pereat mundus” são essas as palavras de ordem do fascismo que, como Marinete reconhece, espera obter na guerra a satisfação artística de uma percepção sensível modificada pela técnica. Reside nesse fato, a perfeita realização da arte pela arte. Na época de Homero, a humanidade se oferecia em espetáculo aos deuses do Olimpo, ela agora se converteu no próprio espetáculo.

Percebemos que a arte resiste ao tempo, contudo, cada sociedade, para ela, o que Gérard Lebrun, no texto A mutação da obra de arte, chama de fim de um ciclo semântico.

Hoje se tornou trivial recordar que o nosso conceito de “obra de arte” é de formação recente, - que a distinção entre artista e artesão se impôs no fim do século XVII, - e que um grego do IV diante de Doríforo de Policleto ou um monge do século XIII em frente de uma Virgem gótica seguramente não tinham a sensação de contemplarem uma coisa destinada a proporciona-lhes um prazer estético. E isso pela boa razão que a noção de ‘prazer estético’ também é um achado recente – assim como a própria ‘estética’, enquanto estudo da beleza na arte (LEBRUN, 1983, p.3)

A mutabilidade na semântica do conceito de arte apresentado por Lebrun demonstra esse caráter da estética como um processo em mutação. Entender o que é belo na obra de arte significa entender um contexto histórico de cada sociedade.

Atualmente, por exemplo, possui-se uma relação com a arte diferente, as mídias atuais e a tecnologia desvirtuam o que Lebrun chama de aura da obra de arte. Segundo ele, antes o que era “ame o que nunca será visto duas vezes” passa a se tornar público e de fácil alcance, a divulgação por televisão, fotografia transformam a experiência estética.

Walter Benjamin no seu livro A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica atesta o declínio da aura da obra através das fotografias de Atget, que registrou, por volta de 1900, as ruas parisienses desertas de seres humanos. Segundo Benjamim, as fotos representavam a cena do local de um crime, a morte da aura da obra de arte.

Deste modo, a investigação estética se molda de acordo com a maneira que cada sociedade lida com a arte, como essa sociedade olha para o produto e o interpreta. Com efeito, a questão principal a ser discutida é o meio pelo qual se busca a experiência estética, ao entender as particularidades de um processo mutável conforme a maneira com que as pessoas lidam com o conceito de arte.

 

Referências Bibliográficas

 

FICINO, M., Comentário sobre O Banquete de Platão. in Lichenstein, Jaqueline (org.) A Pintura, vol 4: o belo. S. Paulo: Ed 34, 2004, p. 42-56.

Gérard Lebrun, “A mutação da obra de arte” em Emmanuel Carneiro Leão et al. Arte e Filosofia. Rio de Janeiro: FUNARTE/INAP, 1983.

PANOFSKY, Erwin. Idea: contribuição à história do conceito da antiga teoria da arte.S. Paulo: Martins Fontes, 2013.

RIBON, Michel. A arte e a natureza. Campinas, SP: Papirus. 1991.

Peter Cohen. Arquitetura da Destruição. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=IBqGThx2Mas . Acessado em 26/04/2015

Imaculada Kangussu. A questão estética no nacional-socialismo. Disponível em: https://www.dropbox.com/sh/7c7bswfykn5x3vj/AABGLRQZo18i098JXr99EuCZa/Arquitetura%20da%20destrui%C3%A7%C3%A3o/Imaculada%20Kangussu_arquitetura_da_destrui__o.doc?dl=0. Acessado em 26/042015

 

Notas: 

[1] “Platão imitação, obra e simulacro (A república, o sofista)” in Lichenstein, Jaqueline (org) A Pintura, vol"5:"da"imitação"à"expressão."S."Paulo:"Ed"34,"2004,"p."17W22)"

[2] Nota de rodapé

[3] Poética IV

[4] Poética IV

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