A Atuação da Defensoria Pública na defesa da Moradia
Por: Fabiano P.
19 de Junho de 2021

A Atuação da Defensoria Pública na defesa da Moradia

Direito defensoria Direitos Humanos Direitos Sociais Direitos constitucional

A ATUAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA NA PROTEÇÃO DO DIREITO À MORADIA POR MEIO DA TUTELA POSSESSÓRIA COLETIVA

THE PERFORMANCE OF THE PUBLIC DEFENDER IN THE PROTECTION OF THE RIGHT TO HOUSING THROUGH THE GUARDIANSHIP OF COLLECTIVE POSSESSION

 RESUMO

O direito à moradia ganhou nas últimas décadas, graças à Constituição Federal de 1988, um status diferente dentro do ordenamento jurídico. A carta magna sagrou este como um direito de ordem social e, além disso, institui, em seu artigo 23, como competência dos entes federados, União, Estados e Municípios, promover programas que busquem melhorar as condições habitacionais da população. A partir deste marco normativo, o tema referente à moradia ganhou novas proporções e a ideia de ocupação do espaço urbano uma nova formatação. Infelizmente a aplicação da norma constitucional encontrou óbice na realidade social brasileira. O modo como o espaço urbano foi distribuído e ocupado ainda reflete as desigualdades surgidas durante as primeiras décadas do século XX e, por conseguinte, dificulta a garantia efetiva do direito. Nesse contexto, tem cabido ao judiciário, em especial à Defensoria Pública, tomar medidas que busquem mitigar as disparidades fáticas. O presente trabalho busca analisar o papel que a instituição da Defensoria Pública tem tido na defesa, particularmente em sede coletiva, na tutela e salvaguarda desse direito.

PALAVRAS-CHAVE: Tutela Possessória; Direito à moradia; Direito Urbanístico.

ABSTRACT

The right to housing has gained in recent decades, thanks to the Federal constitution of 1988, a different status within the legal framework. The Magna Carta has been a social right and, moreover, establishes, in article 23, the competence of the federate entities, the Union, states and municipalities, promote programs that seek to improve the house conditions of the population. From this normative framework, the theme regarding housing has gained new proportions and the idea of occupying urban space a new format. Unfortunately, the application of the constitutional norm found it obvious in the Brazilian social reality. The way in which the urban space was distributed and occupied still reflects the inequalities that emerged during the first decades of the twentieth century and, therefore, hinders the effective guarantee of the right. In this context, the judiciary, in particular the Public Defender's Office, has to take measures that seek to mitigate the phatic disparities. The present work seeks to analyze the role that the institution of the public defender has had in the defense, particularly in the collective headquarters, in the guardianship and safeguard of this right.

KEYWORDS: Collective Possession; Right to Housing; Urbanistic Law.

 

INTRODUÇÃO

            A urbanização do Brasil, assim como a maioria dos processos que impactou de forma considerável a organização social e econômica, realizou-se de maneira desregrada. Os primeiros governos nacionais, tanto o imperial, quanto o republicano, promoveram políticas de ocupação do espaço territorial brasileiro, principalmente em âmbito rural, por meio da viabilização de fluxos de imigrantes europeus e asiáticos. Enquanto a principal preocupação do governo era o preenchimento do vazio demográfico nas regiões norte e centro-oeste do Brasil, as grandes metrópoles, como São Paulo e Rio de Janeiro, cresciam de maneira desenfreada. Foi justamente nesse período, entre final do século XIX e inicio do século XX, que surgiram as primeiras favelas brasileiras.

Posteriormente na primeira metade do século XX, iniciou-se, em várias cidades brasileiras, o processo de modernização e reurbanização. A europeização do tecido urbano das metrópoles brasileiras socialmente teve um custo alto. As populações pobres que ocupavam os centros, e regiões adjacentes dessas cidades, foram removidas e transferidas para as periferias. Famoso é o caso da Vila Kennedy no Rio de Janeiro, que foi criada em 1963, nos arredores da então capital federal, como alternativa da política habitacional para a solução do problema das favelas e hoje se tornou um dos bairros mais violentos da Zona Oeste do Rio.

            Ao se abordar a ocupação do espaço territorial urbano sob o viés jurídico é necessário que se vá além da análise econômica e social das políticas habitacionais. Sob o aspecto legal, é necessário, a priori, que se identifique sua principal característica, qual seja, a ambiguidade entre a quantidade de legislação e normas reguladoras e o elevado grau de descumprimento dessas mesmas normas. Embora o Brasil tenha nas últimas décadas adotado uma série de medidas legislativas, como o Estatuto das Cidades, e administrativas, como as diversas políticas públicas em nível nacional, estadual e municipal, que denotam a importância das políticas habitacionais, inclusive reafirmando o caráter constitucional do direito a moradia, permanece a cultura de que na ocupação do espaço prevalecem os interesses políticos e econômicos em detrimento daqueles que mais beneficiem a população como um todo.

