
Pâncreas endócrino: insulina e diabetes mellitus

em 01 de Janeiro de 2022
É uma infecção bacteriana sistêmica, crônica (evolução de longa duração), curável e exclusiva do ser humano. Quando não tratada, evolui para vários estágios de gravidade, podendo comprometer diversos tecidos. As formas mais graves podem comprometer os sistemas nervoso e cardiovascular.
O agente etiológico causador é a espiroqueta Treponema pallidum, cuja transmissão se dá majoritariamente via contato sexual, mas pode haver transmissão vertical. A grande maioria dos casos são assintomáticos ou com sintomas brandos. A transmissibilidade da sífilis é maior nos estágios iniciais (sífilis primária e secundária) do que em estágios mais avançados (latente recente/ tardia). Isso se explica pelo fato de que as lesões primárias (cancro duro) e secundárias (mucocutâneas) são ricas em Treponema pallidum.
História natural da Sífilis: O Treponema atravessa a barreira da pele, alcançando vasos sanguíneos e linfáticos. Dessa forma ocorre a disseminação sistêmica da bactéria antes mesmo da formação da lesão primária. Após o período de incubação, surge o cancro duro no sítio original de infecção. Essa lesão geralmente é única (mas pode haver múltiplas lesões). Em 4 a 6 semanas, as lesões involuem espontaneamente. Em seguida a infecção pode se tornar latente ou evoluir para sífilis secundária, que é marcada pelo surgimento de lesões exantemáticas, seguidas de lesões em papulares. Se não tratada, a sífilis avança para o estágio de sífilis terciária, marcada pelo surgimento de lesões grumosas. O paciente pode evoluir para neurosífilis em qualquer estágio da infecção.
Sífilis recente (primária, secundária e latente recente)
Sífilis primária: o tempo de incubação é de 10 dias a 3 meses, sendo que a média é de 3 semanas. A lesão primária é geralmente papulosa indolor em forma de botão, que se transforma em ulcera indolor (a não ser que haja infecção secundária ou quando ocorre nas mãos) de bordas elevadas e exsudato seroso escasso (fundo limpo). A superfície pode ser crostosa. O diâmetro da lesão varia de pouco milímetros a 1/2 cm. Surgem preferencialmente em região anogenital, mas podem ocorrer em
boca, língua, lábios, tonsilas, dedos das mãos e dos pés, mamas e mamilos.
-Sintomas associados:
Linfoadenopatia regional (geralmente
unilateral)
-Diagnósticos diferenciais: herpes, úlcera traumática, erupção medicamentosa, cancroide e LGV.
Sífilis secundária: ocorre em média entre seis semanas a seis meses após a cicatrização do cancro. Excepcionalmente, as lesões podem ocorrer em concomitância com a
manifestação primária. Inicialmente, as lesões cutâneas são exantemas maculares pouco visíveis (roséola sifilítica), principalmente no tronco e raiz dos membros. Concomitantemente, surgem novas lesões branco-acinzentadas nas mucosas. As lesões subsequentes são papuloescamosas, pustulosas
ou acneiformes e são disseminadas por todo tegumento, inclusive regiões palmoplantares. Nas regiões palmoplantares as lesões são psoriasiformes. Na face, mimetizam dermatite seborreica e são comuns na fronte e sulcos nasolabiais. Em pele escura, as lesões podem ser anulares. Mais adiante, podem ser identificados condilomas
planos (pápulas e nódulos) nas dobras mucosas especialmente na área anogenital.
-Sintomas associados: alopecia em clareiras e madarose, além se sintomas inespecíficos como febre baixa, mal-estar, cefaleia, adinamia (fraqueza muscular
durante processo infeccioso), quadros oculares (uveítes), Linfoadenopatia generalizada. Especialmente em pacientes imunodeprimidos, pode
haver neurosífilis meningovascular, com acometimentos de nervos cranianos.
-Diagnósticos diferenciais: os exantemas são semelhantes em reações cutâneas adversas à fármacos, pitiríase rósea, exantema viral, mononucleose infecciosa, tinea corporis, pitiríase versicolor, escabiose, condiloma acuminado, psoríase gutata aguda e líquen plano.
Sífilis latente: período assintomático, sendo o diagnóstico realizado apenas com base no VDRL (não treponêmico) e FT-Abs (treponêmico). A maioria dos diagnósticos ocorre nesse estágio. A sífilis latente é dividida em latente recente (até um ano de infecção) e latente tardia (mais de um ano de infecção). Pode ocorrer sem lesões primárias ou secundárias previamente reconhecidas.
Sífilis terciária: ocorre em 15% a 25% das infecções não tratadas após um período variável de latência. A inflamação causada pelo Treponema nesse estágio provoca destruição tecidual. As lesões são em gomas sifilíticas (liquefação dos nódulos e tumores formados) na pele, mucosas e qualquer tecido.
-Sintomas associados: Há espiroquetas em diversos tecidos, podendo causar diversas complicações, como periostite tibial (canelite), artralgias, faringite difusa, gastrite hipertrófica, hepatite, proctite irregular, colite ulcerativa, glomerulonefrite, síndrome nefrótica, cistite e prostatite.
