Análise de poemas
Por: Samantha S.
10 de Abril de 2018

Análise de poemas

Análise do poema "L'étoile a pleuré rose..." de Arthur Rimbaud

Literatura literatura francesa Poesia poema tradução Interpretação

 

L'étoile a pleuré rose au cœur de tes oreilles,

L'infini roulé blanc de ta nuque à tes reins

La mer a perlé rousse à tes mammes vermeilles

Et l'Homme saigné noir à ton flanc souverain.

(Arthur Rimbaud)

 

A estrela rosa gemeu no coração de teus ouvidos,

O infinito rolou branco de tua nuca aos teus quadris,

O mar perolou vermelho em teus rubros seios

E o homem sangrou negro em teus flancos senhoris.

(Traduzido por Samantha de Sousa)

 

 

Numa Visão global do poema, podemos observar o êxtase sexual transfigurado na imagem do nascimento da deusa Vênus, da mitologia romana, esta imagem se constroi a partir da associação de elementos da natureza ao corpo feminino, além das ações que os une. Comecemos esta análise a partir da seleção vocabular apresentada no poema, dentre os elementos da natureza temos a estrela, o infinito (que bem poderia ser o universo, o cosmo) e o mar, todos eles nos dão a ideia de distância e sublimação, no último verso é apresentado o homem, o ser mortal e limitado. Cada elemento executa/sofre uma ação: “l’étoile a pleuré”, l’infini roulé”, “la mer a perlé” e “l’homme saigné”. Cada ação está ligada a uma cor, respectivamente o rosa, o branco, o vermelho e o negro. Cada ação está ligada a uma parte do corpo feminino: orelhas, nuca e rins, seios e flanco. Cada item tem um poder representativo dentro do sentido atribuído ao poema.

Relembremos, primeiramente, o mito, para então prosseguir na análise do poema: a véspera do nascimento de Vênus fora de um dia de guerra. Saturno enfrentava seu pai, Urano, pelo poder sobre o universo. Com um machado, Saturno decapita a genitália do pai, o órgão cai no mar e este se agita em ondas e espuma, o mar se avermelha com o sangue. Quando a noite se recolhe, chega uma aurora cor-de-rosa, as águas ainda agitadas dão origem à mais bela criatura até então nunca vista, é a deusa Vênus, que rende com sua beleza os deuses, e posteriormente, até mesmo os homens.

Retornemos ao poema, cada elemento executa uma ação no corpo feminino: a estrela, numa tradução literal “grita” ou “chora” rosa ao fundo das orelhas da mulher, entretanto, acredito ser mais conveniente interpretar tal verbo dentro da própria língua original do poema, o verbo “pleuré” tem como sinônimo o verbo “gémir”, gemer, em nossa língua, sugestão mais próxima ao sentido geral do poema, há na ação de gemer uma conotação sexual. Ao verbo está associado um adjunto adverbial (rosa), lembremos que a deusa surge numa aurora cor de rosa, momento em que a estrela da manhã impera no céu.

No segundo verso, o infinito “rola” ou “escorre” branco da nuca até os rins, por “rins” compreende-se a região do quadril, nuca e quadril são então duas regiões de forte sensualidade no corpo feminino, pra explicar a este infinito que escorre branco no corpo da mulher é preciso abrir um rápido parêntesis: durante muito tempo e em muitas culturas concebeu-se o esperma como um líquido sagrado, pois a ele era atribuída a vida, o próprio Aristóteles acreditava que era o sêmen que dotava a criança de alma e, até o século XVIII, creditava-se apenas ao homem a reprodução, a mulher era apenas um receptáculo para o ser gerado, muitos pesquisadores acreditavam que a ejaculação aproximava o homem de Deus e este ato extraia o que havia de mais puro no sangue, uma parte da energia vital e da alma do homem. Diante disso, fica clara a associação da ejaculação a um processo cosmogônico, a associação do esperma ao Cosmo, um universo, além de uma imagem extremamente erótica que surge esta associação: o infinito branco que escorre no corpo da mulher, o sêmen ejaculado na nuca da mulher e escorre até seu quadril.

A outra imagem é o mar que se torna em pérolas avermelhado diante dos seios vermelhos, atentemo-nos aos adjetivos utilizados no poema: “rousse” que seria um vermelho mais vibrante e “vermeilles”, um vermelho mais fechado, à ação de perolar pode-se associar a espuma do mar, que se agitava em contato com o esperma de Urano e gerava a deusa Vênus, o elemento “pérola” também está ligado à feminilidade. A cor vermelha, além de estar ligada ao embate entre Saturno e o pai, também pode significar simbolicamente a sensualidade, a paixão e a fertilidade, que são atributos da deusa vindoura.

No último verso é-nos apresentado o homem rendido ao corpo da mulher, “l’Homme saigné noir”, o homem sangra e seu sangue é negro, a cor preta está associada à morte e também à vida, lembrando que as imagens do poema estão ligadas ao orgasmo, que é considerado uma pequena morte, além disso, o negro, que é a ausência da luz, está em contraste com as cores vibrantes que caracterizam o ser feminino (rosa, branco e vermelho), o homem sangra no flanco soberano da mulher, o flanco (cintura) é outra parte do corpo feminino a qual se atribui a sensualidade. Tanto o homem, quanto os elementos da natureza anteriormente apresentados, servem à composição de um ser feminino em estado de gozo, um ser divinizado.

L’étoile a pleure rose é um poema erótico, que através de imagens e inferências fortes reproduz o mistério do gozo sexual.

Referências:

FRANCHINI, A. S. As cem melhores histórias da mitologia: deuses, heróis, monstros e guerras da tradição greco-romana. 9 ed. Porto Alegre : L&PM, 2007.

 

 

 

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