
Modernidade e musicalidade nos poemas “violões que choram”

em 15 de Julho de 2025
O filme El Secreto de sus Ojos, dirigido por Juan José Campanella, apresenta um enredo marcado pela busca de justiça, o trauma da perda e os limites entre o legal e o moral. A narrativa gira em torno do assassinato brutal de uma mulher e o sofrimento de seu marido, Ricardo Morales, que se vê diante de um sistema judicial ineficaz. A história é contada a partir da perspectiva de Benjamin Esposito, um oficial que anos depois tenta reconstruir o caso para escrever um livro. No entanto, à medida que a trama avança, é a figura de Ricardo que ganha destaque por sua conduta silenciosa, fria e, ao mesmo tempo, profundamente emocional diante da tragédia que viveu.
A sequência de eventos começa em um dia aparentemente comum, quando dois homens de terno — um deles o oficial Esposito — abordam Ricardo em seu trabalho e iniciam uma investigação sobre o assassinato de sua esposa. As perguntas vão desde questões sobre as chaves da casa até o comportamento da esposa nos dias anteriores ao crime. Ricardo responde negativamente a todas, demonstrando, à primeira vista, conformidade e cooperação, mas sem fornecer nenhuma informação concreta.
Dias depois, Esposito visita Ricardo em sua casa. Durante essa visita, é convidado a ver o álbum de fotografias da família e ouve do viúvo a história de como conheceu sua esposa. É nesse momento que a narrativa assume um tom mais íntimo, revelando não apenas a dor da perda, mas também o sentimento de injustiça que o persegue. Ricardo pergunta sobre o castigo que o assassino receberia caso fosse encontrado e mostra frustração ao saber que não existe pena de morte na Argentina. Ele afirma, com pesar, que nem mesmo a morte seria punição suficiente pelo que foi feito à sua esposa.
É folheando esse álbum de memórias que Esposito percebe algo estranho: em duas fotos, um jovem chamado Isidoro Gómez aparece olhando a vítima de maneira incomum. A partir desse momento, Gómez se torna o principal suspeito do crime. A investigação revela que ele conhecia a vítima desde a infância e estava morando em Buenos Aires. Com essas informações, Esposito consegue prender o criminoso, que é condenado à prisão perpétua. Contudo, devido à corrupção e à instabilidade política no sistema judiciário argentino, Gómez é libertado anos depois.
É nesse ponto que a história assume um rumo inesperado. Vinte e cinco anos após os acontecimentos, Esposito retorna à casa de Ricardo para esclarecer aspectos do caso e encerrar seu livro. Ele pergunta se Ricardo realmente desistiu de buscar justiça. A resposta é afirmativa, mas o tom e a hesitação despertam a desconfiança do investigador. Ricardo chega a dizer que matou o assassino, tentando encerrar o assunto, mas Esposito pressente que há algo mais.
Movido por essa intuição, Esposito volta à casa de Ricardo e descobre o segredo que havia sido cuidadosamente guardado por décadas: Gómez está vivo, mantido em cativeiro pelo próprio Ricardo, sem qualquer tipo de contato verbal. Essa escolha do viúvo revela uma forma particular de punição: uma vida vazia, em silêncio, sem liberdade e sem sentido. A punição imposta extrapola o campo jurídico e se configura como uma condenação existencial.
A decisão de Ricardo pode ser interpretada à luz de uma ética pessoal de justiça, onde o castigo precisa ser proporcional à dor vivida. Ao negar a Gómez até mesmo o direito à palavra, ele impõe uma pena mais cruel que a própria morte — a negação da existência simbólica, da comunicação e da dignidade. A escolha do silêncio como punição torna-se uma metáfora poderosa para a dor que não pode ser expressa em palavras, apenas sentida e infligida no tempo.
Assim, O Segredo dos Seus Olhos não apenas reconstrói uma investigação criminal, mas também discute os limites da justiça institucionalizada, o poder destrutivo do luto e a capacidade humana de carregar o peso da vingança por décadas. Ricardo Morales, ao agir por conta própria, cria sua própria sentença e se transforma de vítima em executor — ainda que em silêncio.