Dermatopatologia da sífilis
Observa-se epitélio ulcerado, com produção de exsudato e infiltração intensa de células inflamatórias (monócitos) e de plasmócitos (células secretoras de anticorpos). O caráter inflamatório da lesão produz o aspecto do “cancro duro”.
Diagnóstico
Exames diretos: pesquisa de Treponema pallidum em amostra retirada diretamente das lesões. São úteis apenas em lesões primárias e secundárias. Existe a técnica de microscopia em campo escuro (alta sensibilidade) e a pesquisa direta com material corado (sensibilidade inferior ao campo escuro). Se vier positivo, a infecção está ativa. Se vier negativo, considerar que o número de T. pallidum na amostra não foi suficiente ou que a lesão está em remissão ou que a pessoas recebeu tratamento sistêmico ou tópico.
Testes imunológicos: são os mais utilizados e pesquisam anticorpos em amostra de sangue.
Treponêmicos: anticorpos específicos produzidos contra T. pallidum. São qualitativos, isto é, detectam apenas a presença ou ausência de AC. São os primeiros a se tornarem reagentes, podendo ser utilizados como primeiro teste ou teste complementar. Em 85% dos casos, permanece reagente por toda vida, por isso não são indicados para monitoramento da resposta ao tratamento. Existe o teste rápido, imunofluorescência indireta (FTA-Abs), ELISA, etc.
Não treponêmicos: detectam anticorpos anticardiolipina. Cardiolipina é uma molécula antigênica endógena produzida por nossas células diante de diversas patologias. Os testes não treponêmicos são qualitativos e quantitativos (utilizados para titular a quantidade de AC presente na amostra de sangue e para monitorar resposta ao tratamento). A queda do título é indicativa de sucesso do tratamento.
Os testes não treponêmicos tornam-se reagentes após três semanas do aparecimento do cancro duro. Se a infecção for tardia, são esperados títulos baixos (≤ 1;4). Pessoas assintomáticas com títulos baixos em testes não treponêmicos, sem registro de tratamento e sem data de infecção conhecida, são consideradas como portadoras de sífilis latente tardia, devendo ser tratadas. Contudo, títulos baixos também podem sugerir que o paciente se infectou recentemente ou ainda uma cicatriz sorológica.
Existe o teste rápido, VDRL (floculação), ELISA, etc. O VDRL pode utilizar amostras tanto de soro, quanto de LCR. É importante ressaltar que existe a possibilidade do teste não treponêmico dar falso negativo, isto é, o indivíduo contém AC não treponêmicos, mas devido à desproporção (mais AC, do que antígeno) há ausência de reatividade. Esse fenômeno é chamado de fenômeno de Prozona.
As reações falso-positivas também são mais comuns em testes não treponêmicos, pois a Cardiolipina está presente em: LES, colagenoses, hanseníase, malária, usuários de drogas injetáveis, transfusão de hemoderivados, gestação e após vacinação.
Para o correto diagnóstico, devemos correlacionar os dados clínicos, resultados de testes laboratoriais, histórico de infecções passadas e investigação de exposição recente. A presença de sintomas característicos de cada estágio da doença favorece a suspeição clínica, embora não exista sinal patognomônico em sífilis. Recomenda-se sempre iniciar a investigação por um teste treponêmico.
INTERPRETAÇÕES DOS TESTES |
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Treponêmico |
Não treponêmico |
Interpretação |
Conduta |
+ |
+ |
VDRL baixo: cicatriz sorológica, sífilis recente ou sífilis tardia (mais de 1 ano) VDRL alto: sífilis |
Quando sífilis tratar adequadamente e monitorar Quando cicatriz, orientar. |
+ |
- |
O ideal seria realizar um terceiro teste treponêmico. Se reagente: Sífilis recente ou cicatriz sorológica ou prozona. Se não reagente: excluir diagnóstico de sífilis. Se terceiro teste não disponível, avaliar histórico de IST e exposições recentes, além dos sinais e sintomas. |
Quando sífilis tratar adequadamente e monitorar Quando cicatriz, orientar. |
- |
+ |
O ideal seria realizar um terceiro teste treponêmico. Se reagente: Falso negativo para FTA-Abs. Considerar sífilis recente ou cicatriz sorológica. Se não reagente: Falso positivo para VDRL , excluindo o diagnóstico de sífilis |
Quando sífilis tratar adequadamente e monitorar Quando cicatriz, orientar. |
- |
- |
Ausência de infecção ou período de incubação. |
Em caso de suspeita clínica, solicitar novos exames após 30 dias e pensar em diagnósticos diferenciais. |
Abordagem terapêutica
1ª escolha: Penicilina G benzatina
2ª escolha (pacientes não gestantes e pacientes com próteses de silicone no glúteo): Doxiciclina e Ceftriaxona – acompanhamento clínico e laboratorial rigoroso para garantir cura.
Esquema
- Sífilis recente (primária, secundária ou latente recente)
1) Penicilina G Benzatina - 2,4 milhões UI – IM – dose única, sendo 1,2 milhões em cada glúteo.