            Nesse contexto, o poder judiciário tem tido papel de relevante importância, visto que, na falta do Estado, este cumpre a função de garantir as prestações positivas do Estado. Igualmente importante, é o papel da Defensoria Pública, que patrocina o interesse individual e, nesse caso devido a própria natureza do direito, o coletivo.

Este trabalho busca analisar a atuação do referido órgão nesses conflitos, levantando no primeiro item a natureza constitucional do direito possessório, no segundo, por sua vez, analisar-se-á, de forma específica, a atuação da Defensoria Pública na tutela em âmbito individual e coletivo desse direito e as ferramentas processuais existentes para que isso seja realizado. A elaboração do presente foi feita com o emprego dos métodos dedutivo e indutivo, realizando-se para a sua produção a pesquisa, coleta e análise de material bibliográfico sobre o tema.

  1. O DIREITO CONSTITUCIONAL À MORADIA

            Após a segunda guerra mundial, iniciou-se na parte continental na Europa, uma movimentação, influenciada principalmente pela doutrina do teórico austríaco Hans Kelsen, que tinha como principal objetivo reconduzir o texto constitucional a um novo patamar de relevância. A reconstitucionalização dos Estados europeus propiciou a conversão do status quo do texto constitucional e, junto do fortalecimento da democracia, formou o modelo político do Estado democrático de direito. A função da Constituição passou de simples texto ideológico e programático, para assumir a função de núcleo e fundamento de todo um sistema jurídico.

            No Brasil, o processo de reconstitucionalização se deu com a promulgação da Carta Magna em 1988. Esta foi responsável por cristalizar uma série de direitos relevantes para a garantia daquilo que foi preconizado como um dos fundamentos da República e da ordem constitucional, a dignidade da pessoa. Foi nesta Constituição que o direito à moradia foi consagrado como tal.

            Embora já fosse norma constitucionalmente positivada, esse direito só foi expressamente reafirmado com a Emenda Constitucional 26 de 14 de fevereiro de 2000, após doze anos de promulgação da Constituição. Atualmente, resta claro a sua natureza como direito fundamental, autônomo e de ordem existencial. Além disso, houve um esforço legislativo e jurisprudencial para delimitar o seu conteúdo material, visto que a norma constitucional não o desenvolve substancialmente. Trata-se, portanto, de uma norma flexível que pode ter seu sentido estendido com base em meios interpretativos e de acordo com o sistema internacional de proteção dos direitos humanos. Este, no entanto, não pode prescindir a relação entre este direito com o princípio da dignidade da pessoa humana, em especial seu aspecto garantista, necessário para a manutenção de um parâmetro mínimo de qualidade de vida que garanta condições para a sua existência decente. (SARLET; MARINONI e MITIDIERO, 2017, p. 682).

            Embora seja um direito constitucional, no plano real, são diversas as dissensões que surgem em sede do direito à moradia. No Brasil contemporâneo, identifica-se nos centros urbanos o principal meio onde problemas fundiários se desenvolvem. A concentração de propriedade, somada a especulação imobiliária e a incapacidade das políticas habitacionais faz surgir conflitos entre dois grupos sociais diametralmente opostos no cenário da ocupação do espaço urbano. De um lado se encontram proprietários de imóveis desocupados e sem nenhuma função social e do outro se encontram indivíduos a margem do processo de urbanização que, como meio de garantir um teto por pelo menos alguns dias, invadem esses imóveis. (CARVALHO; RODRIGUES, 2014, p. 6). A partir da ocupação desses locais, inicia-se um processo que culmina em uma série de efeitos sociais, econômicos, políticos e jurídicos. Os chamados conflitos fundiários são definidos pelo artigo 3º da Resolução n.º 87 do Ministério das Cidades (BRASIL, 2013, p. 19, apud CARVALHO; RODRIGUES, 2015, p. 6) como sendo a: “Disputa pela posse ou propriedade de imóvel urbano, bem como impacto de empreendimentos públicos e privados, envolvendo famílias de baixa renda ou grupos sociais vulneráveis que necessitem ou demandem a proteção do Estado na garantia do direito humano à moradia e à cidade”.

