
O valor da pausa e do silêncio

em 21 de Julho de 2025
O sentido de uma enunciação não está contido unicamente nas palavras que a compõem, mas na relação que essas palavras estabelecem com o contexto em que são ditas. A pragmática, ramo da linguística que estuda o uso da linguagem em situações reais de comunicação, parte da premissa de que o significado de um enunciado é inseparável de seu contexto de produção.
Esta perspectiva rompe com uma visão estritamente formalista da linguagem, segundo a qual a significação poderia ser totalmente deduzida a partir das regras do sistema linguístico. Embora a língua forneça os códigos e as possibilidades de combinação, é o contexto que define o valor e a intenção de cada enunciado. Como afirma Paul Grice (1975), a comunicação envolve inferências baseadas em expectativas mútuas entre os interlocutores, ou seja, depende do que é compartilhado implicitamente em termos de conhecimento de mundo, relações sociais e objetivos da interação.
A mesma frase — como “Está calor aqui” — pode funcionar como constatação, reclamação ou pedido, dependendo da situação comunicativa. Nesse sentido, a teoria dos atos de fala (Austin, 1962; Searle, 1969) mostra que falar é agir. Cada enunciado realiza uma ação específica, como afirmar, prometer, ordenar ou perguntar, e essa ação só pode ser compreendida à luz do contexto em que ocorre.
Outro conceito central é o de deixis: termos cujo significado depende da posição do locutor no tempo, no espaço e nas relações sociais. Palavras como “aqui”, “ontem”, “você” ou “isso” não têm um referente fixo, sendo sempre interpretadas em função do momento e lugar da fala. A deixis mostra como o significado não é estático, mas dinâmico e relacional.
Além disso, o contexto sociocultural influencia as escolhas linguísticas. O registro formal ou informal, o uso de expressões idiomáticas, a polidez ou a ironia — tudo isso é condicionado por fatores como classe social, idade, gênero, etnia e poder. A análise do discurso crítica (Fairclough, 1992) ressalta que o uso da linguagem é um espaço de disputa simbólica, em que os sentidos são construídos, negociados e hierarquizados.
A produção de sentido linguístico, portanto, é um processo intersubjetivo e situado. Requer a ativação de conhecimentos prévios, a atenção ao ambiente comunicativo e a consideração dos interlocutores. Compreender o papel do contexto é essencial para a interpretação de discursos, especialmente em situações de ambiguidade, ironia ou silêncio.
Na literatura, no jornalismo, na publicidade ou na política, a eficácia de um texto depende de sua adequação ao contexto em que circula. O mesmo vale para o ensino de línguas: o aprendiz precisa ser exposto a situações reais e variadas de uso da língua, para que possa compreender como o contexto molda o sentido.
Referências bibliográficas:
AUSTIN, J. L. Quando dizer é fazer. Porto Alegre: UFRGS, 1990.
FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília: UnB, 2001.
GRICE, Paul. Logic and conversation. In: COLE, P.; MORGAN, J. Syntax and semantics, vol. 3. New York: Academic Press, 1975.
SEARLE, John. Speech acts. Cambridge: Cambridge University Press, 1969.
RAJAGOPALAN, Kanavillil. O papel do contexto na produção de sentido. In: Revista Letras, Curitiba, n. 65, p. 15-34, 2005.