2) Doxiciclina – 100mg – 12/12h – VO – por 15 dias.
Seguimento: VDRL trimestral (em gestantes, mensal) por 1 ano.
- Sífilis tardia (latente tardia ou terciária)
1) Penicilina G Benzatina – 7,2 milhões UI – IM – em três doses (3 semanas
consecutivas), sendo 1,2 milhões em cada glúteo.
2) Doxiciclina – 100mg – 12/12h – VO – por 15 dias.
Seguimento: VDRL trimestral (em gestantes, mensal) por 1 ano.
- Neurosífilis
1) Penicilina cristalina/ potássica – 18 a 24 milhões UI – 1x/ dia – EV – em doses de 3 a 4 milhões a cada 4 horas ou por infusão contínua – por 14 dias.
2) Ceftriaxona 2g – IV – 1x/ dia – por 10 a 14 dias
Seguimento: pesquisa em LCR semestral.
Reação de Jarish-Herxheimer:
Evento que pode ocorrer durante as 24 horas após a primeira dose de penicilina, caracterizada por exacerbação acompanhadas de eritema, dor ou prurido. Essa reação ocorre devido à rápida morte dos treponemas em nosso organismo. Regride espontaneamente dentro de 24 a 48h e pode ser controlada com analgésicos simples. Essa reação significa reação alérgica à Penicilina, que é rara (0,002% de risco) e manifesta-se na forma de urticária e exantema pruriginoso.
Resposta imunológica:
É adequada quando se observa queda no título em duas diluições em até seis meses para sífilis recente e queda na titulação em duas diluições em até 12 meses para sífilis tardia.
Exemplo:
1:64 1ª diluição 1:32 2ª diluição 1:16 (duas diluições com queda de 4 títulos, pois 64/16=4)
Se houver ausência de redução, aumento da titulação ou persistência de sintomas, o retratamento é indicado.
Sífilis em populações especiais
Gestantes: alto risco de transmissão vertical. Demanda cuidados especiais:
- Testar na primeira consulta de pré-natal
- Testar no terceiro trimestre
- Na internação para o parto em caso de aborto/ natimorto, suspeita de exposição ou de violência sexual.
- O tratamento é com Penicilina G Benzatina e o monitoramento mensal. Após o parto, trimestral por 1 ano.
PVHIV: existe uma prevalência de casos de sífilis (e outras IST) em PVHIV, quando comparadas com pessoas HIV-. A aquisição dessas IST em PVHIV confirma a vulnerabilidade e a falha na adesão ao tratamento em face do acesso limitado aos cuidados em saúde.
As ulceras genitais aumentam o risco de infecção pelo HIV. A solução de continuidade do epitélio torna-se uma via de entrada para o vírus, além de que há maior circulação de células T CD4+ e aumento de receptores CCR5 em macrófagos, ambos também favorecendo a infecção.
Não há distinção de conduta terapêutica entre PVHIV, contudo recomenda-se exame neurológico minucioso diante da frequência de complicações oculares e neurológicas. Diante de sintomas oculares e neurológicos, a punção lombar é mandatória. Ademais, o curso clínico da sífilis pode ser alterado pela coinfecção com HIV.
- Manifestações clínicas atípicas ou mais agressivas: múltiplas lesões primárias de resolução mais lenta, sobreposição dos estágios da doença e sintomas de secundarismo são mais exuberantes e agressivos.
Sífilis congênita e criança exposta à sífilis
Na gestação, a sífilis pode causar abortamento, prematuridade, natimortalidade, má formações congênitas precoces ou tardias ou a morte do RN. A gestante infectada transmite a bactéria ao feto em 80% dos casos. Contudo, a transmissão também pode ocorrer durante parto vaginal se a mãe apresentar lesão sifilítica.
É essencial garantir assistência tanto aos RN expostos à sífilis, quanto aos RN infectados pela sífilis. Os primeiros não demandam nenhuma notificação, pois a mãe foi adequadamente tratada, ao passo que os segundos precisam, pois, as mães não foram tratadas ou foram tratadas de forma não adequada.
A testagem simultânea da mãe e do RN com o mesmo tipo de teste não treponêmico configura o melhor cenário para a determinação do significado dos achados sorológicos da criança. Título fetal maior que o materno em duas diluições configura infecção congênita (Ex.: RN – 1:16 e Puérpera – 1:4).
VDRL |
Amostra de sangue periférico do RN e da mãe. |
Testar com 1,3,6,12 e 18 meses de idade (interromper após dois testes não reagentes consecutivos) |
FTA-Abs |
Não realizar |
Pode ser realizado a partir dos 18 meses, mas não é obrigatório |
A sífilis congênita (SC) pode surgir até os dois anos de idade e quando surgem após esse período é chamada de SC tardia. Todas as crianças com SC devem ser submetidas a uma investigação completa, incluindo coleta de LCR e radiografia de ossos longos. Sintomas: a maioria são assintomáticos, contudo os sintomas mais frequentes são hepatomegalia, icterícia, corrimento nasal, rash cutâneo, Linfoadenopatia generalizada e anormalidades esqueléticas.