            Ademais, em se tratando dos conflitos fundiários é importante ressaltar que quanto a esses imóveis desocupados recai a falta daquilo que a Constituição Federal preconiza no seu artigo 5º, XXIII, a Função Social. Nos imóveis urbanos a noção de função social perpassa o seu uso principalmente para fins de moradia. Sob esse escopo, a propriedade urbana que não cumpre sua função social é aquela que frustra três requisitos alternativos: a) não estar edificada; b) estar subutilizada; c) não estar sendo utilizada. O cumprimento da função social torna-se o limite para o exercício do direito a propriedade, portanto, por meio de uma interpretação sistemática da Constituição, este só está garantido ao indivíduo que atender a este requisito no uso e fruição de seu bem imóvel. (VELOSO; PEIXOTO; FABER, 2017, p. 128).

1.2. Direito à moradia e a relevância da posse

            O direito à moradia hoje assume uma acepção razoavelmente mais complexa e que ultrapassa o simples conceito de possuir um teto ou abrigo. De acordo com o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos e Sociais (PIDESC) da Organização das Nações Unidas (ONU), do qual o Brasil é signatário, aduz que a moradia adequada, do ponto de vista que busca garantir as condições mínimas de vida, deve possuir as seguintes características: I. Segurança jurídica da posse; II. Disponibilidade dos serviços, materiais, benefícios e infraestrutura; III. Gastos suportáveis; IV. Habitabilidade; V. Acessibilidade; VI. Localização; e VIII. Adequação cultural (ONU, 2014, p. 2, apud CARVALHO; RODRIGUES, 2015, p. 4).

Dentre os pontos elencados pelo texto normativo internacional, cabe ressaltar o uso do termo segurança jurídica da posse. Ao abordar a posse, a ONU procura ampliar a efetividade daquilo que é estabelecido em sede do Direito Internacional. Além da celeuma em relação a soberania estatal, grande parte dos textos normativos internacionais são de caráter puramente programático ou ideológico, o que dificulta, a depender do ordenamento jurídico, a aplicação do instituto. No Brasil, por exemplo, durante muitos anos foi muito comum que as normas internacionais das quais o país fosse signatário não tivessem nenhuma aplicação devido a necessidade de sua recepção na ordem jurídica nacional. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, um dos principais instrumentos do sistema interamericano de Direitos Humanos, embora assinada em 1969, só entrou em vigor no país em 1992.

Ainda sobre esse aspecto a ONU, por meio do Comentário Geral n.º 4 do Comitê de dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (DESC), esclarece que em qualquer tipo de ocupação “[...] todas as pessoas devem possuir um grau de segurança de posse que lhes garanta a proteção legal contra despejo forçado, perturbação e qualquer tipo de outras ameaças” (ONU, 2014, p. 7, CARVALHO; RODRIGUES, 2015, p. 4).

  1. A ATUAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA NA TUTELA DO DIREITO À MORADIA E AS FERRAMENTAIS DISPONÍVEIS EM ÂMBITO PROCESSUAL

            Por um lado existe o direito constitucional à propriedade que, no cenário político e social brasileiro, colide com o direito a moradia,  sendo a proteção da posse também um direito fundamental com grande relevância social.  A ocupação urbana de forma coletiva, como decorrência do direito à moradia, em terrenos improdutivos ou abandonados é uma das funções institucionais da Defensoria Pública. Essas ocupações são as que dão origem as ações possessórias.

            No Código de Processo Civil de 2015, essas ações possuem um capítulo próprio, compreendidos entre os artigos 554 e 566. O CPC não trouxe mudanças significativas no modo como as ações possessórias eram tratadas no Código de 1973. A principal diferença entre ambos se encontra, principalmente, na regulamentação da legitimidade coletiva e a possibilidade de que nesses conflitos possessórios se opere a mediação. São nessas hipóteses em que a Defensoria Pública atua e o legislador ao elaborar o Código reconhece a importância da ação desse órgão como função essencial à justiça, bem como instrumento da ordem democrática. (DE PAULA, 2017, p. 52).

            A atuação da Defensoria tem como objetivo principal o de realizar a regularização fundiária. Este processo envolve uma série de medidas jurídicas (onde diretamente atua o órgão), sociais, urbanísticas e ambientais que visam a legalização e integração da ocupação no contexto maior das cidades. Muitos dos assentamentos localizados nas periferias sofrem com a falta de acesso a serviços básicos, como saneamento, coleta de lixo e assistência médica. Portanto, é importante ressaltar que a regularização está intrinsecamente correlacionada com a garantia não apenas do direito fundamental à moradia, mas a todo um arcabouço de institutos que visam a proteção da dignidade da pessoa humana e nesse caso da garantia do exercício da cidadania e do impedimento da discriminação e marginalização daqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade socioeconômica.

