
O valor da pausa e do silêncio

em 21 de Julho de 2025
O silêncio, muitas vezes visto como ausência de linguagem, é, na verdade, um componente essencial da comunicação humana. Na oralidade, o silêncio desempenha múltiplas funções expressivas, estruturais e afetivas, sendo parte ativa do discurso. Este artigo analisa o papel do silêncio como estratégia comunicativa e como elemento significativo na construção de sentido nas interações verbais.
Em contextos culturais distintos, o silêncio pode assumir valores simbólicos diversos. Em algumas culturas orientais, por exemplo, o silêncio pode representar respeito, sabedoria ou contemplação. Em culturas ocidentais, costuma estar mais associado à hesitação, desconforto ou recusa. Essa diversidade mostra que o silêncio, longe de ser um vazio semântico, é altamente codificado e interpretável, conforme o contexto comunicacional.
No campo da pragmática, estudiosos como Searle e Austin já haviam apontado que os atos de fala não se resumem ao enunciado explícito. O que é calado pode ser tão expressivo quanto o que é dito. Um silêncio após uma pergunta direta pode sugerir negação, surpresa, dúvida ou mesmo uma crítica implícita. O silêncio torna-se, assim, uma forma de enunciado elíptico, exigindo do interlocutor inferência e sensibilidade interpretativa.
Em interações cotidianas, o silêncio pode funcionar como marca de turnos de fala, pausa para reflexão, índice de emoção reprimida ou estratégia de controle da conversa. Em situações de conflito, o silêncio pode operar como resistência simbólica — um gesto de recusa ao diálogo que, paradoxalmente, comunica intensamente. Em discursos políticos ou performances artísticas, o silêncio pode ser usado como efeito dramático, criando suspense ou reforçando o impacto de uma mensagem.
Autores como Roland Barthes e Georges Steiner também destacaram o silêncio como espaço simbólico e filosófico. Barthes, em especial, refletiu sobre o silêncio como forma de resistência à saturação de signos e de ruídos na sociedade contemporânea. O silêncio, nesse sentido, representa a pausa necessária para que o sentido emerja com mais potência.
No campo do ensino de línguas, o silêncio do aluno não deve ser interpretado automaticamente como falta de conhecimento ou engajamento. Muitas vezes, o aprendiz permanece em silêncio porque está processando o conteúdo, traduzindo mentalmente ou elaborando respostas. Reconhecer o valor cognitivo do silêncio é essencial para práticas pedagógicas mais humanas e eficazes.
Na linguística interacional, o silêncio é analisado em conjunto com elementos prosódicos, gestuais e contextuais. Um silêncio curto pode ser apenas uma pausa natural da fala, enquanto um silêncio prolongado pode gerar desconforto ou criar tensão dramática. Tudo depende da situação e das expectativas envolvidas. A escuta atenta e a sensibilidade para esses silêncios são competências fundamentais nas relações interpessoais.
Em tempos marcados pela hiperexposição verbal — nas redes sociais, na mídia e na publicidade — o silêncio adquire um valor expressivo ainda mais raro e significativo. Ele pode ser entendido como um gesto estético, ético ou político. Na comunicação oral, o silêncio, longe de ser ausência, é presença plena de significado.
Referências bibliográficas:
AUSTIN, John L. Quando dizer é fazer. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.
BARTHES, Roland. Fragmentos de um discurso amoroso. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
SEARLE, John. Actos de habla: un ensayo de filosofía del lenguaje. Madrid: Cátedra, 1980.
STEINER, George. Linguagem e silêncio: ensaios sobre a linguagem, a literatura e o inumano. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
TANNEN, Deborah. You Just Don’t Understand: Women and Men in Conversation. New York: Ballantine Books, 1990.