            Os tipos mais comuns de irregularidade fundiária são de duas ordens, a dominial e a urbanístico-ambiental. No primeiro caso aquele que ocupa um espaço público ou privado não possui garantia jurídica da manutenção de sua posse por ausência de título legalmente válido. Já no segundo caso, a irregularidade ocorre quando existe a falta de cumprimento da legislação urbana e ambiental. Devido a relevância e a amplitude de direitos que a realização de uma regularização fundiária afeta, é comum que exista na Defensoria Pública órgãos ou núcleos de atuação especifica que são destinados a agir em demandas desta natureza. (DPE/MT, 2012).

            Como exemplo, pode-se citar o Núcleo de Habitação e Urbanismo (NHU) da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, criado em 2006. A missão deste de acordo com o órgão é “servir de instrumento de luta das comunidades carentes pela promoção do direito à moradia e do direito à cidade, de modo a garantir o bem de todos e a dignidade de cada um como pessoa humana” (NASSAR, 2011).

            Em sede processual, a atuação da Defensoria Pública é principalmente realizada em âmbito do processo coletivo. A redação dada ao artigo 104 da Constituição Federal, pela Emenda Constitucional n.º 80 de 2014 reafirmou a competência de atuação do órgão em sede coletiva em todos os graus de forma judicial e extrajudicial. As ocupações fundiárias são geralmente formadas por diversas famílias que possuem como liame instituidor de relação jurídica, e consequentemente àquilo que os caracteriza como uma coletividade, a ocupação da terra sem que exista uma regularização fundiária que possibilite o uso e fruição na forma da lei.

            Sobre esse aspecto, cabe ressaltar que no caso em tela, trata-se de direito coletivo individual homogêneo, ocupando a classe do direito coletivo que a priori é individual, mas devido a situação fática, é tratado de forma coletiva.

            A Defensoria vinha atuando nas últimas décadas majoritariamente por meio de ajuizamento de ações civis públicas. Nestas o órgão figura como substituto processual dos titulares do direito objeto do litigio, fazendo uso da legitimidade extraordinária, ondem defende interesse alheio em nome próprio, que lhes é garantida pelo artigo 5º, II, da Lei n.º 7.347/2018 que regula as ações civis públicas.

Na maioria dos casos em que o órgão figurava como parte existia sempre um risco iminente à posse dos moradores, como uma ação de reintegração de posse promovida pelo proprietário do local ocupado. O papel predominantemente reativo da Defensoria teve uma mudança crucial a partir do novo Código de Processo Civil de 2015. (NASSAR, 2011).

O Código de Processo Civil (CPC) trouxe uma série de alterações no Capítulo que dispõe a respeito das ações possessórias. Estes lograram avanço principalmente no tocante à facilitação da atuação da Defensoria, como patrocinadora do direito dos hipossuficientes, seja em caráter processual em juízo ou anteriormente à instauração da ação possessória propriamente dita, possibilitando que ocorresse a quebra do padrão no qual a Defensoria só era acionada como último recurso de defesa das partes lesadas.

À princípio, dentre as mudanças, destaca-se o previsto do § 1º do artigo 554, este determina que, nas ações possessórias em que figurem grande número de pessoas no polo passivo, desde que em situação de hipossuficiência financeira, a Defensoria Pública deverá ser obrigatoriamente intimada para que tome as medidas, guardadas as proporções de seu papel processual como terceira interessada, que julgar necessárias para a efetiva salvaguarda do direito à moradia e dos que naturalmente se correlacionem com este.

Nesse caso, a defensoria atuará como custus vulnerabilis et plebis, assumindo lugar de interveniente na tutela dos interesses dos hipossuficientes e não o de representante da parte, como no caso das ações civis públicas. O modo de intervenção do órgão é suis generis e tem sido definido doutrinariamente como atuação de terceiro interessado em nome próprio, em consonância com as competências institucionais de defesa da dignidade da pessoa humana, da redução das desigualdades sociais, na afirmação do estado democrático de direito, bem como na prevalência e efetividade dos direitos humanos.

Antes de se fazer analisa da segunda alteração trazida pelo novel CPC é necessário que se compreenda o peso que existe no lapso temporal desde o início da ocupação até a propositura da ação possessória. A posse do local ocupado pode ser de força velha ou de força nova e, a depender de qual das forças se configure, irá influir de forma significativa no andamento processual. A posse de força velha é aquela que existe há mais de um ano e um dia e da força nova a que subsiste há período menor que o de um ano e um dia.

O referido é importante tendo em vista o previsto no artigo 562 do CPC. Segundo a norma, a ação que for fundada sobre ocupação de força nova terá proferida pelo juiz medida liminar, inaudita altera pars, que decida pela manutenção ou reintegração de posse do local objeto da ação. No entanto, de acordo com o que aduz o artigo 565, caso a posse seja de força velha, a liminar não poderá ser concedida pelo juiz sem que este designe audiência de mediação. Mais uma vez a Defensoria Pública será, conforme o § 2º, intimada caso haja parte hipossuficiente no polo passivo da demanda, intimidada para comparecer na audiência como terceira interessada.

As mudanças realizadas na sistemática do CPC servem para ampliar a proteção dos sujeitos que são dotados de grave vulnerabilidade na dinâmica processual. Um dos pontos que o CPC reitera é do que deve haver obrigatoriamente a existência de hipossuficiente para que a defensoria seja intimidada.

Nesse diapasão, cabe destacar que a Defensoria é essencial e constitucionalmente incumbida de promover o direito daquele que, de acordo com o artigo 134 e o inciso LXXIV do artigo 5º, não possui recursos insuficientes para defender seu direito em juízo, o hipossuficiente econômico.

            Nos últimos anos, tem prevalecido uma tendência, consagrada principalmente quando o litígio é de natureza coletiva, de se ampliar o conceito de hipossuficiência. O alargamento do que se entende como hipossuficiência tem se demonstrado necessário, visto que, muito graças ao Código de Defesa do Consumidor, percebeu-se que o critério econômico não é suficiente para indicar que determinado indivíduo se encontra em caráter de vulnerabilidade. Admite-se, portanto, a existência de uma definição dada por outros denominadores, como é o caso da hipossuficiência técnica que ocorre nos casos em que à parte vulnerável falta conhecimento técnico-científico.

A ampliação de correlaciona com todo o sistema que garante ao individuo o acesso à justiça, como o extenso rol de garantias constitucionais e processuais, como o princípio do contraditório e ampla defesa e o da inafastabilidade da jurisdição. Limitar o conceito de hipossuficiência ao aspecto puramente econômico não é o melhor modo para que se dê total efetividade ao acesso à justiça, visto que o conceito atualmente dado ao instituto é o de que se trata de direito fundamental que ultrapassa a simples noção de acesso à jurisdição e envolve uma dimensão social muito mais ampla.

CONCLUSÃO

            O papel da Defensoria Pública nas ações possessórias coletivas se revela no atual estágio social e econômico um trabalho de grande relevância. A regularização fundiária realizada pelo órgão é importante para garantir o direito à moradia e, além disso, todo os outros direitos constitucional e internacionalmente garantidos, como a dignidade da pessoa humana. A atuação do órgão tem reiterado o seu papel como função essencial à justiça, garantindo não apenas a promoção do dos direitos e interesses individuais daqueles que estão diretamente envolvidos, mas de toda uma coletividade.

A legislação urbana brasileira é ímpar no contexto dos países latino-americanos. O sistema normativo que garante o direito à moradia e a inserção do individuo à cidade (aqui entendida como uma série de sistemas sociais, econômicos, culturais e legais).

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 05 out. 1988.

BRASIL. Lei 10.257 de 10 de Julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 de Julho de 2001.

BRASIL. Lei 13.105 de 16 de Março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 de Marços de 2015.

CARVALHO, Cláudio Oliveira; RODRIGUES, Raoni. O novo código de processo civil e as ações possessórias – Novas perspectivas para os conflitos fundiários coletivos? Revista de Direito da Cidade, vol. 07, nº 4. Número Especial, p. 1750-1770. São Paulo, 2015.

DE PAULA, Vinicius Lamego. Da tutela dos interesses da coletividade vulnerável pela Defensoria Pública nas ações possessórias a partir do novo CPC.

DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO (DPE/MT). Regularização Fundiária Urbana. 2012. Disponível em: <http://www.defensoriapublica.mt.gov.br/portal/index.php/cetic/item/8581-regulariza%C3%A7%C3%A3o-fundi%C3%A1ria-urbana>. Acesso em 10/09/2019.

NASSAR, Paulo André. Judicialização do Direito à Moradia e Transformação Social: análise das Ações Civis Públicas da Defensoria Pública do Estado de São Paulo. 2011. 134 fls. Dissertação (Mestrado em Direito e Desenvolvimento). Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas. São Paulo, 2011.

SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. Saraiva: São Paulo, 2017.

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